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sexta-feira, 19 abril, 2024

Patologias Sociais

Com certa franqueza, Hollywood reproduziu a falta de integridade que causou o desastre

Por Sidemberg Rodrigues

Em um café com o neurocientista Gehrard Roos, lhe agradecia o prefácio de meu segundo livro, Miséria Móvel. Ele falava que a energia de uma mente era a capacidade de se indignar. Havíamos acabado de sair do Seminário Internacional de Sustentabilidade, onde abordamos a dimensão social sob uma indignada perspectiva metropolitana.

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Curiosamente, o que me havia inspirado a fazer o livro era o crescente contingente de pessoas em ‘situação de rua’ nas praças e calçadas das grandes capitais. Os índices de desemprego também. De 2007 à primeira metade de 2008 fotografei pedintes de diversas nacionalidades. Enviei o texto e as fotos do livro ao Gehrard em meados de maio de 2008. Ele me entregou o prefácio em julho, durante esse café em Paris, após o evento no qual tínhamos debatido sobre o desequilíbrio e a desigualdade com suas patologias sociais.

Centros urbanos grandes demais têm dilemas superlativos, difíceis de serem compreendidos e resolvidos. Em países em desenvolvimento o grau da complexidade é ainda maior. Mas, o que mais nos incomodava naquele momento  era não saber o porquê do aumento significativo da miséria inclusive em países ricos, falências e pessoas desempregadas. Aquele abrupto crescimento de pedintes também era anormal e não parecia ter como afluentes países habitualmente exportadores de refugiados ou migrantes, vez que nada disso acontecia naquele momento.

E tanto as Américas do Norte e do Sul, quanto a Europa e a Ásia viviam igual fenômeno. Não chegamos a uma conclusão sobre os fatores que poderiam responder por aquela elevação incremental e súbita no contingente da pobreza urbana. O livro, editado em quatro idiomas, foi lançado em agosto de 2008, sem explicações para a fisiologia do fato social patológico que abordava. Mas, a sensibilidade socioeconômica do Sr. Roos observou algo curioso. Ele incluiu entre as possíveis causas da miséria naquele período o que só se percebeu tempos depois, com o anúncio formal de um colapso econômico mundial. Em setembro de 2008 explodia a bolha imobiliária norte-americana, levando à falência bancos tradicionais como o Lehman Brothers, Bear Sterns e o Countrywide, com a prisão de banqueiros e figuras do sistema financeiro, resultando em profunda crise de confiança em Wall Street e desmoronando mercados financeiros e comerciais mundo afora. Falências e desemprego galopante passaram a desestabilizar famílias e nações inteiras. Grécia e Islândia quebraram. Tarde demais para as nações se blindarem contra o efeito dominó da recessão que viria: a economia foi seriamente impactada e, para alguns analistas, efeitos indiretos dessa grande crise podem ser sentidos até hoje. Com certa franqueza, Hollywood reproduziu a falta de integridade que causou o desastre.

O filme A Grande Aposta (2015) é fiel à realidade. Mas, o desespero dos mais vulneráveis que perderam suas casas, o trabalho, a aposentadoria e a dignidade, passou despercebido, sem um happy-end e com a esperança editada em curta-metragem.

Sidemberg Rodrigues é membro da Academia Brasileira de Direitos Humanos, professor e palestrante.

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