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quarta-feira, 12 DE fevereiro DE 2025

Violência, Estado e linchamentos

Não há, obviamente, respostas simples à violência. O problema não é, apenas, jurídico e sim sociológico e político

Por Rodrigo Augusto Prando

A sociedade brasileira é assaz violenta e isso pode ser comprovado nos relatos cotidianos dos cidadãos ou nas pesquisas científicas. Intrinsicamente humana, a violência é mais ou menos aceita a depender da configuração histórica dos países, de sua cultura, instituições, no limite, da relação entre o Estado e a sociedade.

Max Weber, clássico da teoria sociológica, afirma que o Estado se caracteriza pelo monopólio legítimo da violência, ou seja, somente por meio das polícias e das forças armadas o Estado pode usar, legalmente, o poder de coação e atingir seus objetivos.

Outro aspecto interessante é a diferença entre poder e autoridade. Assim, por exemplo, um traficante e uma milícia têm, efetivamente, poder, já que reúne recursos capazes de violentamente coagir indivíduos e grupos. Já no âmbito legal, policiais são dotados de autoridade, já que podem exercer um poder autorizado por lei. Criminosos são poderosos, contudo, não se configuram em autoridades.

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Nos tempos que correm, cenas de violência dominam a mídia. Em grandes capitais, como São Paulo e Rio de Janeiro, pululam notícias de furtos e roubos, estupros, agressões e assassinatos.

No centro de São Paulo, na região da Cracolândia (que, atualmente, se espalhou), grupos atacam pedestres, carros têm seus vidros arrebentados visando os celulares e, não raro, lojas e outros comércios são invadidos e roubados.

No Rio de Janeiro, na nobre região de Copacabana, transeuntes são cercados e agredidos, com intensidade que gera indignação e revolta. Invariavelmente, a população reclama por mais segurança, por ações mais enérgicas por parte das forças policiais.

No entanto, para muitos o Estado e suas instituições estão ausentes, omissos ou mesmo incapazes de responder à situação em voga. Tal cenário, portanto, pode gerar aquilo que, na Sociologia, chama-se de anomia: um contexto social no qual as regras são incapazes de produzir normalidade no bojo da sociedade.

Em períodos anômicos, formam-se grupos que se autointitulam vigilantes, protetores, e atuam, ilegalmente, como policiais, tribunais e executores daqueles que são considerados infratores, criminosos. José de Souza Martins, sociólogo e especialista no estudo dos linchamentos, afirma que:

“A justiça formal e oficial deixou de aplicar a pena de morte, ainda no Império, abolida por lei, mas o povo continuou a adotá-la em sua mesma forma antiga através dos linchamentos. Trágica expressão do divórcio entre o legal e o real que historicamente preside os impasses da sociedade brasileira, divórcio entre o poder e o povo, entre o Estado e a sociedade. Os linchamentos, de certo modo, são manifestações de agravamento dessa tensão constitutiva do que somos. Crescem numericamente quando aumenta a insegurança em relação à proteção que a sociedade deve receber do Estado, quando as instituições não se mostram eficazes no cumprimento de suas funções, quando há medo em relação ao que a sociedade é e ao lugar que cada um nela ocupa”.

Motoristas têm usado seus carros como armas para impedir roubos; jovens estão formando grupos de vigilantes para proteger seus bairros e moradores. São, em grande parte das vezes, apoiados e aplaudidos. Vivemos numa sociedade fraturada e violenta. 

Não há, obviamente, respostas simples à violência. O problema não é, apenas, jurídico e sim sociológico e político. Reclama, enfim, um equacionamento distante do sedutor simplismo. A resolução exige inteligência, coragem e ações no âmbito governamental e na própria sociedade que, em algum momento, deverá escolher entre a barbárie ou a vida civilizada.

Rodrigo Prando é Professor e Pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Graduado em Ciências Sociais, Mestre e Doutor em Sociologia, pela Unesp.

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