O governador do Estado fala sobre as medidas adotadas em todo o Espírito Santo na prevenção e contenção a desastres naturais
Por Amanda Amaral
Os efeitos das mudanças climáticas já podem ser sentidos pela população. As alterações do clima estão provocando chuvas mais intensas e períodos de seca com intervalos cada vez mais curtos.
A prevenção, mitigação e adaptação às mudanças climáticas é uma preocupação do Governo do Espírito Santo, que atualmente lidera outros 21 estados brasileiros e o Distrito Federal no Consórcio Brasil Verde – o maior consórcio para assuntos climáticos do hemisfério sul.
Para falar sobre a possibilidade de obtenção de recursos financeiros com instituições de outros países, a criação de um fundo inédito de adaptação às mudanças climáticas e sobre a representação internacional à frente do Consórcio, a ES Brasil conversou com exclusividade com o governador Renato Casagrande.
O Espírito Santo sofre com a seca – que agora, além do norte, tem afetado até municípios do sul capixaba, – e com fortes chuvas, que causam cheias, alagamentos e deslizamentos. Somos um estado preparado para lidar com as mudanças climáticas? Que instrumentos e projetos garantem isso?
Não é um estado preparado ainda, é um estado que está se preparando. O Brasil não é preparado para enfrentar aquilo que temos observado com mais frequência nesses últimos anos, sejam chuvas torrenciais, sejam estiagens mais intensas – no nosso caso, principalmente no norte do Estado. O que estamos fazendo, é um conjunto grande de investimentos, pensando na questão da adaptação às mudanças climáticas.
Lançamos o Fundo Cidades, que repassa verbas para que os municípios realizem obras de prevenção. Fora isso, temos feito muitos investimentos em obras de macrodrenagem, por exemplo, em Vila Velha, Cariacica, Serra, Viana, Colatina e Águia Branca. São diversos investimentos para poder aumentar a resistência e resiliência desses municípios frente a esses fenômenos. Também estamos fazendo muros de contenção em diversos municípios para evitar deslizamentos.
Temos feito um trabalho importante de investimentos em infraestrutura. Ao mesmo tempo, temos trabalhado também na mudança do perfil da matriz energética, para que a gente possa ter mais energia renovável. Há também o trabalho de recuperação florestal, e tudo isso ajuda a compor as ações preventivas e de adaptação.
A adaptação às mudanças climáticas envolve diversas medidas que abrangem desde obras de saneamento básico e infraestrutura até a realocação de famílias em áreas de risco. Como se dá o planejamento para o enfrentamento aos eventos climáticos extremos?
É preciso que o Estado tenha um planejamento geral, mas também é preciso que cada município tenha o seu próprio planejamento específico e identifique as áreas de risco. Nós fizemos isso em 17 municípios do Estado do Espírito Santo: um mapeamento das áreas de risco. Somos um dos estados mais vulneráveis quanto às áreas de risco no Brasil, juntamente com o Rio de Janeiro e Santa Catarina. Então, é preciso que a gente tenha esse mapeamento e que a gente faça projetos para poder conter encostas, fazer drenagem.
Veja o que estamos realizando em Vila Velha: são nove estações de bombeamento de águas pluviais e diversas galerias. Se você passar ali na Carlos Lindenberg verá uma galeria grande ligando um ponto da avenida até o rio Aribiri. Também conseguimos fazer isso em Cariacica e Viana. Investimentos importantes em macrodrenagem e em obras de contenção. Nós fizemos grandes contenções também em Iúna, Mimoso do Sul e Rio Novo do Sul, que são regiões muito montanhosas. Estamos fazendo ainda uma grande contenção agora em São Mateus. Vamos fazer lá em Alegre mais obras de contenção em bairros que estão correndo risco.
As pessoas ocuparam áreas de risco por necessidade muitas vezes, quase sempre sem observar o risco, mas a maior parte delas por necessidade. Então, esses investimentos são muito importantes para nós.
Como gestor, o senhor já passou por situações de enfrentamento a eventos climáticos intensos. Entre eles, a seca no sul do Estado no ano passado e as chuvas intensas em 2013, tendo nos anos seguintes, cidades como Cachoeiro de Itapemirim, Iconha, Jaguaré e outras afetadas por cheias e alagamentos. Administrar todas essas situações geraram expertise para nós?
Sim, contribuíram. Nós montamos, por exemplo, um Centro de Inteligência da Defesa Civil, que funciona na sede do Batalhão do Corpo de Bombeiros. Nós temos hoje estações pluviométricas e hidrológicas, monitoramento de vazão do Rio Itapemirim, do Rio Doce, um sistema estadual conectado ao sistema nacional, mas também a todos os municípios. Equipamos as Defesas Civis municipais, implantamos um sistema de alerta, um sistema de resposta e criamos um Fundo de Defesa Civil. Temos hoje capacidade de responder com rapidez a qualquer emergência no caso de chuvas intensas.
O Fundo Cidades 2023 apresentou o ineditismo de ser específico para a prevenção aos efeitos das mudanças climáticas. Esse exemplo pode ser replicado em outros estados?
