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quinta-feira, 18 abril, 2024

Especial: Os avanços e os desafios da saúde no Espírito Santo

Especial: Os avanços e os desafios da saúde no Espírito Santo

A ES Brasil ouviu especialistas e autoridades, que fizeram uma avaliação da realidade capixaba e apontaram soluções

 

Por Vitor Taveira e Marcele Falqueto

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A vinda de médicos estrangeiros para o Brasil iniciou uma série de debates sobre a situação da saúde em nosso País. As discussões chegaram ao Espírito Santo, onde vez ou outra aparecem na mídia cenas lamentáveis de corredores de hospitais lotados, gente sem leito, longas esperas para atendimentos, população descontente e mal atendida. Este papel de denúncia é fundamental. Mas, olhando o contexto de forma mais ampla, qual é a real situação da saúde no Estado?

Analisando os indicadores nacionais, especialistas capixabas consultados são unânimes: estamos na média. No Brasil, o número de profissionais de saúde por habitante é de 1,86, enquanto que no Espírito Santo é de 1,93. No número de consultas médicas, a realidade também é bem próxima: 2,71 por habitante no Brasil e 2,90 no Espírito Santo. Como em muitas outras estatísticas, o Espírito Santo está mais bem posicionado que a maioria dos estados das regiões Norte e Nordeste, mas ainda bem atrás dos estados do Sul e especialmente dos outros estados que, com ele, compõem a Região Sudeste.

“De um modo geral, os indicadores de saúde estão melhorando em todo o País. A mortalidade infantil e o índice de internações hospitalares estão diminuindo, o que é positivo”, considera José Geraldo Mill, professor e pesquisador da área médica na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).

Com tantos investimentos anunciados e realizados nos últimos anos, a saúde capixaba acompanhou esse desenvolvimento? O orçamento público do setor cresceu, até por conta da vinculação da receita, mas o Estado vai ainda além: em vez dos 12% exigidos pela legislação nacional, o Espírito Santo dedica 15% de seu orçamento para a saúde, conforme indica o secretário estadual Tadeu Marino. O orçamento do setor para 2013 é de R$ 1,56 bilhão. Entre os maiores investimentos realizados estão a construção do hospital Jaime dos Santos Neves, com investimentos de R$ 165 milhões entre obras e equipamentos, e a reforma do Hospital São Lucas.

No caso da saúde privada, Remegildo Gava Milanez, o diretor-presidente do Hospital Metropolitano, esclarece que os grandes investimentos ocorreram pouco antes do início do boom da economia capixaba, quando foram criados cinco grandes hospitais entre o final dos anos 90 e início dos anos 2000. Essa realidade já não é adequada para o cenário de hoje. “A previsão é de um déficit de leitos nos próximos dois anos na Grande Vitória. A situação será revertida com a construção prevista de cerca de 500 leitos”, informou o médico.
O público e o privado

Apesar dos avanços e investimentos, Mill observa que a ascenção por parte da população e da imprensa é de que a saúde anda muito mal, por conta dos graves problemas existentes na atenção de urgência e emergência. O problema atinge tanto os hospitais públicos quanto os privados.

O setor privado hoje responde pelo atendimento de mais de 1,1 milhão de capixabas, de acordo com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Nos últimos anos, as mudanças da sociedade brasileira têm influenciado o setor, pois com a emergência da chamada classe C, mais famílias passaram a usufruir de planos de saúde privados, o que contribuiu para sobrecarregar os hospitais particulares, pois se trata de pessoas que muitas vezes tinham uma demanda reprimida na área de saúde, e por isso passaram a utilizar os serviços particulares com maior frequência. Manoel Gonçalves Carneiro Netto, superintendente do Sindicato dos Estabelecimentos dos Serviços de Saúde (Sindhes) aponta também a inclusão de oferecimento de assistência à saúde nas empresas como outro fator de crescimento dos planos de saúde privados.

A cidade de Vitória, por exemplo, possui a segunda maior cobertura de planos de saúde entre todas as capitais brasileiras (71,6% de cobertura, segundo dados do Datasus de dezembro de 2012), o que contribui para aliviar o peso da saúde para o setor público do município, mas não resolve o problema. “O caminho para o setor privado é investir no atendimento e em políticas a longo prazo”, disse o superintendente do Sindhes.

Tadeu Marino acredita numa relação de complementariedade entre o público e privado. “No Espírito Santo temos uma parceria harmoniosa e fundamental com o setor privado. Quando o Sistema único de Saúde (SUS) não dá conta, temos que fazer essa complementação, em casos de exames complexos ou na falta de leitos, que pode ser feita tendo regras claras”, diz o secretário.

“Além da importância do número de pacientes atendidos, o setor privado consegue prover saúde qualificada, e isso acaba influenciando o setor público, invertendo a lógica de antes, quando o público era mais pujante e seu aprendizado chegava ao privado. Hoje, a maior parte das melhorias em tecnologia e inovação saem da iniciativa privada”, acredita Remegildo.

Manoel Gonçalves Carneiro Netto resume a percepção de muitos especialistas: “A saúde privada, incluindo entidades sem fins lucrativos, faz com maestria operações de grande complexidade e o setor público tem grande eficiência no socorro de emergências médicas da população em geral”.

