Em ano de tragédias climáticas, eleições e mudanças na geopolítica global, economia capixaba se destaca, impulsionada pela agropecuária, serviços e indústria
Por Daniel Hirschmann
O ano de 2024 marcou um período de profundas transformações e desafios, tanto no Espírito Santo quanto no Brasil e no mundo. A crise climática se mostrou mais evidente, refletida em enchentes devastadoras e incêndios recordes, além de secas extremas até mesmo em regiões inesperadas. No cenário político, o país vivenciou um ano de disputas municipais que serviram como termômetro para as eleições presidenciais de 2026, em meio a um ambiente de polarização e expectativas sobre os rumos da democracia – inclusive, com a prisão de parlamentar capixaba.
Economicamente, 2024 foi caracterizado pela disparada do dólar a patamares recordes e pressões inflacionárias que afetaram o poder aquisitivo dos brasileiros. O déficit fiscal permaneceu como um problema estrutural, limitando investimentos públicos e gerando debates sobre ajustes econômicos.
Internacionalmente, em meio a novas e velhas guerras, as eleições presidenciais nos Estados Unidos emergiram como um evento crucial, a partir da volta de Donald Trump à chefia da Casa Branca, com potenciais impactos geopolíticos significativos.

No cenário local, o ano foi marcado por crescimento da atividade econômica capixaba, com expectativas de fechamento do ano acima do crescimento nacional e um mercado de trabalho aquecido, com taxa de desemprego em 4,1%. “Esse mercado de trabalho mais aquecido influenciou o aumento da demanda da economia, em especial nos setores voltados ao consumo das famílias. Uma taxa de desemprego baixa, como a que estamos observando no estado, é sempre um motivo de comemoração”, afirma a economista-chefe e gerente executiva do Observatório da Indústria da Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes), Marília Silva.
Por outro lado, sob a ótica das mudanças climáticas, as fortes chuvas no final do primeiro trimestre causaram enchentes devastadoras na região Sul do estado e o inverno mais seco resultou em um período de estiagem no terceiro trimestre, impactando especialmente o Norte do Espírito Santo.
Motivo de comemoração

Do lado da economia, houve impulso de todos os setores, em especial os segmentos agropecuário e industrial. Marília ressalta que setores com elevada participação no PIB do estado, em especial os de petróleo e gás, metalurgia e papel e celulose – que, juntos, respondem por 16,8% do PIB capixaba –, têm desafios voltados para algumas condições de mercado. Em relação ao setor de petróleo e gás natural, ela acredita que a menor produção dos insumos no primeiro semestre de 2024 deve ser contrabalanceada pela maior produção no segundo semestre, fruto do comissionamento da FPSO Maria Quitéria.
Já os setores de metalurgia e papel e celulose têm enfrentado desafios nos mercados internacionais. No caso da metalurgia, a economista da Findes cita a concorrência com o aço chinês, que tem afetado as vendas internacionais do setor. “Quanto ao segmento de papel e celulose, a menor demanda internacional, principalmente da Europa e dos Estados Unidos, alinhada às duas paradas programadas pela Suzano, direcionam para um ano com um nível de produção menor no setor”, prevê.
Crescimento acima da média
O presidente do Conselho Regional de Economia do Espírito Santo (Corecon-ES), Claudeci Pereira Neto, destaca que o Espírito Santo tem crescido acima da média nacional nos últimos anos. Ele entende que o bom desempenho da economia capixaba em 2024 reflete o ambiente favorável que o Espírito Santo tem para a atração de investimentos e a manutenção de empreendedores. “Prova disso é que o estado subiu quatro posições no Ranking de Competitividade do Centro de Liderança Pública, passando do décimo para o sexto lugar”, ressalta.
Além disso, o Escritório de Projetos do Governo do Estado do Espírito Santo (PMO-ES), responsável pela estruturação e monitoramento dos programas e projetos estratégicos do governo, foi escolhido como o melhor escritório de projetos do país neste ano, “o que aponta para a eficiência dos gastos em investimentos públicos”.
O Espírito Santo também se mantém com nota A, há 13 anos, na análise de capacidade de pagamento de estados e municípios (Capag) do Tesouro Nacional. “Esse ano foi nota A+, que é a nota mais alta. Então, o Espírito Santo tem as contas equilibradas e tem confiança dos investidores. O ambiente é favorável e as regras são claras para os investidores virem com tranquilidade, porque é um estado organizado”, avalia o presidente do Corecon-ES.
Ele lembra, também, que em 2023 o Espírito Santo foi o estado que mais investiu em relação às despesas empenhadas, chegando a R$ 4,2 bilhões, o que representou 20% dessas despesas. A expectativa é de fechar 2024 repetindo esse nível de investimentos.


