O Partido Democrata não é capaz de desafiar o status quo que predomina no Ocidente. Em paralelo, o Republicano parece se converter num partido reacionário
Por José Antonio Bof Buffon
A recente derrota eleitoral do Partido Democrata nos Estados Unidos é mais do que um revés eleitoral pontual. Reflete uma profunda exaustão programática e uma incapacidade do Partido em oferecer um caminho “progressista” viável para o futuro daquele país.
O partido encontra-se capturado por pautas contemporâneas e não é capaz de desafiar o status quo que predomina no Ocidente, especialmente nos EUA — uma sociedade marcada pelo exacerbado individualismo, pela fragmentação social, pela desintegração do tecido comunitário e pelo extremado relativismo moral. Na ausência de políticas estruturantes e na presença de um privatismo exacerbado, esses elementos alimentam um ambiente de desamparo, desesperança e angústia na população.
Além disso, no plano externo, há uma insistência em tentativas de impor padrões sociais e políticos próprios dos EUA a outras regiões e países do mundo, com tradições distintas e incompatíveis com os valores e práticas ocidentais, algo que, em regra, não encontra ressonância fora das fronteiras norte-americanas. Os fracassos no Afeganistão, Iraque e Síria são bem ilustrativos.
Em paralelo, o Partido Republicano, que tradicionalmente representava uma força conservadora, aberto a avanços graduais e localizados, parece agora se converter em um partido reacionário. Longe de buscar reformas tópicas e moderadas, próprias do conservadorismo, o Partido propõe a volta a um passado idealizado, onde, supostamente, existia uma ordem social melhor, mais justa e mais equilibrada. Contudo, nos Estados Unidos, essa “volta ao passado” é fundamentalmente impraticável.
A própria tradição americana já nasceu da modernidade, sem um passado hierárquico tradicional, ao qual se possa se retornar, diferentemente de países como a Rússia, no qual o conservadorismo se apoia em uma herança cultural robusta, preservada e viva – notadamente hierárquica e antiliberal.
Esse impasse, inevitavelmente, nos remete aos “últimos dias”, aos estertores, do Império Romano do Ocidente, quando a incapacidade das instituições de se adaptar ao mundo em transformação proporcionou um campo aberto para o colapso da sociedade e para a consequente invasões bárbaras. Nos EUA, o esgotamento das propostas dos dois grandes partidos coloca em risco não apenas o futuro político do país, mas a própria coesão de sua sociedade, que enfrenta uma sensação crescente de que as alternativas disponíveis estão aquém das necessidades e aspirações da população.
Nesse contexto, a sociedade americana se vê diante de um dilema: permanecer na encruzilhada de propostas exauridas ou inviáveis, ou buscar um novo caminho que revitalize a confiança nas instituições e a esperança em um futuro civilizatório e sustentável.
Fica a dica para se rever o modelo das eleições, posto que se trata de um modelo anacrônico, tecnicamente amplamente superado, antidemocrático e que carece da necessária transparência.
José Antonio Bof Buffon é economista e mestre pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas