Café puxa o agronegócio capixaba mesmo com alguns fatores que têm causados perdas nas safras; entenda
Por Daniel Hirschmann
O café é o que puxa o agronegócio estadual. O Espírito Santo é o maior produtor de café conilon do Brasil, respondendo por aproximadamente 70% da produção nacional, além de ser responsável por até 20% da produção dessa espécie no mundo. O conilon é a principal fonte de renda em 80% das propriedades rurais capixabas localizadas em terras quentes e responde por 37% do PIB Agrícola. Segundo dados do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), atualmente existem 283 mil hectares plantados com conilon no estado. São 40 mil propriedades rurais em 63 municípios, com 78 mil famílias produtoras. O café conilon gera 250 mil empregos diretos e indiretos.
O Boletim da Conjuntura Agropecuária Capixaba, publicado pelo Incaper, informa que a produção do café no estado saltou de 10,27 milhões de sacas em 2010 para 15,77 milhões em 2022, enquanto a produtividade média passou de 22 sacas por hectare para 38,8 sacas/ha no mesmo período.
No entanto, o documento aponta que o percentual de produtos processados à base de café representou apenas 2,8% do volume total e só 7% do valor das exportações estaduais de café em 2021. “Este resultado mostra que o Espírito Santo tem um grande potencial para ampliação do processamento do café para a agregação de valor e geração de renda na economia capixaba”, diz o boletim.
Para o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Espírito Santo (Faes), Júlio Rocha, apesar do crescimento histórico e das cotações estarem “atraentes”, alguns fatores têm causado perdas que já alcançam entre 30% e 50% da produção.
De acordo com o boletim do Incaper, as causas das perdas incluem bienalidade negativa (variação da produção de um ano para outro), estiagem prolongada e ventos na floração.
Também houve pragas e doenças como boca, ácaro, bicho mineiro e ferrugem, além de fatores climáticos como ventos fortes e seca, que impactaram negativamente a produção e o rendimento médio da cafeicultura.
Em alguns casos, o Incaper apontou ainda falta de investimentos tecnológicos e altos preços de insumos como fertilizantes, comparados com o preço do produto no mercado, o que desestimulou investimentos nas lavouras.
Clima e recursos hídricos
Outro desafio para o setor é a disponibilidade hídrica, uma vez que a água é fundamental para a agricultura e sua escassez pode limitar a irrigação, reduzir a produtividade e aumentar os custos operacionais das lavouras. Para enfrentar essa questão, é necessária uma gestão eficaz da água, com técnicas de irrigação mais eficientes e o uso de tecnologias de monitoramento.
O presidente da Faes questiona, também, a legislação federal que está sendo implantada para cobrança pelo uso da água. “A agropecuária, a agricultura, é o que mais consome água. Só que esse consumo é devolvido para o cidadão urbano, porque para produzir uma tonelada de grãos gastam-se mil toneladas de água. O cidadão urbano paga pela captação, pelo tratamento e pela distribuição, mas não paga pelo uso da água – o que, em cada propriedade, é feito pelo ruralista”, comenta.
Mão de obra e insegurança
Júlio Rocha aponta ainda, entre as dificuldades do setor, a falta de mão de obra qualificada, pois a agricultura moderna exige trabalhadores com habilidades técnicas para operar máquinas avançadas e utilizar novas tecnologias. Além disso, a insegurança no campo, com crimes como roubo e furto de gado e de equipamentos agrícolas, além de invasão de terras, “são preocupações crescentes”.
O dirigente observa que houve avanços a partir do Plano Estadual de Segurança Rural do Espírito Santo, que estabeleceu ações para minimizar os crimes nas regiões agrícolas. No entanto, lamenta que ainda seja comum o roubo de transformadores no campo. “E eles derrubam o transformador no chão para tirar apenas o cobre”, queixa-se ele.
Importância do crédito
Outro obstáculo refere-se aos recursos para a safra. Apesar de os números do Plano Safra serem anunciados como “impressionantes”, Júlio Rocha entende que ainda é preciso melhorar, pois “quando chega ali, no máximo, em setembro, não há mais recursos disponíveis. E o produtor, um otimista por excelência, vai aos bancos, mas se não tem mais aquele dinheiro, ele é convencido a aceitar empréstimos com recursos próprios do banco, o que é mais caro”.
De qualquer forma, segundo ele, os custos acabam sendo um problema. No Programa Nacional da Agricultura Familiar (Pronaf) os juros são de 4%, mas “com os penduricalhos que aparecem, no final de um ano dá 16,82%. Porém, o setor não remunera esse juro. O agricultor vai ter que se desfazer de patrimônio para poder, depois, honrar compromissos”, reclama o presidente da Federação.
Nesse cenário, Eduardo Ton, do Sicoob-ES, acredita que o crédito cooperativo é um diferencial, pois “a gente procura auxiliar o produtor rural a buscar soluções da melhor maneira possível, com aquele atendimento consultivo e orientado para ele”, explica. “A atividade agropecuária tem uma receita, uma margem líquida, muito pequena. Então, precisa de muito recurso para se financiar. O crédito, sem dúvida, é muito importante para o agronegócio.”
No ano safra de 2023/2024, o Espírito Santo cresceu em 30% no crédito rural total – de R$ 5,3 bilhões para R$ 6,9 bilhões – enquanto no Brasil esse crescimento foi de 11%.
“Cresceu quase três vezes mais aqui no Espírito Santo, e no Sicoob-ES a gente cresceu 52% só no crédito rural, ou seja, está acima do mercado do estado e do mercado nacional também”, pontua.
A previsão para 2024/2025 é de que, só no Sicoob, as liberações aumentem mais de R$ 1 bilhão, ou seja, de seus R$ 2,8 bilhões no ano safra anterior, a instituição espera liberar R$ 3,8 bilhões para o agronegócio agora, principalmente para o café. O gerente lembra que o preço para o café variou em quase 100%, saindo de R$ 600 para R$ 1.100, em média.
“Isso anima o produtor rural a investir na sua cultura e anima a instituição financeira a financiar o produtor rural nessa cultura”, diz Eduardo Ton, salientando que a inadimplência no setor fica abaixo de 1%.