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quinta-feira, 25 abril, 2024

2016: As Olímpiadas vão deixar saudades, mas só elas

Nos últimos 12 meses, o país vivenciou um tsunami de descobertas e mudanças, especialmente após o encer­ramento das Olimpíadas, único evento que encheu de orgulho os brasileiros em 2016 – ou, ao menos, a maior parte deles.

O ano que se encerra registrou a maior manifestação de rua da história nacional, com mais de 3 milhões de pessoas protestanto, 120 mil só na Grande Vitória. Foi também o ano do impeachment, das eleições municipais, da ascensão de Donald Trump ao poder nos Estados Unidos, no comando do maior império do planeta. Quase no final, quando todos já pensavam em repor as energias, veio a tragédia da Chapecoense, que parou o Brasil e comoveu o mundo. Outras marcas dramáticas de 2016 foram os ataques terroristas e o sofrimento dos milhões de refugiados.

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Não foram poucas as tristezas. Já no primeiro semestre, foi preciso enfrentar as epidemias de zika, dengue e chikungunya, todas causadas por um único agente, o Aedes aegypti. E, neste ano, com novidades ainda mais cruéis: as síndromes neurológicas associadas ao zika vírus e ao vírus da febre chikungunya, que causaram microcefalia em centenas de fetos e recém-nascidos, e a síndrome de Guillain-Barret, que provoca paralisia e até morte em adultos e idosos.

Somente no Espírito Santo, de 3 de janeiro a 18 de junho, foram notificados 48.712 casos de dengue, sendo 563 suspeitos da forma grave; 19 são mortes confirmadas e 18 são óbitos sob investigação.

Em todo o país foram 1.345.286 casos nesse mesmo período. Também foram notificados 3.885 casos de infecção pelo zika vírus no Estado, e o Brasil totalizou 165.932 ocorrências. Esses números levaram o ESB Debate de abril a trazer o tema: “Estratégias de Combate à Epidemia Causada pelo Mosquito Aedes aegypti: Zika, Dengue e Chikungunya”.

Em relação à microcefalia, o país registrou nesse período 1.709 casos. Ao todo, foram 8.571 notificações desde o início das investigações, em 22 de outubro de 2015, até 16 de julho deste ano, com 102 mortes. Segundo o Ministério da Saúde, 3.680 casos foram descartados e outros 3.182 ainda estão em investigação.

No Espírito Santo, até a primeira semana de dezembro deste ano, a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) apontou 18 bebês, entre nascidos e em gestação, diagnosticados com microcefalia, mas ainda sem confirmação de relação com o zika vírus.

Durante o evento, a gerente de Vigilância em Saúde da Sesa, Gilsa Rodrigues, o infectologista Lauro Ferreira da Silva Pinto Neto e o ginecologista Luiz Sobral Vieira reiteraram que a ainda pequena participação da sociedade nos momentos de epidemia era um grave problema. “Todos sabem como acabar com os focos do mosquito. Há muita coisa que o governo precisaria fazer com maior empenho, mas sem o envolvimento sistemático da população veremos esse cenário péssimo novamente nos próximos anos”, alertou Lauro Ferreira.

Rio 2016
O espetáculo da abertura dos Jogos Olímpicos Rio 2016 calou as críticas. Os encantos foram diversos, talvez resumidos no desfile de Gisele Bündchen, a mais global das brasileiras, que atravessou 128 metros de passarela ao som de “Garota de Ipanema” e de palmas e assovios de 70 mil pessoas presentes no Maracanã – o templo maior do futebol brasileiro.

Entre os dias 5 e 21 de agosto, câmeras e microfones da imprensa nacional e internacional se viraram para pistas, quadras e piscinas do Rio de Janeiro. Muitas foram as histórias de superação que levaram a vitórias almejadas havia anos.

Histórias como a da judoca Rafaela Silva, moradora da Cidade de Deus, emblemática favela carioca, que conquistou a primeira medalha para o Brasil em seu próprio país; a do canoísta baiano Isaquias Queiroz, de 22 anos, que se tornou o primeiro brasileiro a conquistar três medalhas numa mesma edição de Olimpíada; a dobradinha de Diego Hipólito e Arthur Nory no solo; e o show de Thiago Braz, que não estava entre os favoritos no salto com vara, mas não apenas conquistou a medalha de ouro, como também derrubou o recorde olímpico da prova, saltando 6,03m e levando à loucura o público do Estádio Olímpico, o Engenhão.

