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sábado, 18 maio, 2024

A escravidão passou pelo aleitamento materno

O Brasil foi o último país do continente americano a abolir a escravidão, e o negro liberto não recebeu nenhum tipo de auxílio do governo para que pudesse sobreviver

Por Manoel Goes

O maior movimento de revolta de escravizados no Espirito Santo, a Insurreição do Queimado, no município da Serra, desencadeada em 19 de março de 1849, completou 175 anos. Uma história de resistência, de luta do nosso povo preto e que merece ser conhecida por todos os capixabas, principalmente os estudantes. Um fato histórico que comprova, que na nossa história, o povo preto foi, com certeza, protagonista e reativo em sua luta por liberdade, pelo fim da escravidão e por direitos.

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Alimenta o senso comum uma visão muito distorcida da nossa história de que tudo se resumiu à promulgação da Lei Aurea, em 13 de maio de 1888. Recomendo a leitura do livro “Insurreição do Queimado: 140 anos do pioneirismo de Afonso Cláudio no livro reportagem nacional”, de José Antonio Martinuzzo.

Relação de servidão e resquícios da servidão ainda existem no Brasil. O conflito racial existe sim nos tempos atuais. Como exclusão fabricada, a sociedade brasileira pratica com naturalidade o racismo. Joaquin Nabuco disse que: “a escravidão permaneceria por muito tempo como um traço da formação brasileira”.

Usou Joaquin Nabuco de uma imagem terrível, de que a escravidão passou no aleitamento materno, onde as pretas amas-de-leite alimentavam os filhos e filhas dos seus senhores.
Em “Minha Formação”, sua autobiografia, Nabuco cita ainda – de passagem e sem lhe dar nome – a negra que o amamentou e dele cuidou: “A noite da morte de minha madrinha é a cortina preta que separa do resto de minha vida a cena de minha infância. Eu não imaginava nada, dormia no meu quarto com minha velha ama, quando ladainhas entrecortadas de soluços me acordaram e me comunicaram o terror de toda a casa”.

Ama de leite, mãe preta de aluguel, era um ofício no Brasil escravocrata, de antes e de depois da Abolição. Anúncios nos jornais de papel procuravam: “Preta, com muito bom leite, prendada e carinhosa”. Negras que alimentavam o corpo e alma dos bebês brancos. Era deles a primeira mamada, isso quando a mãe preta tinha filhos próprios e com eles podia ficar.

Passados 136 anos da abolição da escravatura, o povo preto ainda luta por direitos e protagonismo. A Lei Aurea, assinada em 13 de maio de 1888, considerou livres, aproximadamente, 700 mil escravos. Atualmente, os negros são mais de 54% da população do país e as desigualdades continuam.

O Brasil foi o último país do continente americano a abolir a escravidão e o negro liberto não recebeu nenhum tipo de auxílio do governo para que pudesse sobreviver. Pesquisadores afirmam que, com a falta de oportunidades e o racismo, o quadro de desigualdade perpetuou-se no país e tem reflexos até os dias atuais com a exclusão social.

As evidências estão nos fatos trágicos que acontecem com os pretos no Brasil e pelo mundo afora. Agressões e mortes de pretos sem compaixão, por coisas pequenas, abusando da autoridade constituída. Gostaríamos de saber até quando esses abusos continuarão a acontecer? E as punições exemplares, ocorreram de forma contundente? Fica a reflexão.

Manoel Goes Neto é escritor, produtor cultural e diretor no IHGES.

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