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sexta-feira, 19 abril, 2024

Romero Jucá fora do Ministério do Planejamento

Após ser flagrado em gravação com ex-presidente da Transpetro sugerindo acordo para barrar investigação, permanência no cargo ficou insustentável 

O senador Romero Jucá (PMDB-RR) decidiu se afastar do Ministério do Planejamento ao final desta segunda-feira (23), após a divulgação de gravação em que ele sugere um acordo para barrar o avanço da Operação Lava Jato. O anúncio foi feito pelo próprio Jucá. Ele afirmou que hoje ainda acompanhará os assuntos do Ministério, mas que, a partir de amanhã (24), permanecerá licenciado até que o Ministério Público se manifeste a respeito da gravação. “A partir de amanhã eu vou entrar no Ministério Público pedindo uma manifestação. Não quero servir de massa de manobra”, afirmou 

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Em entrevista coletiva, Jucá voltou a se defender. “Tenho certeza que não cometi nenhuma irregularidade em relação à Lava Jato, que eu apoio e sempre apoiei”, disse o senador que coleciona extensa lista de acusações envolvendo corrupção, desde o governo Sarney quando esteve à frente da Funai e foi acusado de cobrar propina para permitir exploração ilegal de madeira em terras indígenas. Nos governos de Collor, FHC e Lula, há acusações incluindo compra de votos, calote em bancos públicos e recebimento de propina de empreiteiras, embora nunca tenha sido condenado. Um dos principais opositores ao Projeto Ficha Limpa, ele foi citado como beneficiário de um esquema de desvio na Petrobras. Em depoimento à Polícia Federal em fevereiro deste ano, admitiu ter pedido a Ricardo Pessoa, da UTC Engenharia, doações para a campanha de seu filho, Rodrigo Jucá (PMDB), candidato a vice-governador de Roraima, em 2014. Em delação premiada, Pessoa afirmou ter dado R$ 1,5 milhão ao PMDB de Roraima naquele ano. 

O teor da conversa entre o senador e o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, foi publicada nesta segunda-feira (23) pelo jornal Folha de S.Paulo. Os diálogos foram gravados em março, poucas semanas antes da votação na Câmara dos Deputados que deflagrou o processo de impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff. 

Na gravação, Machado afirma que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, “está a fim de pegar vocês [do PMDB]. E acha que eu sou o caminho”. Jucá então sugere uma saída “política” para encontrar uma solução. Eles então falam abertamente sobre o impeachment, Eduardo Cunha, Michel Temer e Renan Calheiros para parar a “sangria”.

No final da manhã de hoje, Jucá se defendeu e afirmou que não se referia à Lava Jato, mas à crise econômica. 

Veja trechos da conversa publicada pela Folha:

Machado (M) – Acontece o seguinte, objetivamente falando, com o negócio que o Supremo fez, vai todo mundo delatar.
JUCÁ (J)- Exatamente, e vai sobrar muito. O Marcelo e a Odebrecht vão fazer.
M – Odebrecht vai fazer.
J – Seletiva, mas vai fazer.
M – Queiroz [Galvão] não sei se vai fazer ou não. A Camargo [Corrêa] vai fazer ou não. Eu estou muito preocupado porque eu acho que… O Janot está a fim de pegar vocês. E acha que eu sou o caminho.
J – Você tem que ver com seu advogado como é que a gente pode ajudar. […] Tem que ser política, advogado não encontra [inaudível]. Se é político, como é a política? Tem que resolver essa porra… Tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria …]
M – Rapaz, a solução mais fácil era botar o Michel [Temer].
J – Só o Renan que está contra essa porra. ‘Porque não gosta do Michel, porque o Michel é Eduardo Cunha’. Gente, esquece o Eduardo Cunha, o Eduardo Cunha está morto, porra.
M – É um acordo, botar o Michel, num grande acordo nacional.
J – Com o Supremo, com tudo.
M – Com tudo, aí parava tudo.
J – É. Delimitava onde está, pronto”.

