Nossa cultura é uma herança majoritariamente portuguesa, a partir de 3 séculos de colonização que asseguraram principalmente nossa igualdade linguística e religiosa, guardados costumes e ancestralidade.
Hoje, a estatística revela a presença de 700 mil portugueses, sem dupla nacionalidade, residindo no Brasil, e a memória capixaba registra, desde tempos passados, a participação de muitos deles na formação da nossa estrutura social econômica. José Martins Moreira Rato foi um deles. Nasceu em Lisboa, em 1883, sob o regime monárquico que 27 anos mais tarde iria por ele ser
confrontado. Surgira em Portugal, em 1876, o Partido Republicano, apoiado pela pequena e media burguesia, uma alternativa entre a força dominante dos Partidos Regenerador e Progressista.
José Rato, personagem deste registro, mostrou-se um político nato e atuante, tornando-se um dos organizadores do movimento destinado a derrubar a monarquia, o que iria ocorrer em outubro de 1910. Dotado de sensibilidade artística, organizou a banda de música que tocaria por ocasião da vitória republicana. O “Dobrado Silvino Rodrigues”, símbolo da vitória alcançada, continua atual e é executada, ainda hoje, também por bandas brasileiras.
Patriota e desinteressado em honrarias e vantagens pessoais, recusou cargo no novo governo que ajudara a se instalar. A vitória, pela qual lutara, lhe bastava. Um problema familiar mudou o seu destino: um dos seus três filhos, Fernando, contraíra tuberculose e a família Rato recebeu orientação médica para realizar seu tratamento no Brasil, com a indicação de Domingos Martins, no Espírito Santo, cujo clima era favorável para a recuperação do enfermo.
José Martins Moreira Rato não hesitou e, com sua esposa Clotilde e seus filhos Henrique e Fernando, deixou sua pátria, à qual dera tanto de sua vida, e veio para o Brasil. Adelaide, já casada, ficou em Lisboa. José Rato, com a mulher e o filho Fernando, veio para o Espírito Santo. Dona Clotilde e o filho enfermo seguiram para Santa Isabel, hoje Domingos Martins, para cumprir a prescrição médica.
Algum tempo depois, o filho Henrique, que ficara no Rio de Janeiro trabalhando no comércio, foi convidado para gerenciar uma filial das Casas Pernambucanas que se iria inaugurar em Vitória. Foi à primeira loja instalada na Vila Rubim e a ela se seguiriam depois mais duas em Vitória e outras em cidades do interior. José Rato viu boa oportunidade no mercado de consumo que se expandia, alugou pequeno apartamento na Vila Rubim e se dedicou ao comércio de café, secos e molhados e à montagem de um bar.
A morte do filho Fernando, aos 19 anos, abalou emocionalmente José Rato, mas não o impediu de continuar se dedicando, com o mesmo elã que o levara a participar da revolução portuguesa, aos seus negócios em Vitória. Um dos seus fornecedores de mercadoria, especificamente café torrado, o médico Roberto Zanandréia, iria mais tarde se incorporar à família Rato, casando-se com uma de suas netas.
O nome do português que tão bem se adaptara aos nossos costumes ganhou maior projeção quando, com seu filho Henrique, adquiriu do tenente Adolfo Bittencourt a fazenda Pau Brasil. A área se situava onde hoje é o Bairro de Fátima, na Serra. No ano de 1952, loteou a fazenda, cedendo espaço para a construção do Santuário Nossa Senhora do Rosário de Fátima, atual Paróquia Nossa Senhora de Fátima, e a Escola de Ensino Fundamental e Médio Clotilde Rato. A pedra fundamental da Igreja foi lançada entre os dias 13 e 17 de abril de 1933, quando a imagem de Nossa Senhora de Fátima, percorrendo o mundo, foi trazida para abençoar o local.
A Escola Fundamental foi construída no governo Élcio Álvares, sendo secretário da Educação Arabelo do Rosário, e na gestão do prefeito José Maria Feu Rosa teve seu nome associado à esposa do seu benfeitor.O luso-capixaba José Rato faleceu em Vitória, em novembro de 1967, aos 84 anos de idade. Foi conduzido ao túmulo, no Cemitério de Santo Antônio, com o corpo envolvido pela Bandeira da revolução portuguesa, marcada pelas balas que a perfuraram, que trouxera como troféu quando veio para o Brasil. Como justa homenagem, numa retribuição pelas benesses recebidas, a administração municipal da Serra referendou a indicação do nome dado à principal via pública do bairro: Avenida José Rato.
(Copidesque: Rubens Pontes)