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sexta-feira, 18 DE abril DE 2025

Especialistas sugerem mudanças no transporte ferroviário de carga geral

Embora a carga geral seja responsável pela maior parte da demanda de transporte no país, menos de 10% dela é transportada de trem

Por Redação

O transporte ferroviário de carga geral no Brasil foi tema de recente reunião do Conselho de Infraestrutura da Confederação Nacional da Indústria (Coinfra/CNI), que contou com apresentação de dados por dois especialistas, o consultor Bernardo Figueiredo e o técnico do Tribunal de Contas da União (TCU) Mauricio Ferreira Wanderley.

Analisando dados de 2017, que não sofreram grandes distorções por conta da pandemia e do baixo crescimento da economia, o técnico do TCU demonstrou que o transporte de carga geral, contêineres e granel líquido responde por pouco mais da metade (54%) da carga total transportada dentro do país, seja com destino ao exterior ou apenas ao mercado interno. A média por fluxo, isto é, entre uma origem e um destino, é de aproximadamente 3 mil toneladas. Apesar disso, menos de 10% dela viaja de trem, com tendência de que esse percentual caia. 

Já a parte que é transportada por ferrovia, majoritariamente se refere a minério de ferro e granel agrícola (soja). 

Em termos de tonelagem transportada, cerca de 70% circula apenas no mercado interno, enquanto algo próximo a 30% se refere a cargas que circulam internamente com destino a ou provenientes do exterior. E a média por fluxo do comércio exterior ultrapassa 50 mil toneladas, quase 18 vezes aquela do fluxo doméstico.

Essa diferença é uma das razões para que o transporte ferroviário de carga geral no Brasil seja tão pequeno. Porque as concessionárias de ferrovia formam grandes composições com muitos vagões para percorrer, em geral, grandes distâncias de um ponto a outro, sem paradas. A carga geral da indústria em geral tem destinos variados, precisando atingir tanto longas quanto distâncias mais próximas. Essa flexibilidade atualmente não é oferecida pelo transporte ferroviário. 

Bernardo Figueiredo, atual CEO da TAV Brasil, Empresa Brasileira de Trens de Alta Velocidade, tem diagnóstico semelhante em relação ao transporte total de carga no país, onde 59% se refere a carga geral, incluindo contêineres e granéis líquidos, caso dos combustíveis.

Especialistas sugerem mudanças no transporte ferroviário de carga geral

 

Chamam a atenção, dois pontos sobre alocações dos fluxos de carga geral em estudo no Ministério dos Transportes. Primeiro, que em 2035 se prevê que, mesmo se as melhorias e novas linhas ferroviárias em análise forem realmente efetivadas, o fluxo de transporte da carga geral continuará a ser majoritariamente rodoviário. Segundo, que se nota claramente que o maior fluxo de carga no país se dá na direção Norte/Sul. E com destaque para as cargas do Sudeste para o Nordeste, e vice-versa.

Bitola larga

A sugestão do consultor é de que todos os esforços governamentais sejam concentrados na constituição e no fortalecimento de uma malha concedida estruturante. Seria uma malha em bitola larga (1,60m), o que exigiria que a ferrovia que corta a Bahia seja refeita nessa bitola. Será necessário, todavia, modificar o modus operandi para se conquistar o transporte de cargas domésticas, agregando pátios de concentração e distribuição a linhas troncos (hub to hub) e linhas alimentadoras, terminais e pátios privados e linhas portuárias. 

Além do que seria necessária uma atuação firme da agência reguladora, exercendo seu papel de fiscalização e dando segurança para que novos operadores ferroviários independentes possam efetivamente entrar no mercado de transporte. Soluções como transporte de contêineres em double stack, transporte de caminhões carregados na ferrovia e outras alternativas precisam ser incorporadas pelos operadores, para que os trens possam ser formados em fluxos suficientemente econômicos.

Mudanças

Para isso, é necessário que todos – governos, reguladores, produtores, transportadores, concessionários, autorizatárias e associações usuárias – mudem o foco e passem a enxergar e discutir em profundidade o transporte doméstico de cargas nas ferrovias. Um passo fundamental é a instrumentalização da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) com recursos humanos suficientes e estrutura adequada para exercer o papel de fiscalizar a aplicação de regras como o tráfego mútuo e o direito de passagem.

Como fica o Espírito Santo? 

O Espírito Santo aparece apenas na malha classificada como regional, representada pela Estrada de Ferro Vitória-Minas (EFVM) e por trecho da Ferrovia Centro Atlântica (FCA). “Hoje, a competitividade do trecho da FCA que se conecta com o Estado é baixa comparada a outros fluxos, como aquele em direção a Santos, por exemplo. Então o Estado tem mesmo a EFVM com altíssima eficiência, mas majoritariamente concentrada no transporte de minério de ferro.

Embora por ela sejam transportadas cargas importantes como produtos siderúrgicos, celulose e papel, fertilizantes, granel agrícola, dentre outros. Além disso, vê-se, no mapa daquela que foi chamada de malha estruturante, apenas ferrovias em bitola larga. Como a malha regional é em bitola métrica, o estado está desconectado da malha estruturante. Pelo menos diretamente”, diz trecho do Informe Estratégico, do Conselho de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes). Para se conectar a ela, é necessário utilizar unidades de transbordo de cargas. 

Dois aspectos não abordados pelos apresentadores da reunião do Coinfra/CNI também devem ser lembrados. Primeiro que há uma grande demanda de carga reprimida de minérios e granéis agrícolas que exigem e, principalmente, exigirão no futuro novas ligações ferroviárias que conectem o cerrado brasileiro e regiões periféricas ao quadrilátero ferrífero a portos com capacidade de receber grandes navios. 

Segundo, que a alocação de cargas indica um fluxo intenso entre Vitória e Rio de Janeiro, que, num novo modelo de transporte ferroviário, justificaria com folga a reconstrução da ferrovia EF 118. Outro ponto a ser considerado é que se vislumbra, dentre as intenções do governo, segmentar a concessão da FCA. Para permitir, por exemplo, que o trecho baiano seja refeito em bitola larga. Nessa hipótese, o trecho que passa pela Serra do Tigre poderia ser devolvido e há dúvidas se haveria algum interessado em refazê-lo. Ele é a ligação atual do Espírito Santo com o Cerrado Brasileiro. 

O que propõe o Coinfra/Findes? 

“É preciso encontrar alternativa para garantir a continuidade de transporte ferroviário entre o Cerrado e os portos do Estado, assim como a construção da nova EF 118. Um grande passo foi dado com a entrega pela Vale ao governo do Estado do projeto básico do trecho Anchieta/Divisa ES/RJ da EF 118. E também com a contratação dos estudos ambientais desse trecho. O licenciamento será feito pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente (Iema) que promete celeridade. Cabe agora defender os recursos necessários para que no futuro próximo as obras possam ser efetivamente realizadas.”

Quanto à ligação com o Cerrado, a defesa imediata é de que sejam destinados recursos à recapacitação do Corredor Centro-Leste. Sendo uma opção competitiva, poderá ser uma das poucas opções para que o agronegócio possa embarcar suas cargas em grandes navios cargueiros do tipo Capesize. Pois isso estará disponível nos novos terminais portuários do Estado a partir do fim do ano que vem.

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