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quarta-feira, 8 maio, 2024

Será que vai chover?

Chuvas de verão só amenizam os estragos causados pela longa estiagem no Estado. Para piorar, nem especialistas conseguem mais fazer previsões sobre o futuro climático, que pode variar do extremo de uma nova seca a uma fase de temporais e enchentes
Depois da tempestade, vem a bonança. Você já deve ter ouvido muitas vezes essa expressão para simbolizar que, passado um período turbulento, a situação se acalma. Mas e após a seca? Apesar de o verão ter registrado chuvas dentro da média histórica, a quantidade de água não foi capaz de resolver totalmente os efeitos da mais severa estiagem registrada em 80 anos no Espírito Santo, que durou de 2014 a 2016.

Pior: as nuvens cinzas que ainda pairam no céu capixaba, em vez de chuva, pode ser o prenúncio de mais tempos difíceis. Governo, produtores rurais, empresários e especialistas em meio ambiente temem que as mudanças climáticas observadas nos últimos anos façam o Estado viver entre extremos: ora secas prolongadas, ora tempestades e enchentes. O que torna urgente a busca por soluções para evitar novas catástrofes, seja pela falta, seja pelo excesso de água.

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Será que vai chover?“O que as anormalidades climáticas mostram é que o aquecimento global está começando a afetar os sistemas outrora normais, registrados nos últimos 30 a 50 anos”, analisa Luiz Fernando Schettino, professor de Ecologia e Recursos Naturais da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). “E não se enganem: daqui a pouco pode voltar a chover forte, como aconteceu no fim de 2013, e da seca passaremos a viver a catástrofe das enchentes.”
No verão, porém, as chuvas ocorreram dentro do previsto. Nada que pudesse resolver os problemas causados pela longa seca.

“A estiagem dos últimos três anos deixou um déficit equivalente a um ano sem chuva. No verão passado, choveu dentro da média histórica. Só amenizou a situação. Precisaria ter chovido bem mais para garantir um acúmulo de água”, avalia o diretor técnico do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), Mauro Rossoni Júnior. “Agora, com o período mais seco que começa a partir de maio, durante o inverno, pode ser que a situação volte a se complicar, porque as nossas barragens continuam secas.”

Diante desse quadro, os produtores rurais buscam soluções e esperam por mais apoio para evitar que o prejuízo superior a R$ 2 bilhões acumulados durante a estiagem prolongada não aumente ainda mais.

“A situação continua grave. Nem os climatologistas estão conseguindo fazer uma previsão adequada sobre o volume da precipitação pluviométrica para os próximos meses. Então, a gente tem de se preparar para tudo”, afirma o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Espírito Santo (Faes), Júlio Rocha.

Não por acaso a crise hídrica é um dos principais pontos do Plano Estratégico da Agricultura Capixaba (Pedeag 3), do Governo do Estado, que aponta uma série de ações para o setor até 2030. Entre as medidas para lidar com a seca, está a ampliação da cobertura florestal e da capacidade de reserva de água. O Programa Estadual de Construção de Barragens prevê investimentos de R$ 60 milhões, por meio da Secretaria de Estado da Agricultura, Abastecimento, Aquicultura e Pesca (Seag), para a implantação de 60 reservatórios de água no interior do Estado até 2018. Estima-se que a capacidade de armazenamento será de 67,2 bilhões de litros de água – o suficiente para abastecer 1,2 milhão de pessoas durante um ano ou irrigar 22 mil hectares de café.

Será que vai chover?
“Precisamos ampliar a capacidade de lidar com muita chuva, porque a barragem serve para controlar o excesso de chuva e armazenar água para os períodos de seca. Temos obras prontas, obras em andamento, obras sendo licitadas e projetos de engenharia sendo contratados”, disse o secretário de Estado da Agricultura, Octaciano Neto.

Há também o projeto para a construção de uma represa no Rio Jucu, com capacidade de armazenar 20 bilhões de litros de água, quantidade capaz de abastecer a população por um período de até quatro meses sem chuva. Esse sistema atende a cerca de um milhão de habitantes, em Vila Velha, Cariacica, parte de Viana e ilha de Vitória.

