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quarta-feira, 1 maio, 2024

O fim dos empregos

Nenhuma tecnologia é única, muito menos é (nem nunca foi) determinista – para gerar o desemprego em massa -, mas condicionante

Por Cláudio Rabelo

Imagino a revolta dos Sumérios há aproximadamente cinco mil anos. Quando inventaram as primordiais formas de escrita devem ter causado imenso terror social: o que seria dos oradores ou trovadores? A partir de então, os preguiçosos iriam se contentar em ler a Epopéia de Gilgamesh nas tabuletas e não precisariam mais decorar os textos. Isso será o fim do trabalho dos oradores.

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Também não me agrada pensar no terror causado pela invenção e posterior popularização da prensa de tipos móveis por Gutemberg no século XV. Os livros iriam acabar com a profissão dos escribas e também ajudariam a matar o latim, uma vez que as cópias impressas passariam a ser produzidas em escala nas línguas populares, ou românicas. Uma verdadeira revolta da classe escriba, que estudou tanto para ocupar tal função.

E a energia elétrica… quanto pavor! Veio para acabar com o emprego dos carvoeiros e de todos aqueles que trabalhavam nas indústrias de lamparinas.

E o telefone que veio para dar fim aos correios. Pobres dos carroceiros, carregadores de liteiras e pilotos de bigas… o que seria deles com a ascensão dos automóveis movidos à combustão?

E o computador? Sua capacidade de processamento já prometia o fim de indústrias e empregos. Os bancos dispensariam milhares de datilógrafos e o armazenamento de dados determinaria o fim da indústria de papel.

Lembro como as indústrias do cinema e da música lutaram contra a inevitabilidade do streaming. O Metallica e sua incansável luta judicial contra o Napster. Ora, ora… a pirataria diminuiu a renda com a bilheteria, mas ampliou exponencialmente o alcance para novos públicos. Assim como a máquina fotográfica “libertou a mão do artista” (que não mais precisaria se restringir ao retrato) a pirataria mostrou ao mercado do entretenimento que seu potencial era muito maior do que a bilheteria ou as vendas de CDs e livros. No caso dos jornais, demoraram a perceber que a veiculação dos reclames em seus intervalos era peixe pequeno para o potencial real dos negócios, com a exploração do conteúdo e seus derivados.

O fim da bonificação por volume e das comissões sobre veiculação pareciam apontar o fim das agências de propaganda e veículos de comunicação. Ledo engano. A integração multicanal, o inbound, a aprendizagem da máquina (machine learning), a luta pela melhoria da experiência dos usuários (UX e UI), pela governança ambiental, social e corporativa (ESG), a orientação do negócio pelos dados, as realidades ampliadas, mistas e o metaverso, o digital out of home, a internet vestível, háptica e das coisas, a explosão das mídias sociais, a mídia programática, os eventos, a cocriação, o marketing de influência e uma série de outros fatores não somente passaram a sustentar o negócio da comunicação, como valorizá-lo e ampliar as atividades e funções profissionais em escala exponencial.

Esta perspectiva não desconsidera os perigos de um capitalismo exacerbado, com a precarização do trabalho, as demissões em massa e o monopólio da mídia e das informações. Aqui a crítica é voltada para a visão dualista, apocalíptica ou simplista, quando se reduz a potência de uma nova ao medo incontrolável. Nenhuma tecnologia é única, mas envolve milhares de processos sociotécnicos. E nenhuma tecnologia é (nem nunca foi) determinista, mas condicionante.

Então quando me dizem que os empregos irão acabar com o Chat GPT, eu respondo: Quem dera! Esse dia não chegou e não vai chegar tão cedo. Pelo menos não por causa do Chat GPT, uma forma de inteligência artificial capaz de produzir textos, que ao olhar do leitor mais leigo, pode parecer ter sido escrito por um especialista, mas a meu ver (pelo menos em sua interface atual) transpira “blefe”.

Quem sabe chegará o dia em que as máquinas trabalharão por nós, para que possamos nos focar mais no que realmente importa, mas ainda estamos longe disso.

Cláudio Rabelo é coordenador do curso de Comunicação Social – Publicidade e Propaganda na UFES. Pós-doutor em Estudos Culturais e Autor do livro “A estratégia do cafezinho: como transformar produtos em marcas imbatíveis”, publicado pela Alta Books em 2023.

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