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sexta-feira, 19 abril, 2024

É preciso falar sobre o esgotamento profissional

Quase um terço dos brasileiros já desenvolveu o problema conhecido como síndrome de Burnout

Nem todo mundo dá conta de uma rotina corrida de trabalho conciliada com compromissos pessoais e vida social. É comum que uma pessoa atarefada acabe desenvolvendo um quadro de estresse e ansiedade, afetando o seu cotidiano como um todo. Dependendo do nível de exaustão causado pelas tarefas profissionais, reações psicossomáticas associadas também podem aparecer.

Diversas doenças psíquicas têm chamado atenção por estarem ligadas a questões laborais, entre elas a síndrome de Burnout. O problema se caracteriza pela sensação de esgotamento, cansaço e falta de disposição. No geral, podem parecer sintomas comuns.
Mas deve-se ficar atento a eles.

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Uma pesquisa realizada pela International Stress Management Association (Isma) mostrou que 30% dos mais de 100 milhões de trabalhadores brasileiros sofrem com o problema. Mas não somos os únicos a enfrentá-lo: mais de 20 milhões de pessoas têm Burnout no Reino Unido. Até mesmo a Alemanha, reconhecida por ter uma carga horária de trabalho menor, registra 2,7 milhões de trabalhadores, ou 8% do total, com o distúrbio.

Abrangendo os diversos tipos, o número de casos de transtornos mentais tem se destacado no Brasil, segundo informações divulgadas pela Secretaria de Previdência do Ministério da Fazenda. No país, esta já é a terceira causa de incapacidade para trabalhar.

Primeiros sintomas

Em 2015, a administradora Helloá Regina, também estudante de Direito, passava por um momento delicado na vida que mudaria totalmente a sua forma de encarar o próprio cotidiano. Atolada em uma rotina repleta de tarefas profissionais e estudo, ela começou a apresentar sinais de que tudo estava indo longe demais para o seu corpo dar conta. Então, foi diagnosticada com a síndrome de Burnout.

“Eu estava cheia de sintomas físicos e emocionais, mas mesmo assim achava que era frescura minha e que estava apresentando fraqueza. Então, titubeei a pensar que pudesse ser algo envolvendo a saúde mental. Sempre entendia que eu não estava dando conta”, relatou.

Helloá já tinha ouvido falar da síndrome na faculdade enquanto estudava a disciplina de Gestão de Pessoas, mas seu contato foi apenas com o conteúdo teórico, sem nunca ter associado com o que estava acontecendo consigo. Enquanto cursava a faculdade de Administração Pública, estava também trabalhando durante nove horas por dia. Além de morar sozinha e ter seus afazeres domésticos, estava matriculada em um curso de inglês e envolvida com trabalho voluntário. “Eu era sempre muito ocupada. Nunca imaginava que isso aconteceria comigo, mas aconteceu.”

E, nesse contexto de muita atividade, Helloá conta que as reações físicas começaram a aparecer. “Passei a sentir muita dor de cabeça. Todos os dias eu tomava vários remédios analgésicos para aliviar a dor”, recorda-se. “Depois, comecei a sentir dores musculares também, e as coisas foram evoluindo até a sensação de enjoo, cansaço e extremo desânimo.”

Quando o corpo passou a sentir os problemas, a saúde foi piorando em vários níveis. Por todo o quadro da doença, a imunidade ficou comprometida. Gripes eram contraídas facilmente,  sempre com lentas e difíceis recuperações. Conforme a exaustão dominava o corpo, a parte emocional também ficava muito afetada. “Então, comecei a ficar muito para baixo e deprimida e cheguei a parar de fazer as atividades de lazer”, revela.

A tensão era tanta a ponto de ser impossível relaxar para assistir a um filme. Os pensamentos giravam em torno da multiplicidade de tarefas que a esperavam nos seus diversos compromissos. “Nessas duas horas, eu pensava que poderia estar fazendo uma outra coisa, algum trabalho. E, se eu fosse assistir ao filme, eu não conseguia me concentrar porque ficava preocupada com os trabalhos que tinha de fazer.”

A síndrome

Só depois de procurar vários médicos especialistas em problemas físicos, como endocrinologista, cardiologista e ortopedista, que Helloá Regina começou a perceber que o seu problema estava relacionado à mente. “Eu fui a vários médicos porque eu sentia muitas coisas. Cheguei a pensar que eu tinha tido infarto e fiz até um eletrocardiograma.”

Após consultas com vários especialistas, todos os exames mostravam que ela não apresentava problemas. “Foi então que minha mãe chegou à conclusão de que eu precisava procurar um especialista em saúde mental”, relatou. Em maio de 2015, ela recebeu de um médico o diagnóstico. “A partir daí tudo mudou na minha vida.”

Segundo a psiquiatra Marília Herkenhoff Araújo, são três os fatores que caracterizam a síndrome de Burnout: exaustão emocional, despersonalização e diminuição da realização pessoal.

