{"id":26739,"date":"2017-03-14T16:25:13","date_gmt":"2017-03-14T19:25:13","guid":{"rendered":"https:\/\/esbrasil.com.br\/?p=26739"},"modified":"2017-03-15T12:16:54","modified_gmt":"2017-03-15T15:16:54","slug":"refens-do-caos","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/esbrasil.com.br\/refens-do-caos\/","title":{"rendered":"Ref\u00e9ns do Caos"},"content":{"rendered":"
*Por Luciene Ara\u00fajo<\/em><\/p>\n
Pol\u00edcia Militar deixa as ruas, bandidos tomam as cidades de assalto, e a popula\u00e7\u00e3o fica sitiada em meio \u00e0 guerra do tr\u00e1fico e ao vandalismo.<\/p>\n
O cen\u00e1rio presenciado no Esp\u00edrito Santo entre os dias 4 e 15 de fevereiro dificilmente teria sido imaginado por algum capixaba ou turista. O Estado, que vinha sendo destaque na m\u00eddia nacional por seu equil\u00edbrio fiscal e pelas pol\u00edticas bem-sucedidas que o tiraram da lista dos mais violentos do Brasil, passou a ganhar as p\u00e1ginas dos principais jornais e revistas ao redor do mundo em consequ\u00eancia do colapso na seguran\u00e7a p\u00fablica.<\/p>\n
Naquele fat\u00eddico s\u00e1bado de ver\u00e3o, segundo dia em que os PMs foram teoricamente impedidos por seus familiares de sa\u00edrem dos quart\u00e9is para o policiamento ostensivo, uma assustadora onda de viol\u00eancia come\u00e7ou a atingir o Estado. Aulas foram suspensas, postos de sa\u00fade e com\u00e9rcio fecharam, assim como boa parte da ind\u00fastria. Sem ter a quem apelar, a popula\u00e7\u00e3o foi obrigada a se trancar em casa e assistir at\u00f4nita ao caos instalado.<\/p>\n
Assaltos, saques, roubos de ve\u00edculos e centenas de assassinatos passaram a ser registrados pelos moradores das janelas de suas casas e apartamentos. A guerra do tr\u00e1fico desceu os morros e tomou as ruas da Grande Vit\u00f3ria. As redes sociais foram invadidas por uma infinidade de imagens, v\u00eddeos e \u00e1udios. Fatos, boatos e distor\u00e7\u00f5es da realidade travaram uma disputa sem igual. A guerra de informa\u00e7\u00e3o foi t\u00e3o cruel quando a das ruas. \n \nOs capixabas criaram duas hashtags para denunciar a crise local: #ESpedesocorro e #PrayForEs, que se tornaram assuntos entre os mais comentados no Twitter, durante toda a semana.<\/p>\n
Paulo Hartung, chefe do Executivo, estava de licen\u00e7a m\u00e9dica, e coube ao governador em exerc\u00edcio, C\u00e9sar Colnago, e ao secret\u00e1rio de Seguran\u00e7a P\u00fablica, Andr\u00e9 Garcia, solicitar ao presidente da Rep\u00fablica, Michel Temer, o envio das For\u00e7as Armadas e da Guarda Nacional. \nDe volta ao Estado, durante coletiva na ter\u00e7a-feira (7), Hartung afirmou que o movimento era um \u201ccaminho errado que rasga a Constitui\u00e7\u00e3o, uma chantagem, uma atitude grotesca\u201d, e que n\u00e3o haveria negocia\u00e7\u00e3o enquanto os policiais n\u00e3o retornassem \u00e0s ruas. \u201cSequestraram o direito do povo e est\u00e3o cobrando resgate, mas n\u00e3o se paga resgate por aspecto \u00e9tico nem pelo descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal. Se n\u00e3o enfrentarmos isso, \u00e9 hoje aqui e amanh\u00e3 no resto do Brasil\u201d, declarou.<\/p>\n
Tanto Colnago quanto Hartung e Garcia afirmaram que o movimento de familiares era politizado. \u201cO processo foi sabotado. N\u00e3o podemos colocar a sociedade de v\u00edtima desse jogo pol\u00edtico. Tem gente apostando do quanto pior, melhor\u201d, garantiu Colnago. E o secret\u00e1rio de Seguran\u00e7a responsabilizou os policiais em greve pelas mortes nas ruas. \u201cColoco essas ocorr\u00eancias e mortes na conta do movimento.\u201d<\/p>\n
Na tarde e na noite daquela mesma ter\u00e7a-feira, grupos de mulheres que participam da mobiliza\u00e7\u00e3o se reuniram com a senadora Rose de Freitas (PMDB), com 20 deputados estaduais, com o presidente da OAB-ES, Homero Mafra, e com v\u00e1rios l\u00edderes das associa\u00e7\u00f5es. O objetivo declarado era ajudar o movimento a estabelecer um di\u00e1logo com o governo do Estado.<\/p>\n
