Ocupando a chefia do maior bloco econômico mundial, Brasil terá desafio de equilibrar protagonismo em meio às ações de Trump
Por Robson Maia
Desde 1º de janeiro de 2025, o Brasil assumiu oficialmente a presidência do BRICS — bloco econômico e diplomático composto por países emergentes como Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, além dos recém-admitidos Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã. Com o lema “Fortalecendo a Cooperação do Sul Global para uma Governança mais Inclusiva e Sustentável”, o país passou a liderar uma agenda considerada ambiciosa de debates sobre temas como inteligência artificial, mudanças climáticas, saúde global e reforma das instituições multilaterais.
No entanto, a nova posição brasileira ocorre em meio a tensões diplomáticas mundiais com os Estados Unidos. O presidente norte-americano Donald Trump sinalizou a possibilidade de impor tarifas de até 100% sobre produtos de países do BRICS — uma resposta à recorrente discussão dentro do bloco sobre a criação de uma moeda alternativa ao dólar para facilitar o comércio entre os membros.

A ameaça de Trump representa um desafio direto à política externa brasileira, que, embora mantenha relações estratégicas com Washington, também reforça suas alianças no Sul Global. A retórica norte-americana levanta dúvidas sobre possíveis impactos comerciais e políticos para o Brasil, sobretudo em um momento de protagonismo internacional.
Diplomacia e pragmatismo: a leitura de um analista
Apesar da pressão vinda dos EUA, o analista político Thomas Tommasi avalia que a presidência do Brasil no BRICS não deve prejudicar significativamente a relação bilateral com os norte-americanos. “Donald Trump tem adotado uma política de negociações bilaterais, evitando blocos e fóruns multilaterais. No entanto, o Brasil não está entre os países mais afetados pelas tarifas propostas. Isso mostra que os Estados Unidos ainda enxergam o Brasil como um parceiro estratégico”, afirma.
Tommasi lembra ainda que o comando brasileiro do BRICS é rotativo e deveria ter acontecido em 2024, mas foi adiado devido à liderança do país no G20. “Assumir a presidência do maior bloco econômico emergente do mundo é extremamente relevante do ponto de vista político e econômico. Isso reforça o papel do Brasil como articulador internacional em temas como sustentabilidade, saúde e reforma da governança global”.


Mais de 100 reuniões e uma cúpula histórica
Ao longo do ano, o Brasil será responsável por coordenar mais de 100 reuniões preparatórias entre os países-membros, além de sediar a Cúpula dos Chefes de Estado e Governo do BRICS, prevista para julho no Rio de Janeiro. Entre os temas centrais da presidência brasileira estão o financiamento climático, a governança da inteligência artificial, a promoção da saúde global e a reforma das instituições multilaterais de paz e segurança.

Segundo Tommasi, a presidência brasileira se dá em um momento estratégico. “A China e a Índia seguem como motores de crescimento global e, ao mesmo tempo, são peças-chave na cadeia de suprimentos. O BRICS está se consolidando como um bloco que pode ditar as novas regras do comércio internacional. Ter o Brasil na presidência é abrir espaço para o diálogo diplomático em um contexto de transformações geopolíticas.”
Equilíbrio entre potências
A crescente busca do BRICS por alternativas ao sistema financeiro dominado pelo dólar — como o uso de moedas locais no comércio e o fortalecimento do Novo Banco de Desenvolvimento — também marca um distanciamento dos modelos impostos pelo Ocidente. Ainda assim, o Brasil tenta manter uma posição de equilíbrio, investindo em sua liderança regional e ampliando sua influência global sem fechar portas aos Estados Unidos.
“O Brasil tem hoje uma posição relevante tanto no BRICS quanto no Novo Banco de Desenvolvimento, e isso o coloca em uma posição estratégica de interlocução entre diferentes modelos de desenvolvimento. A presidência brasileira será um verdadeiro teste de habilidade diplomática em um cenário internacional de tensões crescentes e reconfiguração das alianças globais”, conclui Tommasi.