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segunda-feira, 16 DE setembro DE 2024

O Plano Real e sua estratégia de combate a hiperinflação

Durante o período de transição, preços, contratos e salários foram convertidos da moeda corrente, o Cruzeiro Real, para a URV

Por Ricardo Paixão

A comemoração dos 30 anos do Plano Real é muito mais do que lembrar de uma política bem-sucedida do governo federal. É considerar o plano como um marco fundamental na história econômica do Brasil. Antes de 1994, a inflação descontrolada que assolava o país desde os anos 1980 e início dos anos 1990, corroía o poder de compra dos brasileiros, desorganizava empresas e desestabilizava a economia.

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Trazendo uma série de inovações na sua concepção, o Plano Real introduziu a Unidade Real de Valor (URV) como uma moeda de transição, desindexando a economia e pavimentando o caminho para a introdução do Real (R$) como moeda corrente. A URV não era uma moeda física, mas uma unidade de conta que ajudou a desindexar a economia e estabilizar os preços sem recorrer ao congelamento.

Durante o período de transição, preços, contratos e salários foram convertidos da moeda corrente, o Cruzeiro Real, para a URV. Isso permitiu uma adaptação mais suave e gradual da economia à nova moeda, o Real, que seria introduzida posteriormente. Em julho de 1994, a URV foi convertida em Real (R$), a nova moeda brasileira.

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Diferente dos planos anteriores, o Plano Real não congelou preços, mas distribuiu uma política de preços livres, permitindo ajustes conforme a oferta e demanda de mercado, porém sob um ambiente de expectativa de estabilidade. Para garantir a sustentabilidade do Plano Real e consolidar a estabilidade econômica, o Brasil atualizou o tripé macroeconômico, composto pelas políticas: cambial, fiscal e monetária.

Inicialmente, o plano utilizou um regime de câmbio fixo para ancorar expectativas inflacionárias. No entanto, com o tempo, foi implementado o regime de câmbio flutuante, onde o valor do Real passou a ser determinado pelo mercado. Essa flexibilidade permitiu uma melhor adaptação às condições econômicas globais e internacionais, evitando crises cambiais recorrentes.

A disciplina fiscal foi um elemento extremamente importante para o sucesso do Plano Real. O governo implementou medidas rigorosas de controle dos gastos públicos e procurou alcançar superávits primários que consiste na diferença entre receitas e despesas, excluindo o pagamento de juros da dívida. Essa política visava reduzir a dívida pública e restaurar a confiança na economia brasileira.

Para controlar a inflação, o Banco Central introduziu um regime de metas de inflação, onde eram determinadas metas claras para a taxa de inflação anual, medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo). A autoridade competente utilizou a taxa de juros SELIC como principal instrumento para conter o aumento da demanda agregada e manter a inflação dentro das metas estabelecidas.

Sem dúvida, o Plano Real marcou um ponto de inflexão na história econômica do Brasil, não apenas pelo controle da hiperinflação que caiu de níveis superiores a 2.400% ao ano para patamares de um dígito em poucos anos, mas também pela introdução de um conjunto de políticas econômicas estruturadas que consolidaram a estabilidade e proporcionaram um ambiente mais propício para o país crescer.

Além disso, a estabilização da moeda e a melhoria do tripé macroeconômico trouxeram maior previsibilidade e confiança para a economia brasileira, incentivando investimentos e a melhoria do ambiente de negócios.

No entanto, é importante destacar que o Plano Real não eliminou todos os problemas existentes na economia brasileira. Os desafios econômicos do Brasil vão além do controle inflacionário. Problemas estruturais, como a desigualdade social, a baixa produtividade, a infraestrutura deficiente e a complexidade do sistema tributário, ainda precisam ser resolvidos de forma integrada e contínua.

Esses fatores limitam o potencial de crescimento do país e bloqueiam reformas abrangentes para promover um crescimento econômico mais sustentável e inclusivo.
Um ponto de crítica que surgiu durante execução do plano foi a questão da paridade do Real com o dólar. Inicialmente, o Real foi introduzido com um valor artificialmente alto em relação ao dólar, o que ajudou a ancorar as expectativas inflacionárias e estabilizar os preços.

No entanto, essa valorização artificial criou uma necessidade constante de atrair grandes volumes de dólares para formar reservas cambiais adequadas, algo que o Brasil não possuía naquele momento.

Essa política de câmbio valorizado, embora seja útil no curto prazo para estabilizar a inflação, gerou desequilíbrios econômicos a longo prazo. A sobrevalorização do Real prejudicou a competitividade das exportações brasileiras e levou a um aumento das importações, contribuindo para déficits na balança comercial.

Além disso, a manutenção de uma taxa de câmbio artificialmente valorizada envolve altas intervenções ocasionais do Banco Central no mercado de câmbio, consumindo reservas internacionais e gerando pressões sobre a política monetária.

Portanto, embora o Plano Real tenha sido exitoso em sua estratégia de combate à inflação, os desafios econômicos do Brasil são complexos e persistem. É essencial que o governo continue a implementar políticas econômicas estruturantes e reformas abrangentes para enfrentar esses desafios, promover o crescimento sustentável e melhorar a qualidade de vida da população.

A estabilidade econômica alcançada pelo Plano Real deve ser vista como um ponto de partida para um desenvolvimento mais equilibrado e inclusivo, não como uma solução final para todos os problemas econômicos do país.

Ricardo Paixão é economista, mestre em Economia e doutorando em Educação – UFES, professor efetivo da FACELI e conselheiro do Conselho Regional de Economia do Espírito Santo (Corecon-ES).

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