Com certa frequência, ouve-se falar que grandes e conhecidas empresas entraram com pedidos de recuperação judicial (RJ). Itapemirim, Dadalto, Itapuã Calçados e Samarco são alguns exemplos
Por Samantha Dias
Mas como funciona o processo de recuperação judicial e como ele pode ajudar a salvar as empresas da falência? Conversamos com o advogado empresarial Luciano Pavan, que atua em recuperações judiciais de grandes empresas. Ele adianta que com o cenário econômico desfavorável dos últimos anos, agravado ainda mais pela pandemia de covid-19, a previsão é de recorde de busca do judiciário com pedidos de recuperação judicial em 2021.
“Esperávamos um recorde de pedidos no ano de 2020, mas com a pandemia e regalias trazidas pelo governo federal com dilatação de prazo para pagamento de tributos e redução de juros e multas, isso se postergou para 2021”, disse.
ES Brasil: Existe um prazo para que a empresa fique em processo de recuperação? Qual o prazo?
Luciano Pavan: A lei 11.101/2005, alterada pela Lei 14.112/2020, estabelece 2 anos, mas isso na prática depende de muitas variáveis, de caso a caso.
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ESB: Durante esse processo, como ficam os pagamentos aos credores e funcionários?
Importante dizer que na RJ quem administra a empresa é o próprio sócio administrador. Porém, o juiz nomeia um administrador judicial que funciona como um fiscal do juiz, e se o administrador da empresa não cumprir as regras e condições legais pode ser afastado e perder a administração da empresa para esse administrador judicial.
A empresa propõe um plano de recuperação judicial que estabelece os critérios de pagamentos às diversas classes de preferência. Esse plano é feito de acordo com as condições financeiras que a empresa está passando naquele momento e precisa ser aprovado numa assembleia de credores e homologado por sentença pelo juiz.
ESB: Após esse prazo, se ela não conseguir se recuperar, é decretada falência?
Sim, mas a falência pode ser decretada por diversas situações diversas também, e até antes desse prazo. Tudo depende de como a empresa será administrada após o deferimento do processamento da RJ pelo juiz, que obedece os critérios previstos no art. 51 e incisos da Lei 11.101/2005.
ESB: E como ficam os funcionários e os credores?
Se a falência foi decretada, basicamente é porque a empresa não conseguiu se recuperar em razão de colapso financeiro, e, nesse caso, o administrador judicial assume a empresa e, em outras palavras, é feita a liquidação dos ativos da empresa. Se esses ativos não cobrirem as obrigações, os credores suportam o prejuízo porque dívida se paga com dinheiro ou patrimônio.
Importante dizer que antes da nova Lei 14.112/2020 se a empresa pagasse na falência 50% dos débitos quirografários sua obrigação estava extinta. Com o advento da nova lei, pagando 25% dessas dívidas está extinta a obrigação.
Antes, com 5 anos após infectado de falência, o administrador da empresa poderia voltar a ser sócio de empresas. É na verdade uma punição para aquele que faliu. Hoje com a nova lei esse prazo caiu para 3 anos, dentre outras coisas.
ESB: A pandemia aumentou o número de empresas com dificuldades. Aumentou também o número de pedidos de recuperação judicial?
Sim. Na verdade esperávamos um recorde de pedidos no ano de 2020, mas com a pandemia e regalias do governo (redução de juros, multas e aumento de parcelamento), isso se postergou para 2021.
ESB: Pela sua experiência, qual a principal “dívida” que compromete o orçamento das empresas?
Depende muito do seguimento e da cultura do empresário. Nem todos os débitos se submetem à RJ. Os tributários por exemplo não se submetem ao plano de recuperação. Os fiduciários também não. Os trabalhistas, sim e os quirografários também.
Historicamente as empresas lá pelos idos de 2008/2009, por exemplo, com reflexos da crise dos Estados Unidos aqui, procuraram os bancos para obterem capital de giro com juros consideráveis, que a princípio cabiam no seu bolso. O Governo Federal da época até dizia que seria uma “marolinha” no Brasil. Assim, as empresas que até então estavam em ascensão tiverem significativa queda de faturamento e com essa busca aos bancos na ânsia de dias melhores tiveram a surpresa de uma grande crise e da economia que não reagiu. Em 2015 veio uma avalanche de recuperação judicial, e agora em 2021 um terremoto. E isso é resultado de décadas de um governo até então isento e que só primava por políticas sociais, esquecendo-se de fortalecer quem empregava.
ESB: Tem como as empresas se recuperarem? É comum isso acontecer?
Temos um tempo certo para se propor a ação de recuperação judicial. Se as empresas procurarem auxílio no tempo certo, elas saem fortalecidas. Porém, no Brasil, o empresário só procura ajuda quando já está em colapso financeiro irreversível, e nesse caso passa por uma recuperação judicial para, lá na frente, falir mesmo.
A recuperação judicial é muito favorável e traz muitos benefícios para a empresa, mas precisa ser ajuizada no tempo certo. Assim, a sugestão é que os empresários procurem saber como funciona procurando um profissional para uma análise financeira e contábil.