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sexta-feira, 26 abril, 2024

O pós-roça

Se o custo das medidas que reduzem efeito ambiental retirar a competitividade que justifica suas instalações ao sul do Equador, teremos instalado o impasse

Por Eustáquio Palhares

A importância histórica de um ciclo não valida sua contemporaneidade. O consultor Evandro Millet nos brindou com instigantes observações nos artigos que assinara em A Gazeta e, dentre tantos, destaco o que ele intitulou “O pó e a roça”, publicado em 2016. Nele, o articulista releva a necessidade de se fugir de uma visão excludente para a questão que confronta comunidade e as plantas industriais cujas atividades ou processos são intrinsicamente poluidores e, como tal, degradadores ambientais.

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Coloca, assim, que tais projetos necessitam inadiavelmente administrar, senão conter, os efeitos perniciosos desses processos, o permanente incômodo que se materializa na fuligem derramada sobre a cidade, notadamente nos bairros localizados na direção em que correm os ventos predominantes. Imbuído de total bom-senso, ressalta essa necessidade, ao tempo que previne radicalismos que comprometam a manutenção ou a inviabilização de tais atividades por uma consciência ambiental aguda que ignora o legado positivo desses empreendimentos.

Tais projetos, rememora o consultor, foram determinantes para que Vitória rompesse com o seu provincianismo, incorporasse feições cosmopolitas, incrementasse uma dinâmica urbana que passou a exigir serviços e produtos, numa florescente demanda nutrida pela massa de salários que passou a circular na economia local e potencializada por todo o arranjo produtivo que se instalou, a montante e a jusante, dessas mega-plantas.

Vitória passou a contar com um perfil de consumo de maior valor agregado, serviços mais refinados, uma ascendente classe média, profissionais e ocupações. Assim, preconizou, salomonicamente, a necessidade de o conflito ser mediado na perspectiva do ganha-ganha, com transigências de lado a lado que convergissem para o equilíbrio. É, ou seria, o primado do bom senso.

Essa avaliação talvez mereça adendos e reflexões adicionais. É certo que a economia capixaba precisa deixar de ser refém tanto de um modelo de produção de commodities pelo que representa de vulnerabilidade nas crises cíclicas que envolvem seus consumidores finais, quanto pela constatação de que os métodos produtivos que não mobilizem energia limpa estão irreversivelmente condenados. Tolerá-los aparenta ser suportável apenas pelo prazo em que essa transição se consuma sem impactos sociais significativos.

O primeiro mundo já consome pallets de madeira, como insumo de alta combustão, com absoluta inexistência de resíduos da queima que permite que as siderúrgicas renegadas naqueles países possam retomar suas atividades lá. Essa é só uma das alternativas. O certo é que, na ótica do bom capitalismo, se as atividades que hoje se mantêm conseguirem neutralizar completamente o efeito ambiental pernicioso que hoje ainda persiste, elas se habilitam a uma sobrevida.

Se o custo dessa conformidade inviabilizar a adoção das medidas exigidas, retirando-lhes por exemplo a competitividade que justifica suas instalações ao sul do Equador, teremos instalado o impasse.

Assim, com todo o reconhecimento devido ao papel que representaram na modernização da economia capixaba, será inevitável a admissão do fim de um ciclo, durante o qual supõe-se que tenham provisionado lucros suficientes para financiar sua relocalização ou a adaptação de suas instalações para outras finalidades, eventualmente sucedâneos mais elaborados dos seus atuais produtos.

Eustáquio Palhares é jornalista e especialista em Comunicação Empresarial, Gestor de mídia social, Gestor de imagem e reputação e Turismólogo.

Este artigo foi publicado originalmente em 10 de Junho de 2016, no portal da Revista ES Brasil. As pessoas ouvidas e/ou citadas podem não estar mais nas situações, cargos e instituições que ocupavam na época, assim como suas opiniões e os fatos narrados referem-se às circunstâncias e ao contexto de então.

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