Entenda as particularidades deste sistema fluvial que enfrenta problemas iminentes, biodiversidade ameaçada e impactos de desastres ambientais
Por Kebim Tamanini
Nos últimos anos, a Bacia do Rio Doce tem sido alvo de crescente atenção devido à sua situação de alerta. Especialistas têm advertido sobre a possibilidade de as nascentes dos afluentes secarem até 2030 durante os períodos de estiagem.
“Se não cuidarmos das nascentes dos afluentes do Rio Doce no Espírito Santo, esses cursos de água poderão secar até 2030 em períodos de estiagem”, afirmou Henrique Lobo, professor e ambientalista, durante sua palestra “Os Rios da Terra” na conferência “Sustentabilidade Brasil” em junho deste ano.
Este recurso ambiental é vital para a população, e entender suas particularidades e importância é crucial. A Bacia Hidrográfica do Rio Doce cobre uma área de drenagem de 86.715 quilômetros quadrados, com 86% dessa área no Leste de Minas Gerais e 14% no Nordeste do Espírito Santo. Seus principais rios afluentes são:
Margem Esquerda
- Rio do Carmo
- Piracicaba
- Santo Antônio
- Corrente Grande
- Suaçuí Grande
- São José
- Pancas
Margem Direita
- Rio Casca
- Matipó
- Caratinga/Cuieté
- Manhuaçu
- Guandu
- Santa Joana
- Santa Maria do Rio Doce
Henrique Lobo destacou a importância de trabalhar com todos os 16 afluentes do Rio Doce e a necessidade urgente de recuperar as nascentes, especialmente através da cobertura dos topos de morros. O especialista, reconhecido internacionalmente, enfatizou que a Bacia Hidrográfica do Rio Doce é pobre em águas subterrâneas e que a recuperação das nascentes é essencial para manter o volume de água durante os períodos de escassez.
O Rio Doce se estende por 879 quilômetros, com suas nascentes situadas nas Serras da Mantiqueira e do Espinhaço, em Minas Gerais. A bacia possui um relevo ondulado e montanhoso, caracterizado como um “mar de morros”. Essa configuração orográfica tem influenciado a ocupação urbana, frequentemente em áreas suscetíveis a inundações, como ocorreu em 1979 na cidade de Colatina, no Noroeste do Espírito Santo, quando uma enchente devastou a região.
Economia e População
Historicamente, a extração de ouro foi uma atividade econômica significativa que moldou a ocupação da região. Hoje, o sistema de drenagem da bacia continua essencial para diversos usos: água doméstica, agropecuária, industrial e geração de energia elétrica.
A bacia é habitada por cerca de 3,5 milhões de pessoas, distribuídas em 228 municípios (200 em Minas Gerais e 28 no Espírito Santo). A economia local é diversificada, incluindo:
- Agropecuária: café, cana-de-açúcar, gado de corte e leiteiro.
- Agroindústria: açúcar e álcool.
- Mineração e Reflorestamento.
- Produção: celulose e laticínios.
- Comércio e Serviços: voltados para complexos industriais.
Com 98% de sua área inserida no bioma da Mata Atlântica e 2% no Cerrado, a Bacia do Rio Doce é rica em biodiversidade, embora haja desigualdade na distribuição dos recursos hídricos entre suas regiões.
Desastre Ambiental
A tragédia da barragem de Fundão, pertencente à mineradora Samarco (Vale e BHP Billiton), em Mariana (MG), foi um marco negativo na história da bacia. O rompimento da barragem em 5 de novembro de 2015 liberou uma onda de rejeitos que percorreu cerca de 660 km, alcançando o mar em Regência, no município de Linhares (ES), em 21 de novembro de 2016. Este evento é considerado o maior desastre ambiental da história do Brasil e o pior acidente com barragens de rejeitos no mundo.
Desde o rompimento, instituições como a Agência Nacional de Águas (ANA), o Serviço Geológico do Brasil (CPRM) e o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM) têm monitorado a qualidade das águas e dos sedimentos do rio, produzindo relatórios técnicos e análises contínuas para avaliar o impacto ambiental e buscar soluções.
Perspectivas Futuras
O estado de alerta atual é corroborado por um estudo publicado no livro “Mudanças Climáticas: Efeitos sobre o Espírito Santo”, do Instituto de Estudos Climáticos do Espírito Santo (IEC-ES). O estudo revela que a combinação de baixas precipitações e altas temperaturas resultará em uma “diminuição drástica da disponibilidade hídrica da bacia”, representando um grande desafio para a gestão dos recursos hídricos do estado.
Os pesquisadores alertam que os modelos climáticos e os cenários futuros indicam graves problemas devido às reduções significativas das precipitações tanto nos períodos chuvosos quanto secos ao longo do século 21. A bacia do Rio Doce poderá enfrentar sérios problemas relacionados à redução das vazões.