O presidente do PSDB, Aécio Neves (MG), é citado seis vezes na conversa. Segundo Jucá, estariam para cair ainda os tucanos: o atual ministro das relações exteriores, José Serra (PSDB-SP), e os senadores Aloysio Nunes e Tasso Jereissati, ambos do PSDB de São Paulo. 

M – A situação é grave. Porque, Romero, eles querem pegar todos os políticos. É que aquele documento que foi dado…
J – Acabar com a classe política para ressurgir, construir uma nova casta, pura, que não tem a ver com…
M – Isso, e pegar todo mundo. E o PSDB, não sei se caiu a ficha já.
J – Caiu. Todos eles. Aloysio [Nunes, senador], [o hoje ministro José] Serra, Aécio [Neves, senador].
M – Caiu a ficha. Tasso [Jereissati] também caiu?
J – Também. Todo mundo na bandeja para ser comido.

O advogado do ministro do Planejamento, Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, afirmou que seu cliente “jamais pensaria em fazer qualquer interferência” na Lava Jato e que as conversas não contêm ilegalidades. Jucá é formalmente investigado no âmbito da Operação Lava Jato. Ele é investigado no inquérito 3989, ao lado de dezenas de outros políticos, como o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), o senador Valdir Raupp (PMDB-RO), o ex-ministro Mário Negromonte e o atual presidente da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA).

Reincidente

Essa é a segunda vez que Romero Jucá traz problemas graves como ministro a um presidente da República. Em 2005, no primeiro governo Lula, à frente da Previdência, teve seu nome envolvido em denúncias sobre irregularidades em contrato da empresa Frangonorte, do qual foi sócio, com o Banco da Amazônia; e também sobre a cobrança de propina em projetos de obras públicas no município de Cantá, em Roraima. 

Segundo as denúncias, que levaram a uma investigação do Ministério Público Federal (MPF), a Frangonorte teria recebido R$ 18 milhões de empréstimo do banco, e oferecido como parte das garantias sete fazendas no interior do Amazonas, em nome de um sócio de Jucá. As propriedades, porém, só existiriam no papel. Depois de assumir a empresa e as dívidas no Banco da Amazônia, em dezembro de 1995, Jucá, sua mulher, Tereza Jucá (então prefeita de Boa Vista), e seu sócio, Getúlio Cruz, teriam recebido mais R$ 750 mil. Em agosto de 1996, Jucá e Getúlio teriam apresentado as sete fazendas, em nome do empresário cearense Luiz Carlos Fernandes de Oliveira, como garantia dos empréstimos. As terras foram avaliadas em R$ 2,69 milhões, e 15 dias depois Oliveira se tornaria sócio da Frangonorte. Jucá negou as irregularidades na época e chegou a dizer que ”o bandido da história não sou eu”.

Antes, Jucá e o prefeito de Cantá (RR), Paulo de Souza Peixoto, já tinham sido indiciados em inquérito de abril de 2004, para apurar desvio de verbas públicas na prefeitura. Em 2005, foram publicados trechos da gravação de uma conversa telefônica entre Peixoto e um empreiteiro; onde o prefeito reivindica R$ 25 mil dos R$ 257 mil liberados entre 1999 e 2000 pelo Ministério da Saúde para a construção de cinco poços artesianos. Os dois citam a comissão de 10% para um senador, sem mencionar o nome de Jucá. Mais adiante, o suposto articulador da propina, identificado pela polícia como José Augusto Monteiro Diogo Júnior, cita o nome de Jucá. “É 20% naquele negócio do Jucá, é?”, pergunta o empreiteiro na gravação.

Em abril daquele ano, apesar da cobrança dos parlamentares aliados, o então presidente Lula defendeu o ministro publicamente. ”Não posso tirar ou pôr um ministro em função desta ou daquela manchete de jornal”, afirmou. E Jucá só foi substituído quatro meses depois. 

Em junho de 2006, Jucá se tornou líder do governo no Senado. No entanto, em 2008, a mesma acusação que o derrubou da Previdência, sobre a Frangonorte, sefviu para a denúncia do então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, apresentada ao Supremo Tribunal Federal. Mas no fim de 2008, o STF arquivou o caso — após tantos anos, o crime prescreveu. 

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