Vivemos tempos de hipersegmentação. Um mundo onde as massas já não marcham no mesmo compasso
Por André Gomyde
Dizem que Peter Drucker, o grande mestre da administração moderna, afirmou que a profissão do século XXI seria a de pescador. Não o pescador tradicional, de vara na mão e barquinho no rio. Não. Drucker falava de outro tipo de pesca: aquela que exige precisão, paciência e a arte de compreender as correntes invisíveis que movem a sociedade.
Vivemos tempos de hipersegmentação. Um mundo onde as massas já não marcham no mesmo compasso. Em vez disso, as pessoas se agrupam em tribos, nichos, bolhas. Há tribos que cultivam plantas exóticas no quintal, nichos que consomem apenas café moído à mão e bolhas que discutem teorias sobre o melhor jeito de pendurar um quadro na parede. E, nesse cenário, quem deseja criar algo relevante – seja no mercado ou na gestão pública – precisa “pescar” essas especificidades.
Aqui, entra a habilidade do pescador moderno. Ele não lança redes ao acaso, esperando capturar o que vier. Ele observa, entende o comportamento das águas e escolhe a isca certo para cada peixe. A metáfora não é só charmosa, é reveladora. Entregar soluções customizadas, personalizadas para cada público, tornou-se o novo padrão.
Nas cidades inteligentes, por exemplo, não há receita única. Cada cidade tem suas dores, seus fluxos, seus desafios. A iluminação que funciona em Oslo pode ser inútil em Manaus. A mobilidade urbana de Tóquio não cabe na geografia de Lisboa. Ser “inteligente”, nesse caso, é ser humano: enxergar a cidade como um organismo vivo, com necessidades próprias, e adaptar-se a elas.
Essa lógica vale para tudo. O pescador-novo, seja ele um empreendedor, um gestor público ou um criador de conteúdo, precisa olhar para as pessoas e perguntar: quem são elas? O que querem? Do que precisam? Não há mais espaço para o genérico, para o “um tamanho serve para todos”.


E aqui vem a questão: será que estamos prontos para essa nova pescaria? Sabemos, de fato, entender as tribos ao nosso redor? Estamos dispostos a trocar nossas certezas e padrões por uma curiosidade genuína sobre o outro?
Pense nisso: no século XXI, não basta saber onde lançar a rede. É preciso aprender a ouvir as águas, observar os ventos, compreender as marés. E você, leitor, como pescaria nesse vasto oceano de nichos? Que isca escolheria?
André Gomyde é presidente do Instituto Brasileiro de Cidades Humanas, Inteligentes, Criativas e Sustentáveis e Mestre em Administração pela FCU, nos Estados Unidos. Instagram: @andre.gomyde