É um exemplo a ser replicado, sim.
Não tem lugar nenhum do Brasil que tenha um fundo voltado para obras de prevenção aos efeitos das mudanças climáticas.
Nós primeiro entregamos para cada município R$ 500 mil para que eles façam os projetos, seja de macrodrenagem, de contenção ou de regularização de vazão.
Nós também disponibilizamos aos projetos municipais aprovados R$ 200 milhões este ano. Eu vou colocar nos próximos quatro anos R$ 200 milhões para cada ano. A gente vai chegar, somente com o Fundo Cidades, fora os investimentos diretos do Governo do Estado, a R$ 800 milhões para obras de prevenção e proteção da vida e do patrimônio das pessoas.
Já há solicitação de obras por meio do Fundos Cidades 2023. Como engajar os municípios para a necessidade de realizar obras tão específicas?
Quando a gente coloca essa “cenoura” na frente, que é o recurso para obras, é uma maneira de fazer o município pensar em projetos nessa área. As vezes os municípios têm muitas dificuldades, muitas necessidades, e acabam deixando de lado um investimento para regularizar a vazão, que faz uma drenagem adequada, que protege um bairro construindo um muro. Nós naturalmente temos que fazer os municípios pensarem em obras, mas também na proteção dos recursos naturais. Na proteção das florestas, no uso da energia renovável. Não basta pensar em obras imediatas.
Não é só remediar depois que as coisas já aconteceram. Tem que cuidar dos recursos naturais e reduzir as emissões dos gases do efeito estufa. Essa tarefa é da União e do Estado, sim, mas também é dos municípios. Os municípios também precisam ajudar a proteger suas florestas. Denunciar se tem alguém desmatando, evitar que o esgoto vá para o rio, evitar ou fiscalizar a ocupação de áreas de risco. Tem um trabalho grande e importante que o município deve fazer para ajudar a proteger as pessoas e a vida.
O Espírito Santo tem uma política pública específica para as mudanças climáticas. Quais são os projetos e ações previstos por essa política? Quais os eixos de atuação?
É o Programa de Mudanças Climáticas, que trabalha dois pilares. Um dos pilares é a busca pela neutralidade de carbono e estamos elaborando um plano para que, até 2050, o Estado do Espírito Santo se torne neutro em carbono.
Ou seja, que a quantidade de carbono que a gente emite na atmosfera seja a mesma que a gente retire da atmosfera. Isso acontece com a ampliação da cobertura florestal, com o uso de energia renovável e outras medidas que possam ser tomadas, como o sequestro de carbono. Essas medidas são discutidas dentro do nosso plano de neutralidade de carbono. Então, sustentam o Programa de Mudanças Climáticas, o Plano de Neutralidade de Carbono e o plano de adaptação às mudanças climáticas, em que constam esses investimentos importantes que anunciamos e executamos com recursos do Governo do Estado. São obras feitas tanto diretamente pelo Governo do Estado quanto também aquelas realizadas pelo repasse direto para os municípios.
À frente do Consórcio Brasil Verde é possível que o Espírito Santo se destaque mais no tema mudanças climáticas? O que o estado capixaba tem a contribuir nessa discussão?
Como presidente do Consórcio Brasil Verde eu tenho a oportunidade de levar os estados a debaterem em fóruns nacionais e internacionais, tenho a oportunidade de ajudá-los a elaborar seus programas de mudanças climáticas, a elaborar seus planos de neutralidade de carbono. É um trabalho para que todos os estados tenham alguma iniciativa nessa área para ajudar o Brasil a ser um país que contribui para preservação do nosso planeta.
O Consórcio Brasil Verde também pretende obter recursos para projetos e ações de sustentabilidade e preservação ambiental. Como isso será feito?
O Consórcio está em sua fase final de regularização. Nós poderemos apresentar propostas de interesse dos estados para as instituições financeiras e as entidades que trabalham nessa área no Brasil e fora dele. Podemos também realizar uma busca por projetos para outros entes estaduais, já que o consórcio pode receber recursos e repassar recursos para estados brasileiros.
E em 2023? O que está sendo feito este ano para evitar possíveis desafios causados pelas mudanças climáticas? Quais projetos se destacarão este ano? Serão elaboradas novas políticas públicas?
Nós vamos entregar este ano nosso Plano de Neutralidade de Carbono, que está em elaboração em parceria com uma equipe de professores da Ufes e do Ifes, e também com a Federação das Indústrias, Federação dos Transportes e Federação da Agricultura, envolvendo outras instituições do nosso Estado. O plano é o caminho que vamos seguir para chegar à neutralidade até 2050.
Também teremos medidas de ampliação do Programa Reflorestar, que é voltado para a recuperação da cobertura florestal. Faremos anúncios sobre o Programa Águas Capixabas, que é de revitalização de recursos hídricos e vai unificar em um programa estruturado a conservação do solo e de recursos hídricos, por meio de práticas mecânicas de retenção de águas das chuvas, construção de cisternas para reserva de águas pluviais e melhoria das condições de saneamento em pequenas comunidades rurais.
Há diversas medidas a serem anunciadas ainda em 2023.