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quinta-feira, 25 abril, 2024

A história da moqueca capixaba

Motivo de orgulho, Dia da Moqueca Capixaba é celebrado nesta quinta-feira (30)

Por Munik Vieira

O capixaba não resiste a uma boa moqueca, preparada em uma tradicional panela de barro. O prato, que é motivo de orgulho para o nosso povo, ganhou até uma data especial no calendário, para não passar em branco. Instituído por meio de lei pela Prefeitura de Vitória, o “Dia da Moqueca Capixaba” é comemorado nesta quinta-feira, dia 30 de setembro e não deixa de ser mais um motivo para você saber ainda mais sobre as origens dessa delícia que tanto apreciamos.

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De acordo com a diretora de Turismo, da Companhia de Desenvolvimento, Turismo e Inovação de Vitória (CDTIV), autora do projeto de lei que criou a data comemorativa, quando deputada estadual, em 2012, o dia é mais que especial. “A moqueca capixaba é um prato riquíssimo de sabores, aromas e tradições. É um prato típico da gastronomia capixaba, servida nos principais restaurantes de Vitória e, que atrai turistas de todo o Brasil e até de fora, interessados em degustar esse verdadeiro símbolo da nossa culinária”, disse.

Para a diretora-presidente da CDTIV, Camila Dalla Brandão, a data merece ser comemorada com orgulho pelos capixabas. “A experiência de saborear uma moqueca bem preparada, com todos os temperos que aguçam o nosso paladar é marcante. Quem aprecia peixe, precisa provar. Além disso, as panelas de barro produzidas aqui receberam o selo de indicação geográfica do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), em outubro de 2011. É a inovação fortalecendo uma das principais tradições do Espírito Santo”, afirmou.

História

De acordo com os historiadores, a moqueca é uma refeição que teve origem antes mesmo da chegada dos portugueses ao Brasil. Assim como outros pratos da gastronomia capixaba, passou por uma intensa mistura de culturas: colonizadores europeus, indígenas e africanos. Essa miscigenação de tradições encontrou a tradição pesqueira, fazendo nascer pratos únicos, saborosos e cheios de histórias.

E a moqueca, não seria capixaba, sem a tradicional panela de barro. Ofício realizado até hoje pelas paneleiras de Goiabeiras. Patrícia Merlo, doutora em História Social, pesquisadora e professora do programa de pós-graduação em História, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) explicou deu mais detalhes sobre a tradição deste prato que encanta e conquista capixabas e visitantes.

*Com informações da Prefeitura de Vitória

A história da moqueca capixaba
Patrícia Merlo. Foto: Reprodução

Fale sobre a relação entre a panela de barro e a Moqueca Capixaba. Esses elementos carregam traços marcantes da cultura indígena e das tradições do nosso povo.

Patrícia Merlo: Em relação à moqueca, é válido considerar que, os estudiosos da gastronomia brasileira apontam que sua origem remeteria à peixada, trazida pelos portugueses, na qual os negros acrescentaram os ingredientes habituais da culinária africana, quando aqui chegaram na condição de escravizados. Contudo, o Espírito Santo recebeu ao longo de sua história um pequeno número de africanos, o que reforça a influência indígena na constituição de nosso patrimônio alimentar.

Tendo no peixe e nos frutos do mar alimentos de extrema importância, assim como a farinha de mandioca e a cor que vem do urucum (elemento utilizado para dar cor aos alimentos). Outro indicativo nessa direção está na forma de preparo da iguaria que, localmente, guarda forte associação com a panela de barro, fruto da técnica cerâmica reconhecida por estudos arqueológicos como legado cultural Tupi-guarani e Uma, com maior número de elementos identificados com os deste último.

Tal saber foi apropriado dos índios por colonos e descendentes de escravos africanos que vieram a ocupar a margem do manguezal, território historicamente identificado como um local onde se produziam panelas de barro. O naturalista Saint-Hilaire visitou a região em 1815 e fez a primeira referência a essas panelas, descritas como “caldeira de terracota, de orla muito baixa e fundo muito raso”, utilizadas para torrar farinha e fabricadas “num lugar chamado Goiabeiras, próximo da capital do Espírito Santo”. Goiabeiras se consolidou como o lugar onde esse ofício de fabricar panelas ocorre até hoje por tradição.