Profissionais

A valorização dos profissionais da área também é outro ponto de grande relevância para um bom funcionamento do setor. Marino sinaliza um esforço por parte do governo estadual, que aprovou nova folha de salários e abriu o maior concurso público da história da área da Saúde no Estado, com o objetivo de retirar as designações temporárias (DTs) e valorizar o desenvolvimento da carreira profissional. Porém, o secretário-geral do Conselho Regional de Medicina do Espírito Santo (CRM-ES), Severino Dantas acredita que os investimentos ainda não são suficientes. “É preciso planos de salário e carreira que possam realmente fixar o profissional. Especialmente para que ele possa ir ao interior e ter boas condições de trabalho, assim como boas condições para morar com sua família”, considera o representante CRM, destacando o déficit de profissionais de saúde no interior do Estado.

Por conta disso, a estratégia do governo é criar centros regionais e lançar editais ainda neste ano para a criação desses em sete cidades do interior, que serviriam como pontos de consultas e realização de exames especializados, tirando a necessidade de realização de longas viagens até a Região Metropolitana para o atendimento de pessoas residentes em outros locais do Estado.

Pesquisa e tecnologia

O avanço tecnológico e a inovação têm sido grandes aliados para a Medicina, facilitando tanto com equipamentos para realizar operações médicas como com softwares para melhorar a gestão hospitalar, hoje bastante informatizada e com maior fluxo de informações. Embora não esteja no topo da tecnologia nacional, os especialistas consultados acreditam que o Espírito Santo possui condições relativamente boas, incorporando esses avanços em seu sistema de saúde.

Na área de pesquisa, entretanto, o Estado tem participação ainda discreta e incipiente. O financiamento dessas pesquisas é principalmente público, como destaca José Geraldo Mill. Mesmo muitas universidades e hospitais particulares que realizam investigações médicas dependem dos recursos governamentais. Na pesquisa médica capixaba, alguns projetos vinculados aos núcleos de pós-graduação da Ufes se destacam. Mill é Diretor do Departamento de Pós-Graduação e Capacitação de Recursos Humanos da Universidade e coordena no Estado uma pesquisa do governo federal para identificar casos de doenças como diabetes, hipertensão e obesidade. Ele cita como exemplo um grupo da Ufes que estuda a criação de uma vacina contra a dengue, o que poderia ser de grande importância para o país, além de a Universidade ser referência em áreas como a tuberculose e o combate a doenças crônicas e cardiovasculares.

Remegildo Milanez lamenta que no setor privado não ocorra este tipo de ação. “As entidades privadas do Espírito Santo ainda não têm cultura de pesquisa, ao contrário do que acontece em grandes hospitais nacionais, como o Albert Einstein e o Sírio Libanês, em São Paulo, que realizam excelentes trabalhos que impulsionam a Medicina no Brasil. Precisamos estimular as pesquisas nas entidades particulares do Estado, o que poderia acontecer por meio de parcerias entre o setor público e o privado”.

Desafios para a saúde capixaba

São muitos os desafios que se vislumbram para os próximos anos na área da saúde no Espírito Santo e no Brasil. Alguns deles são inexoráveis, como a mudança na pirâmide etária, que deve provocar o envelhecimento progressivo da população, forçando os planos privados e o serviço público a se adequarem ao novo perfil do usuário. Além disso, cada vez mais se desenvolvem doenças crônicas e outras relacionadas com os hábitos e estilos de vida modernos, pouco saudáveis, mais difíceis de serem modificados a curto prazo.

Porém, não é apenas investindo nos hospitais e médicos que se pode melhorar o sistema de saúde. Carneiro Netto lembra que a violência urbana, o uso de drogas e os acidentes automobilísticos, especialmente com motos, geram custos e dificuldades para o atendimento, contribuindo para aumentar a necessidade dos atendimentos de emergências. São problemas, entretanto, que exigem investimentos intersetoriais e de longo prazo.

A saúde, na verdade, vai muito além de hospitais e medicamentos: ela envolve o dia a dia de cada indivíduo. “Sempre que falamos em saúde, pensamos em hospitais e terapia intensiva, que são muito caros. A prevenção é o modo mais eficiente e econômico de atendermos a todos”, diz Carneiro Netto, ressaltando algumas políticas que vêm sendo adotadas com sucesso no Brasil, como as campanhas de vacinação, o tratamento de doenças crônicas com oferta de medicamentos gratuitos aos pacientes e os investimentos em cultura e esporte.

A mesma opinião é compartilhada por Tadeu Marino. “Sabemos que uma atenção primária e básica bem organizada e bem feita resolve de 80 a 90% dos problemas. Para cuidar da saúde é preciso uma visão intersetorial, que envolva saneamento, pavimentação, habitação, educação e lazer, entre outras coisas”, afirmou.

No tema da prevenção, é notória a importância da atuação do sistema público de saúde, como é o caso de programas como o Saúde da Família, desenvolvido pelo governo federal com equipes multissetoriais que acompanham de perto determinadas famílias.

A iniciativa privada somente agora começa a investir mais nesse tipo de programa preventivo, com atuação mais próxima ao paciente, como é o caso do modelo do Unimed Personal, lançado este ano no Espírito Santo. Dessa maneira, é possível realizar um mapeamento de riscos de acordo com o perfil do paciente para atuar com medidas de prevenção e acompanhamento.

De um modo geral, os números no Brasil demonstram que a população vive mais e melhor, apesar do ritmo acelerado das grandes cidades. A expectativa de vida aumentou nos últimos anos, com o avanço da medicina e o acesso a diversas formas de prevenção. Os brasileiros já perceberam que o velho ditado “é melhor prevenir do que remediar” é realmente valioso e pode prolongar vidas.

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