“É difícil fazer o diagnóstico diferencial de Burnout porque é muito comum a presença de sintomas semelhantes aos que surgem no transtorno de ansiedade e no transtorno depressivo; são essas as doenças que são passíveis de confundir o diagnóstico”, explica.

É preciso falar sobre o esgotamento profissional
A psiquiatra Marília Herkenhoff disse que os sintomas da Síndrome de Burnout são semelhantes aos que surgem no transtorno de ansiedade e no transtorno depressivo. – Foto: Divulgação

A médica revela que é comum também o paciente desenvolver um outro problema associado, como depressão. Embora apareçam juntos com frequência, vários estudos mostram que os dois problemas são conceitualmente diferentes.

“Por exemplo, o estado depressivo que pode acontecer no Burnout é mais temporário, orientado por uma situação precisa na vida da pessoa no trabalho. Quando surge algum sentimento de culpa, geralmente é mais objetivo e tem mais relação com o trabalho. Já a culpa característica da depressão é mais abrangente, atingindo todas as áreas da vida do indivíduo”, comparou.

Superação

Após o diagnóstico, uma mudança na rotina deve ser iniciada para mitigar os sintomas e a retomada do controle da vida cotidiana. “O tratamento geralmente envolve o uso de antidepressivos, psicoterapia e atividade física regular. Exercícios de relaxamento e meditação também podem ajudar a controlar os sintomas”, afirma Marília Araújo.

Segundo ela, as mudanças no estilo de vida são a melhor maneira de prevenir a síndrome de Burnout.

A psiquiatra ressalta que não se deve usar a desculpa da falta de tempo para fugir das atividades físicas.

Além disso, também é importante conseguir dormir bem, alimentar-se corretamente e manter os hobbies e o interesse pela vida social.

De acordo com o médico especialista em Saúde Ocupacional José Luiz Federici, estudos apontam várias formas de promover o bem-estar do trabalhador para prevenir o Burnout. Então, o profissional pode refletir sobre os problemas e dificuldades laborais.

É preciso falar sobre o esgotamento profissional
O médico de saúde ocupacional José Luiz Federici disse que a Síndrome de Burnout pode ser encontrada em qualquer profissão. – Foto: Divulgação

“Um local de trabalho saudável envolve uma visão compartilhada sobre o valor e importância de cada indivíduo em seu meio profissional. Se o empregado chegar ao médico do trabalho com queixas laborais, este analisará os sintomas e poderá orientar o trabalhador a procurar acompanhamento psicológico ou atendimento psiquiátrico”, explicou

“O fator conhecimento é muito importante. A pessoa que desenvolve o Burnout precisa criar mecanismos de prevenção. Eu já não encho minha agenda de compromissos, como fazia antes, e permito que tenha meu tempo de descanso”, disse Helloá Regina.

Ela, por exemplo, não apenas conseguiu reorganizar suas tarefas para evitar o esgotamento físico e mental, mas também decidiu que queria ajudar outras pessoas que passam pela mesma situação. Então, criou e administra duas páginas no Facebook que divulgam informações sobre a doença, uma delas chamada Vencendo o Burnout. “Fiquei indignada ao perceber que na internet não havia tanta informação sobre o problema. Após uma entrevista que dei a uma revista, houve um grande feedback nas redes sociais e decidi começar a postar dicas sobre o que eu vivi de verdade”, contou.

Sintomas de Burnout

Entre as características da síndrome de Burnout está exaustão física, emocional ou mental por causa do acúmulo de estresse no trabalho. O esgotamento psicológico causado pelo problema é muito comum em profissionais que têm que lidar com pressão e responsabilidade constante. Entre as ocupações em que Burnout ocorre, estão professores e profissionais de saúde, por exemplo.

Os sinais e sintomas que ajudam a identificar a síndrome de Burnout:

  1. Sensação constante de negatividade.
    É comum que o indivíduo afetado seja constantemente negativo, como se nada fosse dar certo.
  2. Cansaço físico e mental.
    A sensação de cansaço é constante e excessiva, difícil de recuperar.
  3. Falta de vontade.
    Há perda da motivação para fazer atividades sociais ou estar com outras pessoas.
  4. Dificuldade de concentração.
    As pessoas podem também sentir dificuldade em se concentrar no trabalho, tarefas em diárias ou numa simples conversa.
  5. Falta de energia
    O cansaço é excessivo e há falta de energia para manter hábitos saudáveis, como ir à academia ou ter um sono regular.
  6. Sentimento de incompetência
    Quem sofre com a síndrome de Burnout pode ter a sensação de não estar fazendo o suficiente dentro e fora do trabalho.
  7. Priorizar as necessidades dos outros
    É comum colocar as necessidades dos outros à frente das próprias.
  8. Alterações repentinas de humor
    Podem ocorrer muitos períodos de irritação.
  9. Isolamento
    A pessoa tem a tendência de se isolar de pessoas importantes, como amigos e familiares.
  10. Não conseguir descansar
    Quando se tiram férias, é comum não se sentir prazer durante esse período, voltando para o trabalho com a sensação de ainda estar cansado.

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