Economista capixaba analisa os impactos causados pela invasão russa à Ucrânia na alimentação e combustíveis
A invasão da Ucrânia por tropas russas pode produzir impactos econômicos a mais de 10 mil quilômetros de distância. O Brasil pode sentir os efeitos do conflito por meio de pelo menos três canais: combustíveis, alimentos e câmbio.
Em entrevista exclusiva ao Portal ES Brasil, o integrante do Conselho Regional de Economia (Corecon-ES) Sebastião Demuner, adiantou na sexta-feira (25), que o conflito iria impactar em diversos aspectos da economia brasileira.
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“Nós temos nossas exportações com a Rússia e os EUA, são parceiros comerciais do Brasil. As relações com a própria China podem ser impactadas. Existia todo um organismo global e uma logística preparada, que agora não vai existir mais”, explicou.
Aumento dos Juros
A instabilidade no Leste europeu pode não apenas impactar a inflação como pode resultar em aumentos adicionais nos juros, comprometendo o crescimento econômico para este ano ao reduzir o espaço para a melhoria dos preços e do consumo.
Segundo a pesquisa Sondagem da América Latina, divulgada nesta semana pela Fundação Getulio Vargas (FGV), as turbulências na Ucrânia devem agravar as incertezas que pairam sobre a economia global nos últimos meses.
No Brasil, os impactos deverão ser ainda mais intensos. Uma das razões é a exposição maior aos fluxos financeiros globais que o restante da América Latina, com o dólar subindo e a bolsa caindo mais que na média do continente.
Clima Econômico no Brasil
A própria pesquisa, que ouviu 160 especialistas em 15 países, constatou a deterioração do clima econômico. Na média da América Latina, o Índice de Clima Econômico caiu 1,6 ponto entre o quarto trimestre de 2021 e o primeiro trimestre deste ano, de 80,6 para 79 pontos. No Brasil, o indicador recuou 2,8 pontos, de 63,4 para 60,6 pontos, e apresentou a menor pontuação entre os países pesquisados.
Grande parte da queda deve-se ao Índice de Situação Atual, um dos componentes do indicador, que reflete o acirramento das tensões internacionais e o encarecimento do petróleo no início de 2022.
O outro componente, o Índice de Expectativas, continuou crescendo, tanto no continente como no Brasil, mas a própria FGV adverte que o indicador que projeta o futuro também pode deteriorar-se caso o conflito entre Rússia e Ucrânia se prolongue.
Importação de Trigo
Um dos canais pela qual a guerra no Leste europeu pode afetar a economia brasileira são os alimentos. A Rússia é a maior produtora mundial de trigo. A Ucrânia ocupa a quarta posição. Nesse caso, o Brasil não pode contar com outros mercados porque a seca na Argentina, tradicionalmente maior exportador do grão para o Brasil, está comprometendo a safra local.
“O impacto pode acontecer na mesa do brasileiro. O Brasil é um grande importador de trigo da Rússia e pode haver escassez de trigo no mercado, aumentando o preço das exportações, o preço da farinha e do pão, por exemplo. Além disso, há a questão do dólar, que também está subindo. Então, é provável que os derivados subam de preço”, comentou o economista capixaba.
A crise no mercado de petróleo também pressiona os alimentos. Isso porque a Rússia é o maior produtor mundial de fertilizantes, que também são afetados pelo petróleo mais caro. Atualmente, o Brasil compra 20% dos fertilizantes do mercado russo. O aumento do diesel também interfere indiretamente no preço da comida, ao ser repassado por meio de fretes mais caros.
Dólar e juros
Outro fator qual a crise entre Rússia e Ucrânia pode impactar a economia brasileira será por meio do câmbio. O dólar, que chegou a atingir R$ 5,00 na quarta-feira (23), fechou a sexta-feira (25) a R$ 5,15 após a ocupação de cidades ucranianas por tropas russas.
Por enquanto, os efeitos no câmbio são relativamente pequenos porque o Brasil se beneficiou de uma queda de quase 10% da moeda norte-americana no acumulado de 2022. O prolongamento do conflito, no entanto, pode anular a baixa do dólar no início do ano.
Nesta semana, o secretário do Tesouro Nacional, Paulo Valle, disse que o Brasil está preparado para os impactos econômicos da guerra. Segundo ele, o país tem grandes reservas internacionais e baixa participação de estrangeiros na dívida pública, o que ajudaria a enfrentar os riscos de uma turbulência externa prolongada.
No entanto, caso o dólar continue a subir e a inflação não ceder, o Banco Central pode ver-se obrigado a aumentar a taxa Selic (juros básicos da economia) mais que o previsto.
Petróleo e Gás
O principal canal com relação ao conflito entre Rússia e Ucrânia é mesmo o preço internacional do petróleo, cujo barril do tipo Brent encerrou a semana em US$ 105, no maior nível desde 2014.
“O Petróleo estava U$ 80,00, agora está mais de U$ 100,00. Se o Brasil é importador de petróleo, vamos sentir muito o impacto aqui”, comentou Demuner.
O mesmo ocorre com o gás natural, produto do qual a Rússia é a maior produtora global, cujo BTU, tipo de medida de energia, pode chegar a US$ 30, segundo disse nesta semana em entrevista coletiva o diretor de Refino e Gás Natural da Petrobras, Rodrigo Costa.
O Brasil usa o gás natural para abastecimento das termelétricas. Para o diretor da estatal, a perspectiva é que a elevação dos reservatórios das usinas hidrelétricas no início do ano possa compensar, pelo menos nesta fase de início de conflito.
Gasolina e Diesel
Em relação à gasolina, a recuperação da safra de cana-de-açúcar está reduzindo o preço do álcool anidro, o que também ajuda a segurar a pressão do barril de petróleo num primeiro momento. Desde novembro do ano passado, o litro do etanol anidro acumula queda de 24,6% em São Paulo, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Universidade de São Paulo.
As maiores pressões sobre combustíveis estão ocorrendo sobre o diesel, que não tem a adição de etanol e subiu 3,78% em janeiro, segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15), que funciona como prévia da inflação oficial.
Com informações da Agência Brasil, por Wellton Máximo