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sexta-feira, 26 abril, 2024

Entrevista com Marcos Guerra

Entrevista com Marcos GuerraO jeito tranquilo, a fala pausada, não indicam de imediato o que o sobrenome revela aos mais atentos. Sob a aparência cordial e pacífica, Marcos Guerra é um industrial acostumado a vencer desafios e um dirigente sindical combativo. Prestes a completar seu primeiro ano à frente da Presidência da Federação das Indústrias do Estado do Espírito Santo (Findes), o executivo vem promovendo mudanças na estrutura e, principalmente, no foco e nas estratégias da entidade máxima da indústria estadual, com os pés no presente, mas de olho no futuro. A meta é alcançar a sustentabilidade, em seu sentido mais amplo, garantindo a ampliação das conquistas do setor, sem perder de vista as necessidades globais da economia e da sociedade capixabas. Em entrevista exclusiva à equipe da revista ES Brasil, Guerra faz um rápido balanço desse primeiro ano de gestão e expõe o que pensa sobre a situação do Estado hoje, bem como as propostas da Findes para o Espírito Santo e para o Brasil. Um resumo dessa conversa você lê nas páginas a seguir.

Qual o balanço que o senhor faz da atuação da Findes nesse seu primeiro ano na Presidência da entidade?
Dentro da nossa gestão, criamos oito Diretorias para Assuntos Específicos, com o objetivo de mapear mais de perto as necessidades das principais áreas temáticas – tributos, meio ambiente, fortalecimento sindical, micro e pequenas indústrias, capacitação e desenvolvimento humano, inovação industrial, desenvolvimento da indústria, marketing e comunicação – e assim dar um novo rumo ao perfil da indústria capixaba. Precisamos trabalhar em direção à mudança desse perfil.

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Outro ponto que considero importante é o fortalecimento do associativismo, aspecto em que nos tornamos referência dentro da CNI (Confederação Nacional da Indústria) com a realização do Dia DE Associar-se, evento realizado em cidades que são polos regionais (Colatina, Cachoeiro de Itapemirim, Aracruz, Linhares, São Mateus e Anchieta) com o intuito de realmente trazer o industrial para dentro da Findes, com suas variadas demandas. Isso é muito importante, porque, por um lado, passamos a expor mais o Sistema, seus produtos e serviços, mas também trazemos novas ideias e cobranças, o que é fundamental para fazer o trabalho evoluir e dar uma “oxigenada” na gestão.

O Sistema Findes abriga, de um lado, grandes empresas, e de outro, trabalha em prol das micro, pequenas e médias; como pretende desenvolver o diálogo e promover o intercâmbio de experiências entre elas?
Considero muito importante trabalhar para que as empresas capixabas, principalmente da indústria de transformação, que está em decréscimo, tenham participação ainda maior nos projetos dessas grandes empresas, desde o consumo de produtos à compra de serviços. Nisso estamos tendo um avanço muito grande. Na 8ª Usina da Vale, mais de 60% dos fornecedores foram capixabas. Na Samarco (a 4ª Usina), provavelmente esse percentual passe de 60%.

Quanto às MPEs, nós tivemos um grande avanço recente com a conquista do novo teto para o Supersimples. Sabemos que o micro e pequeno empresário não tem tempo para nada, ele é um “faz-tudo” dentro da sua empresa. Em razão disso, às vezes criamos projetos para eles e eles nem consegue aproveitar, participar. Por isso, pretendemos estar presentes com as oito Diretorias que temos hoje em todo o Estado, levando essas ações para as Regionais – sejam elas por meio dos serviços prestados pelo Sistema Indústria para o micro e pequeno empresário, ou por meio do atendimento às suas demandas específicas, que a partir daí eles poderão trazer para dentro do Sistema. Ajudando-os a ser mais competitivos, a investir em inovação etc.

Falando da economia estadual, o senhor avalia que houve alguma mudança importante para a indústria nesses 12 meses? Em que sentido?
Como 50% da economia estadual são voltados para a economia internacional e as grandes empresas puxam os índices da indústria para cima, no ano passado a indústria cresceu 6,8%, enquanto que a indústria de transformação decresceu -5,2%. E o petróleo, a indústria extrativa, representou 29,6% do crescimento da indústria. Então, a gente percebe que há um descompasso aí. No cenário econômico do Estado, se não fizermos algo mais para a indústria, vamos enfrentar problemas de curto e médio prazo, em nível estadual e nacional, e muitas dessas empresas podem vir a fechar as suas portas.