Mas certamente nenhuma dessas conquistas mexeu mais com o capixaba do que ver o seu gigante Mamute no lugar mais alto do pódio do vôlei de praia, ao lado do Mágico Bruno Schmidt, já carinhosamente adotado pelo Estado. Os dois pararam o Espírito Santo no dia 19 de agosto, com muita raça e emoção. A chuva na arena lavou a alma dos torcedores diante da vitória sobre os italianos Nicolai e Lupo por 2 a 0, que colocou o Brasil no topo do mundo, 12 anos após Emanuel e Ricardo serem campeões em Atenas.

“Demorou um tempo para a ficha cair. Foi e sempre será um momento único na minha carreira. Nós nos preparamos muito para isso. Disputar uma Olimpíada em casa e ainda por cima ganhar uma medalha de ouro foi a realização de um sonho, talvez o maior deles, profissionalmente. Só tenho a agradecer muito a Deus, a todas as pessoas que nos ajudaram a chegar até aqui: profissionais, parceiros, amigos, colegas fora de quadra… Essa equipe, que é toda capixaba, fez por merecer, e isso é incrível. Sempre digo que essa medalha é do povo brasileiro, que faz acontecer, que acorda de manhã para lutar por um país melhor. Vocês fizeram a diferença nesses Jogos Olímpicos. Este ano foi especial demais pra gente”, contou Alison Cerutti.

Depois, de 7 a 18 de setembro, o país finalmente conheceu e reconheceu os feitos de seus atletas paralímpicos. O nadador Daniel Dias conquistou nove medalhas no Rio e se tornou o atleta mais premiado da natação paralímpica mundial, tendo subido no pódio nada menos do que 24 vezes.

Do Espírito Santo, nos representaram: Renata Bazone e Daniel Mendes, no atletismo; Patrícia Pereira, na natação; Neusimar Santos, no goalball; e Jéssica Silva, Geisiane Souza e Bisa Silva, além do técnico Martoni Moreira Sampaio, no basquete em cadeira de rodas.

Mais orgulho para os capixabas. Daniel Mendes e seu guia, Heitor Salles, conquistaram um feito inédito no Estado. Além de levar o bronze nos 200m T11, conseguiram o ouro no revezamento 4 x 100m T11.

Infraestrutura
A bancada capixaba, o Governo de Estado, a Assembleia Legislativa e prefeitos se mobilizaram para possibilitar as tão sonhadas melhorias na infraestrutura, como o Aeroporto de Vitória, um dos maiores gargalos para a logística do Espírito Santo e, consequentemente, para alavancar a economia local. Após diversas paralisações nas obras, com consequentes adiamentos nas datas de entrega, a promessa agora é para que o novo terminal de passageiros seja concluído em setembro de 2017.

Em 25 de julho, o então ministro da Aviação, Eliseu Padilha, durante assina­tura da ordem de serviço para a retomada das obras, garantiu que as melhorias no aeroporto iriam inserir Vitória no mesmo patamar de outros aeroportos, como Brasília. “Teremos um espaço três vezes maior do que o atual. Este aero­porto vai receber Boeings 767 e, com isso, vai aumentar o envio de cargas para outros estados. Temos tudo para dar um salto de qualidade. Basta cada um fazer a sua parte, e nós vamos honrar nossos compromissos”, disse o ministro.

O investimento está estimado em R$ 523,5 milhões, e o projeto faz parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Padilha disse que o andamento das obras estava dentro do cronograma previsto. Os recursos são provenientes do Orçamento Federal e do Fundo Nacional de Aviação Civil.

Durante reunião na Comissão de Turismo da Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales), no início de novembro, o superintendente do Aeroporto de Vitória, João Marcos Coelho Soares, afirmou que o movimento no terminal foi de 3,5 milhões de passageiros no ano passado, e para este ano projetou um crescimento de 2,3%. De janeiro a setembro de 2014 foram realizadas 45.338 operações, contra 44.225 no mesmo período de 2015. O Aeroporto Eurico Salles opera atualmente com três linhas aéreas para voos nacionais (Tam, Azul e Gol), além de uma linha para transporte de cargas (Total).

