Nessa entrevista com Alexandre Lobo confira também como o ES se insere nesse contexto
A negociação de acordos comerciais é essencial à recuperação da competitividade da indústria brasileira. Por isso, tem sido uma ferramenta estratégica do atual governo para melhorar as condições das indústrias brasileiras acessarem os mercados externos.
Os acordos definem regras, que por sua vez levam estabilidade ao ambiente de negócios e, dessa forma, aumentam o protagonismo do Brasil no cenário internacional.
Em visita ao Espírito Santo, para participar da reunião trimestral do Grupo de Acompanhamento Empresarial do Espírito Santo (GPAEES), o Subsecretário de Negociações Internacionais do Ministério da Economia, Alexandre Lobo, apresentou as frentes de ação do governo federal nesse sentido, como a recente conclusão do acordo de livre-comércio entre o Mercosul e o EFTA – bloco comercial integrado por Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein.
Em entrevista à ES Brasil, Lobo explicou também como o Espírito Santo pode ser beneficiado por meio desses acordos. Confira!
De acordo com a CNI, embora menores, as oportunidades de negócios com a EFTA são muito importantes. Há avanços nesse sentido?
Tivemos ofertas concedidas pelo bloco nunca antes concedidas a outros países exportadores agrícolas. O bloco será um relevante parceiro para o Brasil: possui um PIB de US$1,1 trilhão, um dos maiores PIB per capita do mundo, sendo o nono maior ator no comércio mundial de bens. Isso representa muitas oportunidades.
O Brasil presidiu o Mercosul em 2019. Quais os avanços conquistados?
Foram avanços muito importantes. Fechamos o acordo de facilitação de comércio do Mercosul (AFCM), avanços na discussão sobre inclusão de setores excluídos, como automotivo e açúcar, aprovação do marco geral sobre iniciativas facilitadoras de comércio (IFC); foi implementada a certificação de origem digital (COD) e iniciada a discussão sobre a revisão de regime de origem do bloco. Quanto à revisão da Tarifa Externa Comum, travamos discussões técnicas entre os membros do MERCOSUL no sentido de estabelecer uma estrutura tarifária mais eficiente e adequada ao objetivo de promover uma maior inserção dos países do MERCOSUL no comércio internacional, bem como de ampliar a capacidade do bloco de contribuir para o aumento da competitividade e a integração das economias de seus integrantes. Além disso foram fechados acordos de indicações geográficas do Mercosul, sobre comércio de zonas francas e também de reconhecimento de operadores econômicos autorizado pelo Mercosul, ferramenta para aumentar a integração regional e reduzir tempo e custos do comércio entre os países do Mercosul.
E quanto à indexação a reforma tarifária do Mercosul, o progresso será rápido?
Difícil dizer se vai ser rápido ou não, porque realmente temos uma conjuntura interna importante no Mercosul, temos o nosso dever de casa no Brasil, além de não se tratar de uma decisão eminentemente brasileira, é um tema que necessita ser consertado dentro do Mercosul. Algo que ainda vamos debater muito com o novo governo argentino. Acredito que não será uma negociação rápida. É uma construção com o setor privado.
Sobre os EUA, como o senhor avalia a postura de fechamento da economia?
Na minha opinião pessoal, não se vê os EUA buscando um fechamento da economia puramente. Está, na verdade, negociando com o objetivo de alcançar melhores condições de acesso para seus produtos em terceiros mercados, neste momento especialmente com a China. Trata-se de um método negociador diferente que traz desafios, impactos a curto prazo, mas que, eventualmente no futuro, poderá redundar em uma abertura mais acentuada desses mercados, ao menos bilateralmente.
O Brasil também fechou um acordo automotivo com a Argentina. Que outros mercados podem ampliar o espaço para a indústria brasileira?