Todos os nossos contratos de competitividade com o governo estadual estão sendo reavaliados e no novo perfil de contrato que estamos fazendo temos privilegiado quem está agregando maior valor ao produto.Estamos transformando a redução tributária em um mecanismo de incentivo à agregação de valor, em investimento em inovação. Para isso, estamos propondo ao governo que para todos os projetos seja criado um fundo, em que o empresário, em vez de pagar o imposto, jogue esse valor no fundo, e depois possa buscar esse recurso de volta para investir na sua empresa, desde que apresente projetos.

Isso porque nós entendemos que não vamos tornar a indústria mais competitiva apenas baixando o ICMS em 1% ou 2%. Mas, a partir do momento em que se cria esse fundo, a exemplo do que fizemos com a indústria do vestuário, esse industrial tira esse recurso de volta – nunca mais do que ele colocou – e pode utilizá-lo para investir em inovação, em projetos de branding, para reavaliação do mercado, de produtos, do novo perfil do consumidor, para pesquisas, eventos e até mesmo para uma campanha publicitária em nível estadual e nacional. Porque se ele fizer isso, automaticamente vai vender mais e ser induzido a investir mais. Cremos que isso será realmente um avanço no perfil econômico estadual e vai contribuir para diversificar nossa economia e reverter nossa dependência de poucos setores.

A Findes tem alertado para o processo de desindustrialização sofrido por determinados setores, entre os quais alguns que são fundamentais para o equilíbrio econômico do Estado. Nesse contexto, o Plano Brasil 2 é a solução?
Eu acho que o Governo tem tratado o assunto em doses homeopáticas. O Plano Brasil Maior 2 ainda está muito tímido, e poderia ter avançado mais, por conta das necessidades que o setor industrial possui neste momento. A demanda é muito grande e o “cobertor” que eles deram está muito pequeno.

Estamos falando de um país de quase 200 milhões de habitantes, com um consumo ativo que é quase sete vezes o crescimento da indústria nacional. Então, o governo está arrecadando mais do que o crescimento do PIB e com isso desestimulando o crescimento da indústria de transformação. Não adianta reduzir taxas de juros se ele não ajuda a indústria a estar presente no mercado nacional. Há alguns setores da economia brasileira para os quais precisamos criar cláusulas de barreira. O Governo precisa prestar mais atenção a esses setores, que podem ser estratégicos para o país.

O Estado de Goiás, por exemplo, entendeu que a indústria do vestuário lá era estratégica, não por conta dos impostos arrecadados, mas pelos empregos que gera. “Aqui trabalha uma população com idade média de 40 anos, alguns até com 55, que outros segmentos de mercado não absorvem; é um setor que está presente em todo o Estado; é um setor que, com pouco recursos – até cinco mil reais – gera um emprego”;e, por tudo isso, entendeu que é um setor estratégico. Então, o Brasil também precisa prestar atenção a estes detalhes.

A Findes, junto com a CNI, tem levado constantemente propostas para o Governo federal, para que ele realmente esteja atento a esses vários setores que precisam de atenção especial, como a indústria metalmecânica, moveleira, principalmente as micro, pequenas e médias empresas.

Há muito a Findes reivindica soluções para os gargalos ao desenvolvimento estadual, principalmente na infraestrutura. A atual conjuntura econômica torna essas soluções ainda mais distantes? Como superar as dificuldades?
Infelizmente, o Brasil tem usado muito pouco as PPPs (parcerias público-privadas). O Estado também, só agora esta começando a buscar esse mecanismo. Nós temos aí a duplicação de rodovias, o saneamento básico, o aeroporto de cargas, todos projetos que podem utilizar-se desse recurso. Você pode pensar: aeroporto de cargas? Mas o outro nem saiu ainda! Porém, o transporte aéreo de cargas cresceu mais do que nunca, até porque o comércio hoje não faz mais estoque. Prefere pagar um frete um pouquinho mais caro, mas trabalhar com o estoque da fábrica. Então, fazer um aeroporto de cargas aqui pode significar trazer para cá um novo negócio. Devido à posição geográfica privilegiada do Estado, atrair para cá alguns centros de distribuição e assim desenvolver uma nova cadeia de negócios.

