A cada mudança, aumentam os rumores de que a maior operação anticorrupção do Brasil será calada
Em 2009, o povo brasileiro nem imaginava que a descoberta de uma rede de postos de combustíveis e de lava a jato de automóveis que movimentava recursos ilícitos causaria tanto impacto na história do país. As transações, à época relacionadas ao ex-deputado federal José Janene, em Londrina, no Paraná, envolviam ainda os doleiros Carlos Habib Chater e Alberto Youssef, já processados por crimes contra o sistema financeiro nacional e por lavagem de dinheiro no caso Banestado.
Somente em março de 2014, a Polícia Federal (PF) obteve informações suficientes para deflagrar a primeira operação, apontando atuação desses doleiros e de mais dois, Nelma Kodama e Raul Srour, atuantes no mercado paralelo de câmbio como líderes de quatro organizações criminosas. Foram 28 prisões, 19 conduções coercitivas e 81 buscas e apreensões. E esse era apenas o começo das descobertas de um imenso esquema de corrupção envolvendo a Petrobras.
Desde então, os números se multiplicam. As investigações apontam uma movimentação de R$ 42 bilhões, sendo que, até o momento, R$ 11 bilhões foram recuperados de empreiteiras que integraram o esquema clandestino. Somente em pagamentos de propina, foram repassados R$ 6,4 bilhões, principalmente a agentes políticos. Muitas são as autoridades políticas suposta ou comprovadamente beneficiadas com a corrupção.
Em conversas divulgadas em maio do ano passado, o então ministro do Planejamento, senador Romero Jucá (PMDB/RR), sugeriu ao ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado que uma “mudança” no governo federal resultaria em um pacto para “estancar a sangria” representada pela Operação Lava Jato. Um diálogo estabelecido semanas antes da votação na Câmara dos Deputados que desencadeou no impeachment de Dilma Rousseff da presidência.
Nesse cenário, a cada modificação na esfera federal, aumentam os rumores de que a Lava Jato será encerrada, sem conseguir colocar os corruptos na cadeia. Sob nova direção, a Polícia Federal virou alvo de interrogatórios pelas rodas de conversa. O novo diretor-geral da instituição, Fernando Segovia, e o delegado Eugênio Ricas, ex-secretário de Controle de Transparência do Espírito Santo, que assumiu a Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado da PF, portanto a Lava Jato também, garantem que haverá prosseguimento nas ações.
Ricas defendeu que não há como estancar a Operação porque é uma instituição dentro da Federal. Ainda segundo o novo diretor, os trabalhos seriam intensificados e a sociedade brasileira poderia ficar tranquila com relação a isso. “A nossa missão é dar mais condições, mais suporte, pra que todos os trabalhos da Polícia Federal sejam feitos. Então, a partir do momento que os fatos criminosos aparecem em outros lugares, é necessário criar outros núcleos”, garantiu Ricas durante coletiva.
O presidente do Sindicato dos Policiais Federais do Espírito Santo e diretor Parlamentar da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), Marcus Firme dos Reis, reitera a impossibilidade de se afirmar que todo esse trabalho vai “terminar em pizza”.
“A Lava Jato foi, é e continuará sendo um sucesso, mesmo diante de prejuízos, como intenso corte de orçamento e o fim da força-tarefa em Curitiba, que tinha dedicação exclusiva, com muitos policiais à disposição da Operação. A aproximação entre a PF, o MPF e a Justiça Federal dá muita celeridade às investigações, enquanto agora, via inquérito, normal, há muita burocracia. Por isso condeno o fato de não haver dedicação exclusiva. Mas não se pode desmerecer os resultados alcançados nem duvidar dos que ainda virão”, afirma Reis.
A classe política não tem abertura para “estancar a sangria”, garante o diretor. “Não há ingerência política, basta observar os diversos políticos acusados. São dois ex-presidentes e agora o próprio Michel Temer apontados nas investigações.
E são constrangedoras as declarações de políticos como ‘Vamos parar a Lava Jato, vamos parar a sangria’, pois existe toda uma política anticorrupção. E hoje, aonde a PF vai, encontra a corrupção envolvendo pessoas e agentes políticos”.
Segundo Firme, a expectativa é muito boa em relação a Segovia. “Foi escolhido em um momento ruim, mas ele é bem-quisto e respeitado pelos policiais federais. Tem um perfil conciliador, conversa com as entidades de classe dentro da PF. Hoje há divergência entre delegados e outras categorias, papiloscopistas, agentes, escrivães e peritos.”
O diretor faz um chamado à população. “Por isso que nós, do sindicato, temos pensado muito em relação às próximas eleições, sobre a necessidade de renovação. Muito embora as possibilidades desenhadas até o momento não sejam as melhores, é preciso analisar os candidatos, pensar muito antes de votar. Essa polarização de extremos, tanto de esquerda, quanto de direita, é preocupante. Mesmo em longo prazo, é preciso renovar.”