As negociações com o México estão avançando bastante em relação à ampliação do acordo que hoje contempla cerca de mil produtos de lado a lado, o equivalente a apenas 10% da pauta brasileira. Temos ainda negociações com a Colômbia para estabelecer um acordo de livre comércio também no setor automotivo e destravar o congelamento do cronograma de desgravação de produtos agrícolas e industriais. Além disso, há negociações em andamento com Canadá, Líbano, Singapura e Coreia do Sul. A negociação com o Canadá é a a mais avançada das negociações, o objetivo do governo brasileiro é concluí-las ainda em 2020, a depender da dinâmica negociadora com o parceiro e dentro do Mercosul. Adicionalmente, há diálogos para se estruturar possíveis acordos comerciais com Estados Unidos, Japão, Índia, Indonésia, Vietnã e com o Sica – Sistema da Integração Centro-Americana.
Quais os desafios que acordos, por exemplo, com a Coreia do Sul, podem gerar ao Brasil?
Estamos falando de países que têm uma competitividade significativa. Ainda temos um trabalho de casa a fazer para nos tornarmos competitivos. É importante frisar que a própria importação de insumos, de componentes, de bens intermediários com redução tarifária nos tornará mais competitivos, Ao mesmo tempo, se os produtores não se adaptarem e nós não tivermos melhores condições de competividade, poderemos sofrer com essa concorrência. Esse é o elemento central que o ministro da economia tem colocado, de se fazer as coisas de forma gradual e coordenada com as demais reformas estruturais da economia brasileira, para que nós tenhamos tempo de aumentar a competitividade de nossos produtos. As reformas econômicas e a integração na economia mundial são processos que estão caminhando juntos. Não faremos um choque de abertura, não pegaremos nossos produtores de forma desprevenida.
E o acordo com o Japão já pode acontecer em 2020?
Os setores privados do Brasil e do Japão, em geral, apoiam a realização de um acordo comercial. Os japoneses recentemente assinaram acordo comercial com os Estados Unidos, o que estava consumindo muitos esforços da agenda de negociações externas do Japão. Assim que o Japão e o Mercosul estiverem prontos, será possível inicial um diálogo comercial com vistas ao início do processo negociador formal
Quanto ao acordo com a União Europeia (EU), o quanto as questões ambientais podem afetar as transações do Brasil?
Não vejo os países europeus colocarem obstáculos para que o acordo entre em vigor. Sabemos também, que muitos desses elementos que hoje estão na pauta, como as questões ambientais, que são extremamente importantes para a sociedade global e não podem ser desprezados, têm também a ver com arranjos políticos internos na Europa. Estou convencido, por exemplo, que a França terá ganhos econômicos importantes com esse acordo. Acredito que boa parte da sociedade francesa e europeia espera que esse acordo seja aprovado o mais rápido possível. Ademais, compromissos ambientais estão presentes nesse acordo, inclusive o de respeitar o Protocolo de Paris.
O que o Brasil oferece para França e Alemanha, para que receba o apoio da sociedade desses países?
Há desgravações tarifárias de produtos importantes que são produzidos e exportados da França e Alemanha para o Brasil, a exemplo de veículos, vinhos, queijos, máquinas e equipamentos, produtos químicos. Há muitos setores com interesse nesse acordo, então ele é muito positivo para a sociedade europeia como um todo.
Como fica o Reino Unido agora diante do Brexit?
Já houve sinalizações de se iniciar o diálogo direto. Mas não podemos iniciar negociação alguma antes de que isso se efetive. Então, obviamente tem de se esperar a conclusão do processo, para que se inicie um diálogo com o Reino Unido.
O Brasil teve o coeficiente de risco melhorado. Vamos atrair mais investidores?
A percepção de risco é justamente o que atrai ou espanta os investimentos. Os investidores sempre que veem um ambiente favorável, previsível, e transparente se interessam por determinado mercado. Então, redução do risco reflete uma melhora de os pilares econômicos que estão sendo reformados no Brasil. A nossa expectativa é que isso desperte o interesse de outros países que ainda não possuem relação com o Brasil.
Dentro de todo esse contexto, como o ES, enquanto grande exportador de commodities, pode se beneficiar desses acordos?