Então, a meu ver, para superar os gargalos a gente precisa trabalhar mais com as PPPs, até porque o governo não tem fôlego para tocar tão rápido essas ações, que precisam ser feitas com muita agilidade. As ferrovias, o transporte marítimo de cabotagem, o porto de águas profundas, tudo isso são oportunidades para a celebração de PPPs.

Minha visão é otimista. Penso que a tendência é de evolução, e não de um cenário pior. O que eu acho que falta para viabilizar isso são projetos. Bons projetos. Temos que ter visão de futuro, aproveitar que o mundo rico “está em liquidação” e usufruir desse momento. E não falo do governo estadual, não. O governo federal é que tem que prestar mais atenção às necessidades de infraestrutura do país. Ele incentiva a venda de carros e motos e não se preocupa em prover a infraestrutura adequada.

Olhando para o futuro, qual o senhor considera que deve ser a direção tomada para que o Estado cresça em sintonia com as tendências adequadas ao próximo século?
Nós temos aqui no Estado, até em processo um pouco adiantado, a vinda de uma indústria de tablets, mas isso é muito pouco. Nós também temos em processo adiantado, não só em conversas, mas na compra do terreno, a montagem de um polo tecnológico em Colatina. Mas quando a gente fala na indústria do conhecimento, ainda falta ao empresário conhecer, de fato, os caminhos que ele precisa seguir nessa direção.

E quando você fala em novos projetos, novos produtos, inovação como fruto do conhecimento, ainda há um risco muito grande. Tem muitas iniciativas que não se viabilizam, e o grau de risco é um empecilho para que o empresário ouse mais. Por isso é que nós queremos criar um Instituto de Inovação, porque praticamente 75% a 80% de tudo o que você vai criar representa risco.

Nós temos grandes empresas aqui no Estado que têm recursos para isso e que muitas vezes investem nessa área, mas fora do Espírito Santo. O governo também precisa participar, porque nós temos como buscar recurso federal para esse fim. Isso não é fácil nem acontece da noite para o dia. Requer mudança de comportamento, de mentalidade, quebra de paradigmas e só virá com muito trabalho, trabalho duro. Em Santa Catarina, que visitamos recentemente, já existem empresas que saíram das incubadoras e faturam hoje mais de um milhão de reais, só trabalhando com inovação.

Nesses 12 meses, após diversas viagens para conhecer centros de ciência e tecnologia de outros estados, ciclo que vamos concluir agora com uma viagem à Bahia, hoje eu tenho a consciência clara de que a nossa indústria precisa investir em inovação. Nosso Estado não tem grandes investimentos ou projetos nessa área, nem um ambiente que incentive o micro, pequeno e médio empresário a investir em inovação. Então essa é uma das nossas principais missões aqui dentro da Federação: viabilizar uma parceria com governo estadual, empresas, universidades e Senai Nacional para efetivamente montarmos aqui no Espírito Santo um instituto de inteligência voltado para a inovação tecnológica.

Eu não quero ser o presidente que mais vai fazer obras, não. Eu acho que construir é importante, mas nós temos que tornar a entidade leve. Eu quero é realmente colocar a Federação das Indústrias com participação ativa nos 78 municípios do Estado do Espírito Santo.

O que falta para que o Espírito Santo crie uma ambiência mais favorável aos negócios e necessidades da indústria?
Precisamos de qualificação, temos que ser um Estado farto de mão de obra qualificada; precisamos melhorar a nossa infraestrutura. O Estado é bom com relação à segurança jurídica, é bem administrado, o que é um ponto bastante favorável. Agora, nós temos que tornar mais visíveis os pontos fortes do Espírito Santo.

Temos aqui no Sistema Indústria investimentos, para até 2015, da ordem de cerca de R$ 100 milhões, e mais de 65% desses investimentos vão ser em prol da qualificação profissional dos capixabas. Pretendemos construir novas escolas, como o Centro Integrado Sesi-Senai de Anchieta; renovar o Cetec de Vitória, que fica na Avenida Beira-Mar, e o Civit, na Serra; continuar ampliando a unidade de Linhares; e vamos construir uma nova escola do Senai em Cachoeiro do Itapemirim. Através desses investimentos, vamos estar preparando as nossas entidades para esse novo perfil da indústria capixaba.

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