O que é “Moquém”, que deu origem à moqueca?

O moquém é uma técnica indígena presente em diferentes grupos pelo Brasil. Significa algo como “secador” de carne, que poderia ser feito sobre o fogo. Uma espécie de varal sobre as brasas ou o processo de enterrar a carne, normalmente envolvida em folhas, acendendo sobre o lugar uma fogueira, sendo que, quando apagava, a carne estava cozida em seu próprio suco. Nossa panela de barro reproduz esse mesmo processo.

Existe um tipo de peixe mais usado e que faça parte da receita tradicional?

Estou realizando com meu grupo de pesquisa um amplo levantamento de fontes históricas para tentar compreender a constituição da moqueca ao longo do tempo. São fontes impressas diversas: livros de cozinha portugueses publicados a partir de 1680, livros de cozinha brasileiros publicados a partir de 1840, dicionários de língua portuguesa dos séculos XVIII, XIX e XX, e jornais de todo o país a partir de 1827 (inclusive do Espírito Santo, a partir de 1870).

A pesquisa ainda está em andamento, mas o objetivo é localizar os indícios da constituição do prato e as transformações sofridas pela iguaria ao longo do tempo, até se converter em um conceito gastronômico na contemporaneidade. Sobre o peixe mais usado, é curioso que nos jornais do século 19 até 1970, pelo menos, a referência é o papa-terra.

A primeira referência ao prato aparece na edição de 6 de julho de 1864 do Jornal da Victoria, Já o primeiro anúncio de um restaurante, oferecendo moqueca, está na edição de 24 de abril de 1878 do jornal O Espírito-Santense. A primeira defesa das panelas de barro e seus usos na culinária local para o preparo de moqueca e torta, associado à tradição local, está na edição 15 de maio de 1910 do Diário da Manhã.

Qual é a importância dessa tradição para o povo capixaba?

A culinária é um dos modos pelos quais as identidades assumem materialidade. A comida típica não é qualquer comida: representa experiências vividas, representa o passado e, ao fazê-lo, o coloca em relação com os que vivenciam o presente.

O ambiente, muitas vezes performático, que cerca o consumo da moqueca capixaba em panelas de barro fumegantes nos restaurantes do litoral do Espírito Santo, pode ser interpretado como chave de conexão entre o passado e o presente: é comum, por exemplo, a presença de informativos que ensinam ao cliente como preparar o prato, a venda de panelas de barro, introduzindo-o, assim, no universo das experiências vividas no passado.

Podemos afirmar que no decurso do século XX, construiu-se um discurso fechado que associa moqueca, panela de barro e identidade capixaba. Não à toa, o prato está presente em toda a costa capixaba, sendo ofertada em 87% dos restaurantes do litoral.

Receita da Moqueca Capixaba (Serve seis pessoas)

Ingredientes:
2 kg de peixe fresco (badejo ou robalo);
4 a 5 maços de coentro;
4 maços de cebolinha verde;
2 cebolas brancas;
tomate a gosto;
2 limões;
Azeite doce;
Urucum/colorau;
Pimenta a gosto.

Modo de Fazer

A história da moqueca capixaba
Foto: Divulgação

Limpe bem o peixe, corte-o em postas e deixe-o em uma vasilha com o sal e o suco de um limão. Conserve assim pelo menos por uma hora. Separe a cabeça para o pirão. Utilizando uma panela de barro grande, coloque: três colheres de azeite doce, cebola verde, cebola branca, tomate (que pode ser picado em rodelas) e colorau. Em seguida, arrume as postas do peixe e repita a camada de temperos picados. Não adicione água ou sal. Jogue o coentro (tudo bem picadinho) por cima de tudo. Cozinhe em fogo brando e quando abrir fervura coloque umas poucas gotas de limão. Não espere ferver, caso contrário o peixe endurece. Tampe. Espere uns 10 minutos e experimente o sal.

Para o pirão, o processo é o mesmo. Depois de cozida a cabeça, acrescente água fervendo e deixe que a carne cozinhe até quase desmanchar. Retire os ossos, experimente o sal e acrescente a farinha, mexendo sempre para não embolar.

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