A essência do teatro amador era ser praticado por pessoas que não tinham formação acadêmica e que se dedicavam a essa atividade por prazer
Por Carlos Francisco Ola
Na década de 80 enveredei-me pelos caminhos do teatro, a princípio neste interior capixaba, que é Guaçuí, num fazer que envolvia a comunidade, os estudantes e a religião. Era um misto de descoberta e apreensão, pois os envolvidos no grupo teatral nada conhecia de técnica, mas havia uma chama imensa, um amor que não cabia fora do palco.
No Espírito Santo a maioria na época fazia o teatro chamado amador, acredito que em muitos estados brasileiros também era assim. Não se fazia teatro pensando nos cachês, nos editais (nem havia na época), na casa cheia com bilheteria. Era um fazer muitas vezes apenas movido pela paixão. E acreditávamos que podíamos contribuir com mudanças na sociedade através daquele teatro simples, artesanal, sem muitas técnicas.
Em 1985 fui apresentado a um universo novo, o da Federação Capixaba de Teatro Amador – a Fecata, em Vitória. Não compreendia muito aquela política cultural que existia, porém era bem organizado, com reuniões, seminários, congressos, encontros, festivais, mostras. E um palco novo se descortinou com oficinas e viagens… Brasília, Ouro Preto, Mariana, Piracicaba, Recife, Campo Grande e por fim Belém. Tudo para discutir o teatro amador!
Foram anos de intensa experiência para discutir e entender aquele fenômeno, o teatro. A palavra amador não era um peso, e sim um objeto de muitas reflexões. Fazemos teatro por amor, no sentido bem literal da palavra e não pelo fator financeiro? Mas como nós, artistas, sobreviveríamos? Visto que os anos foram passando, e os “amadores” não poderiam cobrar cachês e nem receber recursos de bilheteria, ser contratado por prefeitura, pelo menos se propagava isso.
No início dos anos 90 já se começa a pensar na profissionalização, na necessidade de ter registros no Ministério do Trabalho e se abrir para outras possibilidades. O movimento nacional encabeçado pela Confenata – Confederação de Teatro perdeu sua força, assim como as federações estaduais. A Fecata logo depois virou Fecate – Federação Capixava de Teatro. Surgiram novos cursos, escola técnica, gradução, e aos poucos a palavra “amador” foi retirada do vocabulário de grupos, atores e atrizes em quase todo território brasileiro.


Mas o que é hoje o teatro amador? Nesta segunda-feira, 16 de dezembro, é celebrado o seu dia e é preciso saber que ainda no país se faz esse teatro. São grupos amadores de constituição mista, formados por estudantes secundaristas, universitários, artistas de diferentes áreas e membros da comunidade em geral, em busca de crescimento e reconhecimento. E assim vão trilhando o seu caminho rumo à profissionalização.
A essência do teatro amador era ser praticado por pessoas que não tinham formação acadêmica e que se dedicavam a essa atividade por prazer, sem fazer dela um meio de vida. No teatro amador, os próprios atores que deveriam escrever o roteiro, montar a peça, construir o palco, elaborar e confeccionar os figurinos etc, no entanto hoje a realidade é bem outra com a possibilidade de interagir com oficinas e técnicas, sendo uma ponte para outros voos.
Segundo alguns estudiosos, o Teatro Amador foi e é um espaço de aprendizagem e formação de futuros profissionais das artes do palco. Ele não se limita a imitar os grupos consagrados, mas os acompanha e faz releituras especiais e singulares de seus textos. Tal forma de trabalho contribuiu de maneira determinante para a história do teatro brasileiro, pois foi assim que o Teatro de Arena, o Grupo Oficina e CPD – Centro Popular de Cultura obtiveram reconhecimento e deixaram suas marcas no cenário brasileiro.
O Espírito Santo tem uma história linda com o teatro amador e nessa escola, não acadêmica, fez florescer importantes grupos e nomes que hoje ocupam os palcos de Vitória e do interior capixaba. Nesse registro, vale ressaltar algumas de minhas referências: Maurício Silva, Milson Henriques, Vera Viana, Colette Dantas, Eleazar Pessoa, Afrânio César Baptista, Mecenas Óliver, Wilson Coêlho, entre outros, que me apresentaram essa força das artes cênicas. Viva o teatro amador!
Carlos Francisco Ola é graduado em Letras, pós graduado em planejamento educacional, ator, diretor e dramaturgo. Fundador do Grupo Teatral Gota, Pó e Poeira e coordenador do Festival Nacional de Teatro de Guaçuí