A lista de desafios a serem vencidos em infraestrutra para otimizar o desenvolvimento do Estado inclui o Porto de Vitória e sua polêmica dragagem, outra obra que também se arrasta há tempos. Apontada como um dos principais empecilhos para o avanço do comércio exterior capixaba, a profundidade do canal de Vitória finalmente deve ficar maior em 2017. Mas a finalização do serviço de dragagem não é mais unanimidade como solução entre os empresários.

“A dragagem e a derrocagem alteram favoravelmente as condições de navegação e manobra no canal de acesso. São mais de 10 anos com essa deficiência operacional, incorrendo em perdas de competitividade em relação a outras instalações portuárias, uma vez que não podemos receber navios de maior calado e, consequentemente, de maior capacidade de carga, o que contribuiria em muito para a redução do frete, em decorrência do aumento da consignação de carga por  tonelada”, reiterou o presidente da Associação dos Operadores Portuários do Espírito Santo (Aopes), Nilo Martins.

O presidente do Sindicato das Agências de Navegação (Sindamares), Sérgio Bonelle, discorda que esse avanço seja tão significativo assim, mas reconhece que haverá melhorias. “Primeiramente, ainda temos dúvida se o canal vai chegar aos 14m. Teremos que aguardar o final da dragagem e consequentemente a batimetria. A partir daí sim, teremos ideia de como irá ficar. Quanto ao calado de 13,5m, este atinge a maioria dos Panamax e, com certeza, irá aumentar o número de escalas em Vitória. Mas temos também que levar em consideração o investimento público e privado para elevar a competitividade do nosso porto e as escalas de navios”, argumenta Bonelle. Segundo ele, ainda que se conquiste a homologação da profundidade prevista no projeto, hoje há falta de demanda de cargas.

E os capixabas continuam à espera do Porto Central – complexo industrial portuário privado multipropósito, desenvolvido no modelo de condomínio portuário – no município de Presidente Kennedy e das promessas do Governo Federal de duplicar a BR-262 e de construir a ferrovia Vitória–Rio.

Economia
O Espírito Santo tem um comportamento diferenciado no cenário econômico, marcado pela maior intensidade dos ciclos da economia local em relação à nacional. Ou seja: quando a economia nacional está crescendo, a economia do Estado cresce acima da média do Brasil; em contrapartida, quando a economia nacional retrocede, o percentual de queda nos resultados do Estado é maior do que a média do país.

“Uma das questões que levam a esse cenário é que a economia capixaba é mais aberta que a brasileira, o que a torna mais vulnerável; também temos uma concentração muito grande do PIB em poucos setores, em commodities industriais. Há setores na economia brasileira que são fortes, mas ou não existem aqui no Estado, ou não têm grande expressão, como as indústrias de alimentos e de sapatos, por exemplo.

A diversificação é importante para não sofrermos quedas tão acentuadas. No caso do Espírito Santo, as commodities concentram cerca de 80% do PIB, e essa concentração faz com que a gente sofra mais nos períodos de crise da economia”, disse o coordenador do Grupo de Pesquisa em Inovação e Desenvolvimento Capixaba e professor de Mestrado em Economia da Ufes, Ednilson Silva Felipe.

O economista destaca que “entramos em 2016 com a crise econômica no país muito forte, ainda agravada depois por desdobramentos nas questões política e institucional. Tudo isso se refletiu aqui no Estado. E se, em termos de economia brasileira, a projeção para encerramento do ano varia entre 1,5% e 3%, de queda do PIB, no Estado chega a 10%. Inclusive, no 3º trimestre, já alcançava 12%, de acordo com o Instituto Jones”, enumera Felipe.

Outra preocupação é com o nível de complexidade da retomada do desenvolvimento. “A recuperação da economia local é ainda mais complicada do que a do restante do país. A economia nacional está ruim, e a internacional, apesar de não estar em crise, ainda não é capaz de puxar a nossa para cima, ou seja: estamos sem vetor de crescimento para a economia capixaba”, explica.

A intensidade da crise hídrica nos últimos três anos levou a academia a criar núcleos específicos de estudo, como o Observatório do Desenvolvimento Regional, da Ufes, porque os impactos são bastante diferentes, dependendo da região. “Mas a gravidade maior, sem dúvida, ocorre nos municípios mais pobres, quando você compara com a renda per capita média capixaba. Por isso, já podemos afirmar sem dúvida alguma que, mais grave do que a queda do PIB municipal, será a desigualdade social, ainda mais severa, daqui para a frente, em lugares como Ponto Belo, Mucurici e região nordeste do Estado. Se temos uma renda per capita em Vitória batendo em R$ 2.900,00, naqueles locais está batendo em R$ 400,00”, aponta Felipe.

