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quarta-feira, 1 maio, 2024

Riscos menores, retorno maior

O comprometimento com a responsabilidade social corporativa pode influenciar positivamente a percepção de risco de uma empresa

A discussão sobre o desenvolvimento sustentável nas empresas vem trilhando novos caminhos com o passar dos anos. Se antes era comum vermos grandes organizações entrando em conflito com as comunidades e com o meio ambiente, hoje essa realidade já é um pouco diferente. Um indício que já podia ser observado na década de 1980 com a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas, que oficializou o conceito de “desenvolvimento sustentável” para disseminar o princípio de que as necessidades da geração atual sejam satisfeitas sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias demandas.

A iniciativa contribuiu para repensar os modelos de negócios e deixou de ser analisada somente pelo lado ambiental, atingindo também os campos sociais, econômico, cultural, institucional, político e espiritual – este último, trabalhando com a satisfação do indivíduo em prol do coletivo. Trata-se de mudanças cada vez mais necessárias em um ambiente de negócios.

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“Quando se fala em sustentabilidade, as pessoas imaginam que ela só esteja associada ao meio ambiente, o que não é verdade. Temos outros fatores importantes que precisam estar inseridos na responsabilidade social corporativa e que fazem com que o negócio seja duradouro. Não adianta querer que a empresa sobreviva se você não olha para todos esses pilares”, explica Valcemiro Nossa, professor da Fucape Business School e doutor em Contabilidade.

Pilares que, segundo o gerente-geral de Controladoria, Riscos & Compliance da ArcelorMittal Brasil Aços Planos, Paulo Wanick, devem estar alinhados com a transparência das empresas.

“Nós estamos sofrendo um momento de transformação no mundo corporativo. O papel desempenhado pelas empresas vem tendo uma percepção diferenciada pela sociedade, principalmente por conta desse relacionamento que está mudando. As organizações estão cada vez mais atentas ao caráter corporativo, dando uma prioridade muito grande à transparência”.

Algo que pode ser justificado, principalmente, pela cobrança da sociedade. “O comportamento do mercado foi alterado em função da sociedade que está exigindo mais. Antigamente as empresas viam a sustentabilidade como um custo, e hoje, veem como um investimento”, afirma o superintendente-executivo do Instituto Terra, Adonai José Lacruz.

Um investimento e uma transparência capazes de serem usufruídos como fonte de vantagem competitiva para melhorar o desempenho e a imagem de uma empresa, principalmente se ela estiver comprometida com a Responsabilidade Social Corporativa (RSC), que pode influenciar na percepção (e por consequência, redução) de risco e no capital das organizações.

“Um passo mal dado pode gerar sérios danos à sua imagem, ou seja, em um único deslize você pode perder tudo que levou anos para construir” – Valcemiro Nossa, professor da Fucape Business School doutor em Contabilidade.

Gestão De Risco

As empresas estão enfrentando uma nova realidade de risco, que se caracteriza por exposição e cobrança de sua responsabilidade por problemas ambientais, sociais e éticos, o que acaba implicando em uma melhor gestão para aprender a gerenciar as expectativas de seus públicos, fator extremamente importante para que não sofram danos em sua reputação ou até a perda da licença para operar. Esses novos elementos colocam os gestores empresariais diante de um desafio: monitorar constantemente as questões socioambientais em suas atividades, ampliando a gestão de riscos corporativos e criando novos modelos de negócios que possam fazer uso da sustentabilidade como geradora de valor para os seus investidores.

“Quanto mais transparentes forem, melhores são as chances de mostrar o caráter corporativo, o que faz com que a organização seja percebida de maneira positiva. Para que ela possa crescer, precisa gerar valor, ou seja, apresentar menos riscos faz com que a fonte de recursos seja menos onerosa. Isso aumenta a competitividade perante os concorrentes”, explica Wanick.

A maneira como as empresas realizam seus negócios, os critérios que utilizam para as tomadas de decisão, os valores que definem suas prioridades e os relacionamentos com os seus stakeholders podem minimizar consideravelmente os riscos. De acordo com Valcemiro Nossa, a “boa impressão” se torna positiva tanto para acionistas quanto para credores. “Uma organização que faz uso da responsabilidade social corporativa gera menos preocupação para os seus investidores, que investem mais. Por conta desse baixo risco, o endividamento dela acaba ficando pequeno. Já aquelas que apresentam riscos grandes ficam com dificuldade de ter acionistas, e, se precisarem pegar um dinheiro emprestado no mercado terão que recorrer a bancos, onde a taxa de juros é altíssima”.

Caso a empresa venha a se comprometer por conta de um deslize, é possível que em determinadas situações o pagamento dos financiamentos seja adiantado. Afinal, quais seriam as garantias que os bancos e os credores teriam nesse tipo de situação? O tratamento dos riscos, além de melhorar o desempenho financeiro da organização, também contribui para que sua reputação fique fortalecida, o que faz com o mapeamento de todos esses elementos em prol da redução das ameaças ao negócio se torne extremamente necessário, principalmente pela geração de valor sustentável aos acionistas.

“Antigamente as empresas viam a sustentabilidade como um custo, e hoje, veem como um investimento” Adonai José Lacruz, superintendente executivo do Instituto Terra

“A empresa pode ser exposta a uma situação crítica, fazendo com que ela entre em falência, algo que deixará o banco sem dinheiro. Em todo financiamento, existem cláusulas que a organização precisa manter. O problema é que se ela oscilar muito, existe a possibilidade de a dívida ser totalmente antecipada para pagamento imediato”, revela Paulo Wanick.