Outro reforço para a região metropolitana virá com o Sistema de Abastecimento de Água Reis Magos, na Serra. Com investimento de R$ 70 milhões, a estrutura deve começar a operar no primeiro semestre deste ano e vai beneficiar diretamente 150 mil pessoas e indiretamente 700 mil, pois diminuirá a sobrecarga sobre o Sistema Santa Maria da Vitória.

Para o professor Luiz Fernando Schettino, porém, essas medidas precisam ser feitas com mais agilidade. “A mobilização para a construção de barragens e caixas secas deve ser mais intensa. É preciso envolver os municípios, estudar cada lugar onde sejam necessárias essas intervenções e fazê-las com urgência”, afirma Schettino.

Citadas pelo professor, as caixas secas são importantes tanto para períodos de estiagem como para os de enchentes, e sua construção vem sendo incentivada pelo Incaper, entre os produtores rurais. Trata-se de um buraco escavado nas margens das estradas para captar água da chuva e os sedimentos levados por ela. Esse método combate enxurradas, assoreamento dos rios e até a destruição das estradas, além de abastecer o lençol freático e os próprios mananciais.

“Antes ninguém dava atenção à caixa seca, mas hoje já reconhecem que, graças a essa técnica, nascentes voltaram a emergir”, destaca Mauro Rossoni, do Incaper. “Nosso trabalho de conscientização segue essa filosofia e incentiva outros métodos, como o uso adequado de sombreamentos e a recuperação de áreas degradadas, como pastagens e encostas.”

Além de barragens e caixas secas, uma medida eficaz e necessária para minimizar os efeitos da crise hídrica ou das enchentes é a recuperação de matas e florestas. Por meio do Projeto Reflorestar, o Governo do Estado almeja aumentar em até 80 mil hectares a cobertura florestal no Espírito Santo, o equivalente a 100 mil campos do tamanho do Maracanã. Área que, na visão de Schettino, poderia ser ampliada também com a participação da sociedade.

“O programa do governo é importante, mas a meta de 80 mil hectares não é capaz de causar um efeito significativo. Para garantir que a terra armazene uma quantidade suficiente de água para o uso da população e da agricultura, é preciso ter uma ambição de chegar a até 400 mil hectares”, opina o professor da Ufes. “É possível mobilizar a sociedade, por meio de igrejas e sindicatos, na busca por sementes e mudas de árvores para o reflorestamento. E ainda fazer apelo aos agricultores para que também plantem seu hectare de floresta.”

Apesar de todas essas ações e da melhoria das condições climáticas, a Companhia Espírito Santense de Abastecimento (Cesan) e outros órgãos do governo continuam recomendando que a população reduza o consumo e faça o reúso da água. No ano passado, 416 bairros da Grande Vitória passaram por um rodízio no abastecimento, que durou 55 dias. Nesse período de racionamento, a população economizou 1,6 bilhão de litros de água, o que daria para abastecer o município da Serra por 36 dias.

Em meados de abril, de acordo com dados da Agência Estadual de Recursos Hídricos (Agerh), a vazão do Rio Jucu voltou a ficar próxima do nível considerado crítico e a do Santa Maria esteve abaixo disso. Assim, o órgão manteve o cenário de alerta e a proibição de captação de água para fins que não sejam o abastecimento humano, das 5 às 18 horas, em todo o Estado.

“Diante desse quadro, ainda não temos noção de como será a recuperação da agricultura este ano. Sabe-se que haverá uma colheita melhor de café, que é a principal cultura do Estado”, afirma Mauro Rossoni, do Incaper. “Mas, na região central e no noroeste do Estado, a situação ainda está crítica. Será preciso ter chuvas acima da média para evitar que o drama continue.”

Situação que assusta o presidente da Faes, preocupado com o drama enfrentado pelo produtor rural capixaba. “Temos testemunhos de que a pobreza no meio rural está avassaladora. Sem perspectiva lá, o produtor vai buscar espaço na periferia das cidades”, aponta Júlio Rocha. “É uma questão de cultura.

Basta uma chuva para as pessoas acharem que tudo já voltou aos eixos. E não é assim. A prevenção é responsabilidade de todo mundo: do cidadão urbano, do rural, do governo etc.”

Será que vai chover?

 A matéria acima é uma republicação da Revista ES Brasil. Fatos, comentários e opiniões contidos no texto se referem à época em que a matéria foi escrita.

 

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