Em relação ao emprego, o professor avalia que, por se tratar de uma variável que depende da variável investimento, e esta, por sua vez, é dependente da variável expectativa, as coisas ficam “amarradas”. Assim, se as expectativas melhoram, aumenta a disposição para investir, e isso se reflete em novas vagas de emprego. Mas, na avaliação do economista, este ano os sinais negativos estão se sobrepondo sobre os positivos. “O processo do impeachment, em si, não teve impacto nenhum na comunidade internacional em relação ao Brasil. O que agravou a situação foi a equipe ministerial escolhida por Michel Temer, com exceção da Fazenda. Em quatro meses, seis ministros caíram. O novo governo prometeu que seria diferente, transparente, e não foi. Isso sim causou impacto negativo na comunidade internacional e manteve afastados os investidores”, explica o analista.

O professor destaca como se deu a intensificação dos problemas do país “Tínhamos uma crise econômica que foi somada a uma crise política, e a essa crise política foi somada uma crise institucional, inclusive com embates muito pesados entre os Poderes. E aí se perde a segurança jurídica, não há absolutamente nenhum ambiente para investimentos em uma situação dessas.”

Por fim, ele avalia que os estragos causados pela corrupção no país, que vêm sendo revelados pela Lava Jato com intensidade cada vez maior, bate fortemente na classe política, mas traz sérios prejuízos à economia. “O conteúdo dos 800 depoimentos das delações da Odebrecht irá pairar bastante em 2017, e o mundo continuará vendo o Brasil com olhos ruins, as capas mostrando que o Brasil prometia ser o que não é, e ainda a gestão fiscal, que será mais puxada. Melhor pensar em alguma melhoria para 2018”, recomenda.

Crise sobre crise
“A crise econômica se explica pelas baixas taxas de crescimento, pelo elevado desemprego, pelo baixo grau de inserção externa (os saldos comerciais positivos são explicados por queda das impor­tações, e não pelo crescimento das exportações) e pela taxa de inflação ainda alta, se comparada aos padrões inter­nacionais e aos dos demais países em desenvolvimento, empobrecendo uma população que já é muito pobre”, reitera a doutora em Economia Arilda Teixeira, da Fucape, em relação às causas que levaram o Brasil a este momento crítico.

A crise política por sua vez, segundo Arilda, se explica pelas “evidências da relação promíscua instalada nos porões da República que, além de criminosa, atrasa o crescimento do país. Envergonha o brasileiro honesto, trabalhador e mal remunerado, refém dos abusos dos integrantes do poder público”.

E nessa luta de combate à corrupção, a criação do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), no Ministério Público Estadual (MPES), tem trazido resultados positivos. Traduzindo o sucesso em valores que retornaram aos cofres públicos por meio de ações da força-tarefa, em 2015 foram R$ 284.240.433,15.

Este ano, uma das operações impor­tantes foi a Âmbar, que desarticulou uma associação criminosa suspeita de sone­gação fiscal milionária no setor de rochas ornamentais, em Cachoeiro de Itapemirim. As autoridades fiscais estimam que o faturamento total oculto pelas empresas participantes do esquema criminoso supere R$ 1,5 bilhão nos últimos cinco anos.

“Os bons empresários e o próprio Sindirochas procuram o Ministério Público, procuram a Receita e relatam que precisam garantir uma concorrência leal. Isso porque não estão suportando esses falsos empresários, que agem obtendo lucros exorbitantes em cima de fraudes como essa”, disse o coordenador da Ordem Tributária, Econômica e Lavagem de Dinheiro do Gaeco do MPES, o promotor de Justiça Bruno Simões Noya.

E entre todas as (muitas) revelações bombásticas de 2016, uma impactou de forma mais expressiva políticos e empre­sários capixabas: a de que senadores teriam recebido propina para acabar com o Fundap (Fundo de Desenvolvimento das Atividades Portuárias), feita pelo ex-execu­tivo da Odebrecht Cláudio Melo Filho.

Segundo a delação, a Odebrecht teria articulado com líderes governistas no Senado e com membros de gestão federal anterior o pagamento de R$ 4 milhões para garantir a aprovação da matéria.

Reverter essa situação seria um bom começo para 2017.

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