Vai muito na linha que comentei anteriormente e perpassa por diversos temas, como por exemplo a redução tarifária, que por si só é um benefício importante para tudo aquilo que o Estado produz e exporta. Com todos esses parceiros com os quais temos exportações e estamos celebrando acordos, a tarifa de importação tende a cair. Ou seja, você ganha uma preferência com relação a competidores que não têm acordo com esses blocos. Em termos de custos diretos, você já tem uma redução importante. Há também questões não tarifárias, de regulamentos, e transparência das regras. Tudo isso reduz custo e risco dos negócios e traz um ambiente muito mais previsível para que as negociações e as suas ações aumentem.
Uma negociação ampliada com relação às regras jurídicas poderia favorecer o agronegócio, tanto para exportar quanto para a importação de insumos?
Sim, nas duas vias! Aí está o segredo da inserção brasileira, que não é simplesmente buscar o aumento da exportação ou e diminuição de importação. Como havia mencionado na palestra, não existe nenhum país que exporte muito e importe pouco. São duas coisas que estão totalmente ligadas e isso se reflete nas nossas empresas. A maioria das empresas exportadoras brasileiras são grandes importadoras, principalmente de insumos e bens intermediários. Na medida em que se abre o mercado para insumos mais baratos e mais competitivos, com maiores componentes tecnológicos, você certamente torna o produto mais competitivo e pode aumentar a exportação. O que o governo busca não é aumento de exportação, mas o aumento da corrente de comércio, da importação e exportação, o que é positivo. Os Estados Unidos são um exemplo: desde a década de 1970 que não tem superávit comercial, mas são a maior economia do mundo.
Com relação ao posicionamento do Brasil no mercado internacional. Podemos dizer que o principal desafio é a segurança jurídica?
Não diria a principal, mas é um deles. Temos um cardápio de fatores que atraem os investimentos. Segurança jurídica é fundamental, porque sem ela você aumenta os custos, a imprevisibilidade e a indisposição de se aproximar do Brasil. A segurança jurídica é um elemento crucial nessa história. São os acordos que trazem, justamente, esse elemento de regras claras na relação comercial, e isso é o que não temos em relação a muitos países
E quanto ao fato do câmbio continuar depreciado?
O câmbio depreciado favorece a exportação, mas como eu disse, esse não é o nosso objetivo. Nesse momento, temos um ambiente favorável a exportar em relação ao que se refere a câmbio. Com relação ao risco Brasil, mostra para o mundo que o País está ficando mais sério e mais favorável à realização de negócios e investimentos. Tudo isso contribui para um cenário melhor, para incremento das relações internacionais.
O fundo estrangeiro vem realmente ou ainda tem algum entrave?
Os sinais são favoráveis. O que muda são os avanços em todas as reformas que temos na pauta. Tem muito trabalho pela frente. Avançando nas reformas, nessa inserção internacional, se muda a chave e as coisas começam a aparecer de forma ainda mais concreta.
Vamos abrir então um pouco a economia do Brasil, ainda considerado por muitos empresários como um país fechado?
Acho que os acordos dão justamente a amplitude daquilo que estamos fazendo, que é reduzir as tarifas, as barreiras não tarifárias, tornando as regras de origem mais flexíveis, tudo isso somado, constitui elementos de inserção, de abertura efetiva. Quando falamos em redução tributária, estamos falando em redução de custo de gestão tributária nas empresas, que são enormes e que mostram o quanto as empresas perdem de tempo e dinheiro com essas tarefas.
haverá aumento da exportação de minério de ferro? E como o ES, enquanto grande exportador de commodities, se beneficia desses acordos?
Isso está diretamente ligada à demanda internacional e à questão da guerra comercial. O que posso dizer é que com relação aos acordos comerciais estáveis você permite uma redução dos custos e um acesso privilegiado dos produtos brasileiros. Isso pode vir a ser um dos elementos de aumento de exportações.