E o primeiro grupo de soldados do Ex\u00e9rcito saiu \u00e0s ruas, mas em um contingente que n\u00e3o foi capaz de acabar com a viol\u00eancia.<\/p>\n
A cada dia, novos agrupamentos do Ex\u00e9rcito, da Aeron\u00e1utica e depois da Guarda Nacional passaram a realizar o policiamento ostensivo na Grande Vit\u00f3ria, e em seguida, no interior. \nPara o governo, os policiais n\u00e3o voltaram \u00e0s ruas na pr\u00f3pria segunda-feira (7) em consequ\u00eancia de uma \u201csabotagem\u201d de \u201clideran\u00e7as pol\u00edticas\u201d em \u201creuni\u00e3o escondida\u201d \u201cDiversos grupos pol\u00edticos acabam interferindo nas negocia\u00e7\u00f5es, tomando iniciativas, e isso afetou decisivamente as negocia\u00e7\u00f5es\u201d, destacou o comandante-geral da PM, coronel Nylton Rodrigues. \u201cFoi uma reuni\u00e3o leg\u00edtima com parlamentares que procuram sensibilizar o movimento e o governo\u201d, afirmou Rose.<\/p>\n
Diante de uma Mesa Diretora alinhada ao Executivo, com o v\u00edce-l\u00edder do governo no \u00faltimo ano, deputado \u00c9rick Musso (PMDB), eleito presidente da Assembleia, e o governador com ampla base no Legislativo, o cabo de guerra entre os Poderes causou muita estranheza. \n\u201cA hist\u00f3ria mostra que em situa\u00e7\u00f5es de guerra, revolu\u00e7\u00e3o, crise social e manifesta\u00e7\u00e3o, as primeiras perdas n\u00e3o s\u00e3o representadas pelas v\u00edtimas mortas ou feridas, tampouco pelos custos das perdas patrimoniais. Em geral, a verdade \u00e9 a primeira v\u00edtima, sacrificada por todos. Sendo assim, \u00e9 prudente considerar a possibilidade de interesses n\u00e3o republicanos intencionalmente criados e\/ou estimulados, ainda que de forma subliminar, para atingir interesses muitas vezes ocultos ou at\u00e9 preparat\u00f3rios para algo de maior envergadura\u201d, destaca o especialista em seguran\u00e7a p\u00fablica coronel Di\u00f3genes Lucca*.<\/p>\n
Em meio a uma popula\u00e7\u00e3o amedrontada, a Uni\u00e3o demorou uma semana para fixar no Estado o n\u00famero necess\u00e1rio de profissionais das tropas nacionais para finalmente recolocar um pouco de normalidade \u00e0 rotina da popula\u00e7\u00e3o para que as aulas retornassem e o com\u00e9rcio reabrisse.<\/p>\n
A atua\u00e7\u00e3o das Guardas Municipais, principalmente de Vila Velha e Vit\u00f3ria, foi muito elogiada. \u201cN\u00e3o gosto nem de imaginar no que teria se transformado Vila Velha sem a\u00a0 Guarda, porque com todas as pris\u00f5es que executou e as muitas vezes que impediram roubos de estabelecimentos comerciais e de ve\u00edculos, ainda assim, foram dias assustadores. Somos muito gratos\u201d, enfatiza a pedagoga e professora de tae kwon Maria Cristina Justo Nascimento, moradora do bairro Santa M\u00f4nica.<\/p>\n
\u201cFoi um trabalho exemplar da Guarda Municipal aqui em Vit\u00f3ria. Se com ela esses dias foram de terror, imagine sem. Foi um trabalho louv\u00e1vel e que precisa ser muito reconhecido por todos n\u00f3s\u201d, destaca a aposentada Maria L\u00facia de Almeida, que reside em Bento Ferreira, na capital capixaba.<\/p>\n
Somente no dia 25 de fevereiro, ap\u00f3s uma reuni\u00e3o com quase nove horas de dura\u00e7\u00e3o entre representantes do governo, do movimento, da Defensoria P\u00fablica da Uni\u00e3o, do Tribunal Regional do Trabalho (TRT-ES) e da Central \u00danica dos Trabalhadores (CUT), foi anunciado o acordo, e as portas dos quart\u00e9is foram desocupadas.<\/p>\n
Durante os 21 dias, pelo menos 199 pessoas morreram, segundo o Sindipol-ES. As estat\u00edsticas da Secretaria Estadual de Seguran\u00e7a P\u00fablica apontam 143 homic\u00eddios, entre 4 e 13 de fevereiro. Mas especialistas afirmam que esse n\u00famero deve ultrapassar 300 pessoas.<\/p>\n
Preju\u00edzos<\/strong> \nNa ind\u00fastria, ainda que uma minoria de grandes empresas tenha mantido o funcionamento durante o caos na seguran\u00e7a, muitas f\u00e1bricas permaneceram fechadas, como as do polos de confec\u00e7\u00e3o de Colatina, no noroeste do Estado, e\u00a0 de Santa In\u00eas, em Vila Velha; assim como o Estaleiro Jurong, em Aracruz.<\/p>\n