A Argentina enfrenta sérias dificuldades para fortalecer suas reservas internacionais, o que prejudica sua capacidade de atrair investimentos estrangeiros
Por Ricardo Paixão
A crise econômica da Argentina atingiu um estágio crítico em 2024, com diversos indicadores apontando para uma severa deterioração das condições socioeconômicas do país. A atividade econômica retraiu 3,1% nos primeiros sete meses do ano, e o Banco Central local projetou uma queda de 3,8% no PIB (Produto Interno Bruto) para o ano em questão. Paralelamente, a pobreza alcançou o alarmante índice de 52,9% da população no primeiro semestre de 2024, destacando o impacto profundo da crise sobre a qualidade de vida dos argentinos.
O ajuste fiscal implementado pelo governo portenho agravou ainda mais a situação. Com cortes drásticos nos repasses dos programas sociais, que foram reduzidos em 45%, muitas famílias perderam o suporte básico para lidar com as dificuldades econômicas. Essa redução nos programas sociais contribuiu para o aumento do desemprego, cerca de 15% dos chefes de família perderam seus empregos em 2024. O setor privado, por sua vez, registrou a demissão de cerca de 177 mil trabalhadores entre novembro de 2023 e abril de 2024, um reflexo direto da retração econômica e da falta de políticas que fomentem a criação de empregos.
Além disso, a Argentina enfrenta sérias dificuldades para fortalecer suas reservas internacionais, o que prejudica sua capacidade de lidar com crises cambiais e de atrair investimentos estrangeiros. O cenário é agravado pela paralisia econômica causada por uma inflação descontrolada, que mina o poder de compra da população e cria um ambiente de insegurança para negócios e consumidores.
Historicamente, a Argentina já figurou entre os países mais ricos do mundo, mas, segundo o Banco Mundial, atualmente ocupa apenas o 70º lugar, evidenciando a extensão do declínio econômico. O ajuste fiscal, embora tenha sido defendido como uma medida para estabilizar as finanças públicas, trouxe um custo social e econômico extremamente elevado. A combinação desses diversos fatores consolida um cenário de estagnação e sofrimento para grande parte da população, que enfrenta uma crise sem precedentes na história recente do país.
Para atenuar a grave crise econômica que afeta a Argentina, o governo poderia adotar uma combinação de medidas que equilibrassem a necessidade de ajustar as contas públicas com a proteção social e o estímulo ao crescimento econômico. Em primeiro lugar, seria fundamental revisar o ajuste fiscal para torná-lo mais progressivo, garantindo que os cortes não incidam sobre programas sociais essenciais que atendem às populações mais vulneráveis. Isso poderia ser alcançado por meio de uma reforma tributária que aumentasse a carga tributária sobre setores de maior renda e sobre grandes fortunas, aliviando a pressão sobre os grupos mais pobres e mantendo o financiamento das políticas sociais.


Além disso, o governo deveria investir em políticas de estímulo ao emprego e ao setor produtivo. Isso poderia incluir subsídios para pequenas e médias empresas, incentivo à exportação e programas de qualificação profissional, especialmente em setores estratégicos como tecnologia e agricultura. A promoção de uma política industrial focada em inovação e agregação de valor aos produtos exportados também seria uma estratégia importante para aumentar a competitividade no mercado global e gerar mais empregos.
Outra medida relevante seria negociar melhores condições com credores internacionais para reestruturar a dívida pública. Isso liberaria recursos que poderiam ser redirecionados para investimentos em infraestrutura e programas sociais, fomentando a atividade econômica. Paralelamente, seria necessário implementar políticas monetárias e cambiais que estabilizem a inflação e reduzam a volatilidade do peso argentino, devolvendo a confiança aos investidores e consumidores.
O governo também precisaria fortalecer as reservas internacionais, possivelmente por meio de acordos bilaterais com outros países ou organismos multilaterais, garantindo maior estabilidade econômica e uma margem de manobra para enfrentar flutuações no mercado financeiro. A adoção de políticas voltadas à sustentabilidade ambiental, como estímulos ao uso de energias renováveis, também poderia atrair investimentos externos e abrir novos mercados.
Por fim, seria imprescindível recuperar a confiança da população e do setor privado por meio de maior transparência e previsibilidade nas políticas econômicas. Um diálogo aberto com sindicatos, empresários e movimentos sociais ajudaria a construir um consenso em torno das reformas necessárias, minimizando resistências e ampliando o alcance das ações do governo. Essas medidas, se implementadas de forma integrada, poderiam ajudar a mitigar os impactos da crise e criar as bases para uma recuperação econômica sustentável na Argentina.
Ricardo Paixão é economista, mestre em Economia e doutorando em Educação – UFES, professor Efetivo da FACELI e conselheiro do Conselho Regional de Economia do Espírito Santo – Corecon-ES