Irrigação localizada, recuperação de matas e até a criação de um curso superior de especialização estão entre as medidas implementadas no ES
Por Daniel Hirschmann
O Espírito Santo vem registrando avanços na gestão sustentável dos recursos hídricos utilizados pela agricultura, mas ainda são necessários esforços para enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas e pela demanda crescente por água, principalmente em regiões marcadas por baixos volumes de chuva. Com tecnologias avançadas, disseminação do conhecimento técnico e adaptação às novas condições climáticas, o estado busca garantir a sustentabilidade da agricultura em seu território, preservando esse insumo essencial para a atividade.
“A água é o principal insumo da agricultura. Ela é o veículo de nutrição das plantas, que só pegam os nutrientes para gerar os benefícios que nós precisamos, como alimentação, fibra e madeira”, explica o secretário de Agricultura, Abastecimento, Aquicultura e Pesca do Espírito Santo, Ênio Bergoli.
Estudos apontam que a agricultura consome cerca de 70% da água disponível, mas Bergoli ressalta que essa estatística não reflete a realidade. “No uso doméstico, a água tratada é usada, poluída e descartada. Na agricultura, com um sistema de produção bem montado, o excesso de água no solo desce, reabastece o lençol freático e evapora, mantendo o ciclo hidrológico”, justifica. “A agricultura utiliza muita água, sim, mas estamos cada vez mais usando métodos de irrigação que consomem menos água e energia.”
Irrigação sustentável é crescente
Esse uso racional da água na agricultura do Espírito Santo tem se intensificado com a adoção de métodos de irrigação mais eficientes e sustentáveis. Segundo o professor Giovanni de Oliveira Garcia, do Departamento de Engenharia Rural do Centro de Ciências Agrárias e Engenharias da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), a maior parte do consumo hídrico no estado é destinada à irrigação, particularmente nas áreas de cultivo intensivo, como a região norte, onde predominam as culturas de café conilon e a fruticultura. Garcia também discorda das estimativas de que a agricultura consome 70% da água disponível, ressaltando que a irrigação é suplementar, pois apenas repõe a água que a chuva não consegue fornecer.
A sustentabilidade, nesse contexto, é alcançada com tecnologias que substituem o tradicional sistema de aspersão pela irrigação localizada, como o gotejamento e a microaspersão. Essas técnicas permitem a aplicação mais precisa da água diretamente no sistema radicular das plantas, ou numa área menor do que no sistema de aspersão, reduzindo desperdícios e aumentando a eficiência.
Garcia destaca que o método localizado, embora tenha um custo inicial maior, oferece economia no longo prazo, possibilitando também a fertirrigação, que combina a irrigação com a aplicação de fertilizantes. “Em um contexto de cultivo de culturas de cunho comercial, como café e fruticultura, nós temos já um avanço muito significativo da substituição de sistemas que simulam a chuva, que é a aspersão, para o sistema de irrigação localizada, que são a micro aspersão e a irrigação localizada por gotejamento”, explica professor, que é agrônomo e doutor em Engenharia Agrícola.
Em números, a mudança é significativa. Segundo o secretário Ênio Bergoli, no censo de 2006/2007, 73% dos equipamentos de irrigação usados por produtores capixabas eram de aspersão convencional, mas no levantamento de 2017, publicado em 2019, 92% deles já eram de microaspersão e gotejamento.
Reservatórios contra escassez
Apesar dos avanços, ainda há desafios a superar. A captação excessiva de água, por exemplo, pode levar à escassez em algumas regiões, especialmente no norte do estado.
“Já houve situações, em determinada época do ano, em que a irrigação foi suspensa por decisão judicial. Então, um dos impactos é na captação de água. Pode vir a faltar água para atender a população em algumas localidades”, lembra o professor Giovanni Garcia.
Ele acrescenta, porém, que esse problema vem sendo minimizado e até solucionado, em algumas regiões, com a construção de reservatórios.
Ênio Bergoli também cita os investimentos feitos por produtores rurais, nos últimos 30 anos, para garantir armazenagem de água. “Tanto é que agora, num período seco durante o ano passado, os próprios produtores rurais disseram que podiam fornecer água para os demais setores. Eles fizeram o dever de casa”, ressalta o secretário.
Além disso, o governo do Estado, por meio da Secretaria de Agricultura, tem o Programa Estadual de Construção de Barragens, principalmente médias e grandes, buscando regular a vazão e o armazenamento de água para uso múltiplo, tanto para a agricultura quanto para a segurança hídrica de pequenas e médias cidades. “Essa é uma política que temos implementado ao longo do tempo. Obviamente, há períodos mais secos em que precisamos deixar ligar os equipamentos de irrigação só à noite, mas tem atravessado bem essas situações”, observa Bergoli.
*Matéria publicada originalmente na revista ES Brasil 222, de julho de 2024. Leia a edição completa do Anuário Verde sobre águas aqui.