É necessário que a população brasileira se aposse de sua negritude. Precisamos colocar a história no seu devido lugar
Por Manoel Goes Neto
O mês de novembro tem se tornado referência para atividades de resistência, luta e principalmente, da rebeldia do povo preto, que historicamente tem sido os sujeitos do enfrentamento ao racismo articulado nas diversas esferas da sociedade. A data recorda o dia em Zumbi dos Palmares foi assassinado, 20 de novembro de 1695. Zumbi foi líder do Quilombo de Palmares, um refúgio dos escravos, e durante sua vida lutou contra a escravidão. É necessário que a população brasileira se aposse de sua negritude. Precisamos colocar a história no seu devido lugar.
A baixa autoimagem do povo preto remonta aos tempos da migração forçada do continente africano, quando foram embarcados à força em navios negreiros jejes, iorubas, e tantos outros que foram obrigados a deixar para trás sua religiosidade, costumes, história e suas formas próprias de identificação, criando um conceito de autoestima inferior. A centurial interação entre europeus e seus descendentes com os povos nativos e africanos e seus descendentes escravizados gerou desigualdades e diferenças, levando à formação de uma hierarquia social que deixava à mostra a distância social entre colonizadores e subalternos. Índios e pretos partilharam desde então situação de inferioridade e exclusão social, o que não está muito diferente nos tempos atuais.
O ato de “amar a si mesmo” requer atitudes como o auto respeito, a auto aceitação, e o autoconhecimento. Um valor que atribuímos a nós mesmos – a autoestima. Por sua vez, autoconhecimento pressupõe consciência da própria história e de todos os aspectos de nossa personalidade. Já a auto aceitação é acolher nossos erros e acertos. Todos esses elementos interagem na construção de nossa autoimagem e fazem parte do conceito de autoestima. A idealização do mundo branco e a desvalorização do negro, é resultado da seguinte associação: o que é branco é bonito e certo, o que é negro, feio e errado. Muitos negros são induzidos a crer que sua condição inferior é decorrente de suas características pessoais, deixando de perceber que, de fato, assumem a discriminação exercida pelo grupo dominante.
O preconceito racial gera reação perversa que desencadeia estímulos dolorosos e retira da pessoa toda possibilidade de reconhecimento e mérito, levando-a a utilizar mecanismos defensivos das mais diversas ordens, o que é muito negativo. A baixa autoimagem do negro é reproduzida pela mensagem transmitida recorrentemente às pessoas negras de que, para ser humanizado, é preciso corresponder às expectativas do padrão dominante, ou seja, tornar-se branco. Essa situação decorre da internalização de que “embranquecer” seria o único meio para ter acesso a respeito e dignidade.
A desigualdade social aumentou, e o racismo estrutural ficou bem mais evidente em tempos de pandemia. Os números não deixam dúvidas que pretas e pretos morreram e adoeceram mais com a Covid-19. Temos vários estudos, como os da Fiocruz e PUC do Rio de Janeiro que confirmam esta triste realidade. Não se trata de se acomodar, mas de ser capaz de reconhecer e celebrar quem somos, e buscar mudar o que julgarmos necessário. Luta que segue.
Por: Manoel Goes Neto – escritor e subsecretário de Cultura de Vila Velha.