De acordo com Valcemiro, é preciso conquistar a confiança do mercado. “A organização precisa estar atenta ao capital moral. Para conquistar a confiança do mercado, isso precisa ser trabalhado de forma gradativa. Um passo mal dado pode gerar sérios danos à sua imagem, ou seja, em um único deslize você pode perder tudo que levou anos para construir”, complementa.

Índice Sustentável

A preocupação com a sustentabilidade é tão grande que novas formas de valorização à prática vêm surgindo ao longo do tempo, a exemplo do Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), estruturado pela Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) em conjunto com outras entidades, para avaliar as empresas que tenham boas práticas sustentáveis e comprometimento com a RSC.

A iniciativa busca diferenciar as companhias para investidores que não tenham como preocupação inicial o retorno financeiro de curto prazo, criando um ambiente de investimento compatível com as demandas da sociedade. Um fator que ajuda a contribuir para uma maior credibilidade das organizações junto aos seus stakeholders.

Segundo o estudo “O Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) e os impactos no endividamento e na percepção de risco”, “empresas caracterizadas por elevada performance social corporativa (RSC) possuem bons relacionamentos com fornecedores, clientes, credores, acionistas, além da comunidade local e do Governo”.

“O ISE serve como um sinalizador para o mercado. As empresas que fazem parte do índice possuem uma série de características interessantes, pois são politicamente corretas e socialmente responsáveis. Ou seja, elas passam uma segurança maior. Para solicitar a participação no ISE, a organização precisa ter ações que apresentem bastante liquidez (que são comercializadas praticamente todos os dias), além de estar de acordo com todos os requisitos necessários para sua inserção. Mas é óbvio que existem muitas empresas qualificadas que não estão no índice e que realizam trabalhos muito bons”, afirma Valcemiro Nossa.

Essa realidade demonstra que as obrigações das empresas vão além dos quesitos econômicos e legais – sejam elas micro, pequenas, médias ou grandes – e que não necessariamente se enquadram somente nas organizações participantes do ISE. De acordo com Wanick, todo empreendedor que deseja prolongar o sucesso de seu negócio precisa estar atento à Responsabilidade Social Corporativa.

“Para garantir um retorno para a empresa e para o acionista, é preciso entender as dimensões e as perspectivas com as quais ela está associada. Será que ela é voltada somente para o lado econômico, de medir lucros? Ou também se preocupa com as relações humanas e os recursos naturais? ”, afirma.

Indice De Responsabilidade Empresarial

Com a finalidade de atender à crescente demanda por investimentos que fossem socialmente responsáveis e rentáveis, no final de 2005, foi criado pela Bovespa o ISE, em conjunto com outras instituições (Abrapp, Anbid, Apimec, IBGE, IFC, Instituto Ethos), seguindo uma tendência das principais Bolsas de Valores do mundo, na premissa de que empresas que se preocupam com a sustentabilidade geram valor ao acionista no longo prazo. O ISE, segundo a Bovespa (2009), objetiva refletir o retorno de uma carteira teórica composta por ações de empresas brasileiras que promovam boas práticas e que tenham comprometimento reconhecido com a responsabilidade social e a sustentabilidade empresarial, de maneira que as firmas estariam mais preparadas para enfrentar riscos econômicos, sociais e ambientais.

“Quanto mais transparentes forem, melhores são as chances de mostrar o caráter corporativo, o que faz com que a organização seja percebida de maneira positiva” – Paulo Wanick, gerente-geral de Controladoria, Riscos & Compliance da ArcelorMittal Brasil Aços Planos

Colocando a “mão na massa”

Empresas que sinalizam comprometimento com a RSC mostram uma relação negativa com o financiamento via dívida, quando comparadas àquelas que não sinalizam um comprometimento. Ou seja, estar atento a todos esses quesitos é um grande diferencial, uma prática que também pode ser aplicada às pequenas e médias.

“Caso o banco veja que a empresa apresenta algum tipo de risco, menores são as chances de conseguir um financiamento. Um pequeno negócio que precisa desse tipo de serviço necessita fazer o seu dever de casa, mantendo uma contabilidade, um plano de negócios, definindo ações e realizando simulações futuras do que poderá acontecer mais para frente: tudo isso com base no histórico e nos resultados. Todo esse planejamento apresenta números mais confiáveis. Muitas das empresas que acabam ‘morrendo’ só buscam a aprovação de uma linha de crédito quando estão com a corda no pescoço. O ideal seria que a empresa fosse todo ano ao banco para atualizar essa linha de crédito, mostrando os números bons. Fazendo isso com antecedência, o empresário irá conseguir juros menores no financiamento”, revela Valcemiro Nossa.

Para Adonai José Lacruz, a responsabilidade social pode ser colocada em prática com os próprios funcionários da companhia, em pequenas atitudes do dia a dia. “As ações podem ter início com os funcionários e com as famílias deles. Outro ponto importante são as ações dentro da comunidade com trabalhos de assistência social ou até mesmo com um plantio simbólico de mudas de árvores. Cada empresário, dentro de seu pequeno negócio, pode modificar um comportamento”.

Esta matéria foi publicada originalmente na edição N°112 da revista ESBrasil, de novembro de 2014. As pessoas ouvidas e/ou citadas podem não estar mais nas situações, cargos e instituições que ocupavam na época, assim como suas opiniões e os fatos narrados referem-se às circunstâncias e ao contexto de então.

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