Menor taxa de homicídios

Além do ambiente favorável na economia, outro indicador se destaca positivamente em uma área que, por muito tempo, foi um fator de preocupação para os capixabas: o estado pode finalizar o ano de 2024 com a menor taxa de homicídios das últimas décadas, próxima de 20 homicídios por 100 mil habitantes.
Segundo o diretor-geral do Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), Pablo Lira, a expectativa é de que o Espírito Santo termine o ano com menos de 900 homicídios. “É o melhor resultado desde 1996, se a gente olhar o número absoluto de homicídios, lembrando que em 2009 o Espírito Santo registrou o maior número, com 2.034 homicídios”, comenta.
Educação em primeiro lugar
O ano de 2024 também trouxe bons resultados para o Espírito Santo na área de educação, com a melhora nos indicadores do estado em todas as etapas do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). O estado obteve o primeiro lugar entre as redes estaduais de ensino do Brasil, na etapa do Ensino Médio, com 4,8, Nos anos iniciais da educação básica, ficou em quinto lugar, com 6,3, e nos anos finais do Ensino Fundamental, foi o terceiro colocado, com nota 5,3.
Para o vice-governador e secretário de Desenvolvimento, Ricardo Ferraço, os bons resultados refletem os investimentos que o governo estadual fez na educação. “Com apoio dos nossos professores, nós conseguimos este ano um resultado excepcional. Mantendo essa trajetória de boa performance na nossa educação, estamos cuidando de um dos nossos mais importantes ativos, que é o capital humano do Espírito Santo, a capacidade e a qualidade dos nossos colaboradores, dos nossos trabalhadores”, afirma Ferraço.
Atenção ao clima

Entretanto, ainda que até o momento muitos indicadores tenham variações positivas, o ano de 2024 também revelou pontos de atenção, por exemplo, sob a ótica das mudanças climáticas. As fortes chuvas registradas no final do primeiro trimestre causaram enchentes devastadoras na região Sul do estado. Em contraste, o inverno mais seco resultou em um período de estiagem no terceiro trimestre, impactando especialmente o Norte do Espírito Santo.
Segundo Marília Silva, esse cenário pode comprometer as safras de 2025, especialmente a produção de café. “Por outro lado, o retorno das chuvas nos últimos meses do ano elevou as vazões dos principais rios do estado, contribuindo para atenuar os efeitos dos meses de seca”, pondera a economista-chefe da Findes.
Para o fechamento de 2024, a previsão é de manutenção da trajetória de crescimento econômico, com contribuições de todos os setores, como agropecuária, serviços e indústria. A expectativa é de encerrar o ano com a economia capixaba em crescimento e um desempenho novamente superior à média nacional. No mercado de trabalho, a perspectiva é de manutenção da baixa taxa de desemprego.
No acumulado de janeiro a setembro de 2024, em relação ao mesmo período de 2023, a produção física da indústria capixaba teve uma leve alta de 0,2%. O resultado refletiu o crescimento de 0,9% da indústria de transformação e a queda de 0,3% da indústria extrativa.
O setor de metalurgia (+5,2%) e a fabricação de produtos alimentícios (+1,4%) impulsionaram a indústria de transformação. Por outro lado, a indústria extrativa foi impactada pela queda na produção de petróleo e gás, não compensada pelo aumento na produção de minérios de ferro pelotizados.
No acumulado até setembro, a produção física da indústria do Espírito Santo cresceu 5% e ficou acima da média nacional (+2,6%).
Comércio exterior e investimentos industriais

No comércio exterior, as exportações industriais do Espírito Santo atingiram US$ 5,7 bilhões entre janeiro e agosto de 2024, um aumento de 1,6% em comparação ao mesmo período de 2023. O destaque foi para produtos da indústria extrativa, como pelotas de minério de ferro e petróleo.
Em contrapartida, as importações somaram US$ 9,7 bilhões, uma alta de 65,5%, impulsionada pelo aumento na aquisição de veículos e aeronaves.
A Bússola do Investimento do Observatório da Indústria da Findes indica que o total de investimentos confirmados no Espírito Santo no período de 2024 a 2029 é de R$ 83,1 bilhões, distribuídos entre 66 dos 78 municípios capixabas. São 276 projetos de investimentos confirmados até 2029, com destaque para obras de infraestrutura, extração de petróleo e gás natural, armazenamento e atividades auxiliares de transporte.
“Esses investimentos são essenciais para o crescimento econômico do estado, promovendo a modernização da infraestrutura e reforçando setores estratégicos como energia e extração de recursos naturais”, afirma a economista-chefe e gerente executiva do Observatório da Indústria da Findes, Marília Silva.
O Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN) também divulgou a Carteira de Investimentos Anunciados e Concluídos 2023-2028, indicando que até o ano de 2028 o Espírito Santo deve receber R$ 97,9 bilhões de investimentos. A maioria (91%) está relacionada à Indústria, com R$ 89,7 bilhões. Destacam-se aí empresas como Vale, Petro Rio, Seacrest e Petrobras, esta com o maior valor de Investimento em execução (R$ 25,1 milhões).
*Esta matéria foi publicada originalmente na revista ES Brasil 225, publicada em dezembro. Leia a edição completa da Retrospectiva 2024 aqui.