Entenda como fica a saidinha de presos com nova Lei

0
59
Especialistas e entidades relacionadas à segurança pública são contrários à nova regra
Lei que restringe o benefício foi sancionada com vetos. Foto: Antônio Cruz

Maior parte da lei que restringe as saídas temporárias de presos – as saidinhas – foi sancionada. Especialista avalia o cenário formado com a nova lei

Por Kebim Tamanini

Após intensos debates e certo descontentamento, o governo federal sancionou um projeto de lei que veda a chamada “saidinha” dos presos em regime semiaberto, conforme aprovado pelo Congresso Nacional. Segundo o novo texto, esse benefício será concedido apenas para os detentos em regime semiaberto se estiverem matriculados em cursos de supletivo profissionalizante, ensino médio ou superior.

- Continua após a publicidade -

O número de detentos que não retornaram às prisões após desfrutarem das saídas temporárias chamou a atenção das autoridades de boa parte dos parlamentares do Congresso Nacional que correram com o tema para aprovar a medida mais restritiva ao grupo. De acordo com o Relatório de Informações Penais da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), mais de 15 mil presos deixaram de se apresentar no ano passado, destacando-se 385 casos no Espírito Santo.

Atualmente, a Lei de Execução Penal de 1984 permite a saída temporária por até sete dias, em quatro ocasiões durante o ano, para visita à família ou participação em atividades que favoreçam a reintegração social.

O regime semiaberto é aplicável a indivíduos que cumprem penas de 4 a 8 anos, desde que não sejam reincidentes. Nesse modelo, os detentos têm a oportunidade de realizar cursos ou trabalhar em locais pré-determinados fora da unidade prisional durante o dia, retornando à noite ao cárcere. Com a nova mudança, os condenados por crimes hediondos, violentos ou que envolvam grave ameaça contra pessoas não poderão realizar trabalho externo sem vigilância direta.

O advogado criminalista Rafael Lima criticou a nova lei, afirmando que ela praticamente elimina a saída temporária e ressaltou que a maioria dos detentos do sistema prisional está envolvida em crimes equiparados a hediondos, especialmente o tráfico de drogas. “Essa lei populista traz uma série de problemas para o sistema, pois ao proibir crimes hediondos, que abrangem grande parte dos presos, como o tráfico de drogas, ela afeta principalmente a população mais vulnerável”, explicou.

Especialistas e entidades relacionadas à segurança pública são contrários à nova regra
O advogado criminalista Rafael Lima. Foto: Assessoria

Progressão de regime

A recente legislação sobre direito criminal aborda diversos pontos, incluindo a progressão de regime e o uso de tornozeleiras eletrônicas, conforme destacado por especialistas.

Segundo Rafael Lima, a nova lei estabelece que a progressão de regime, da modalidade fechado para semiaberto, dependerá de um exame criminológico favorável, além do cumprimento das demais exigências legais, como bom comportamento e tempo mínimo de pena cumprida no regime anterior.

Entretanto, há críticas em relação ao exame criminológico. “O próprio Conselho Nacional de Psicologia não reconhece respaldo técnico ou científico para essa prática. O exame muitas vezes se resume a uma entrevista superficial com o detento, sem respaldo técnico adequado para determinar sua aptidão para a progressão de regime”, enfatiza o advogado criminalista.

No caso da progressão para o regime aberto, além do exame criminológico, o condenado também deverá demonstrar indícios de que conseguirá se ajustar com baixa periculosidade ao novo regime. Outra mudança trazida pela legislação é a autorização para que o juiz da execução penal possa determinar o uso de tornozeleira eletrônica no regime aberto, uma medida até então restrita ao regime semiaberto.

Especialistas e entidades relacionadas à segurança pública são contrários à nova regra
O direito às saídas temporárias existe desde 1984, quando foi sancionada a Lei de Execuções Penais. Foto: Reprodução

Entenda como ficou a saída temporária de presos

  • Os presos em regime semiaberto mantêm o direito a cinco saídas anuais de sete dias, as quais podem ser utilizadas para:
  1. Visitas a familiares, especialmente em feriados como Páscoa e Natal.
  2. Participação em atividades sociais visando à ressocialização.
  3. Frequência a cursos supletivos profissionalizantes, bem como de instrução do ensino médio ou superior, na Comarca do Juízo da Execução.
  • Os critérios a serem observados são: comportamento adequado na prisão; cumprimento mínimo de 1/6 da pena, se o condenado for primário, e 1/4, se reincidente; e compatibilidade do benefício com os objetivos da pena.
  • Ficam proibidas as saídas temporárias para presos em regime semiaberto que tenham cometido crimes hediondos, violentos ou que envolvam grave ameaça, como estupro ou homicídio.
  • Passa a ser obrigatória a realização de exame criminológico para que o preso possa progredir do regime fechado para o semiaberto e, assim, ter acesso ao direito às saídas temporárias.
  • Os presos que avançam do regime semiaberto para o aberto devem ser obrigatoriamente monitorados eletronicamente por meio de tornozeleiras eletrônicas.
  • Conforme as regras que já vigoravam anteriormente, para ter direito ao benefício, o preso precisa obter autorização do juiz responsável pela execução penal, além de parecer positivo do Ministério Público e da administração prisional.

Veto presidencial

O presidente Lula sancionou a maior parte da Lei que restringe as saídas temporárias de presos, porém vetou apenas o trecho que impedia a saída temporária para presos que desejam visitar suas famílias. Contudo, Lula optou por manter a parte do texto que proíbe a saída para condenados por crimes hediondos e violentos, como estupro, homicídio e tráfico de drogas.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, explicou que o veto ocorreu porque o trecho vetado violava a Constituição Federal. “Nós entendemos que a proibição às famílias dos presos que já se encontram no regime semiaberto atenta contra valores fundamentais da Constituição: o princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio da individualização da pena e a obrigação que tem o Estado de proteger a família”, ressaltou.

O Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), uma organização composta por profissionais da área, representantes da sociedade civil e pesquisadores acadêmicos dedicados à segurança pública, manifestou apoio ao veto parcial interposto pelo Presidente da República à lei que restringe as saídas temporárias de presos em regime aberto.

Entenda como fica a saidinha de presos com nova Lei

“A saída temporária, como era prevista, era um instrumento de execução da pena privativa de liberdade voltado a fortalecer vínculos familiares, reduzir tensões carcerárias e possibilitar a reintegração social do preso”, diz trecho do parecer divulgado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Apesar do respaldo do Ministério da Justiça e Segurança Pública e de entidades relacionadas ao tema, o cenário político no Congresso Nacional indica que o veto presidencial deverá ser derrubado no dia 18 de abril, data marcada para a análise dos vetos pelo Congresso, onde deputados e senadores devem decidir sobre a questão.