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quinta-feira, 28 março, 2024

Entrevista: Guerino Balestrassi

Entrevista: Guerino BalestrassiDiretor-presidente do Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes) pela segunda vez, Guerino Balestrassi diz que é preciso desenvolver a cultura do crédito planejado entre a população. Papel que faz parte do trabalho desenvolvido pelo Bandes, principalmente, junto aos micro e pequenos empreendedores e aos agricultores familiares. Gestor do banco criado para fomentar e financiar investimentos no Espírito Santo, Balestrassi, que também já foi prefeito de Colatina, fala nesta entrevista sobre os bons resultados do Nossocrédito, programa de financiamento voltado para as micro e pequenas empresas, a importância de levar empresas para os polos do interior do Estado e os novos produtos que serão lançados pelo Bandes, entre outros assuntos.

O senhor já foi prefeito de Colatina. Como a experiência de estar à frente de um município o ajuda a conduzir o banco?
A minha primeira experiência é como engenheiro, depois como pequeno empresário, prefeito, até chegar ao Bandes. A experiência como engenheiro e como empresário ajudou muito na gestão pública. Eu procurei fazer com que a minha gestão em Colatina fosse moderna. Aqui no Bandes, a estrutura também é moderna, mas é uma gestão mais técnica, tanto que a maioria dos funcionários são concursados e mais de 80% têm nível superior. É uma casa que tem normas e regras, um banco de desenvolvimento que também segue regras do Banco Central, mas, ao mesmo tempo, há bastante flexibilidade para criar e inovar. Meu papel aqui é conduzir, liderar o processo, sem fazer muita mágica; inovar, mas verificando as regras da casa. Particularmente, é menos difícil do que um município.

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Esta é a segunda vez que o senhor atua como diretor-presidente do Bandes. Como compara a primeira passagem pelo banco com a atual? Quais são os velhos e novos desafios?
A primeira vez [de maio de 2009 a março de 2010], eu fiquei 11 meses no Bandes. O Bandes, já naquela época, tinha algumas ameaças. O desafio é que nós operamos o Fundo de Recuperação do Estado do Espírito Santo (Funres) e há uma grande reflexão sobre ele, se deve ser estadualizado ou não. Esse, aliás, é o desafio que já vem desde aquela época. E a grande dificuldade hoje é o Fundap. Com a reforma tributária, o governo Dilma está realmente afunilando para a extinção do Fundap. No campo empresarial do Estado, é possível superar com certa agilidade essa questão. Para o Estado, o prejuízo é pequeno, as dificuldades são pequenas, mas para os municípios, essa perda põe em questionamento a estabilidade das gestões municipais. É um problema difícil de lidar, porque o ICMS do Fundap corresponde praticamente a 20% da receita dos municípios. Nós estamos num processo de recuperação muito grande, com o maior índice de ICMS arrecadado pelo Fundap desde 2008. Nós tivemos R$ 1,6 bilhão, em 2008; depois teve a queda em 2009 e em 2010, e em 2011 estamos superando aquele índice de 2008.

Que ações o Bandes tem desenvolvido para contribuir com o desenvolvimento dos municípios do interior do Estado?
Nós temos agentes nos 78 municípios, tanto que é nos municípios pequenos que fazemos a diferença. Nossos maiores produtos estão nos municípios pequenos. Temos uma rede de consultores, que são pessoas que fazem projetos para o empreendedor, mas não são vinculados ao Bandes. Entre agentes de crédito e consultores, temos 250 pessoas, que é maior que o número de funcionários que temos na casa. Esses consultores é que levam o crédito para esses clientes, seja o pequeno empresário ou o agricultor familiar, por exemplo. Os depoimentos que nós recebemos aqui de pessoas, doceiras, por exemplo, para quem financiamos a compra de máquinas de R$ 2 mil, R$ 3 mil, são muito positivos. Nós identificamos essas pessoas e vamos atrás delas, e, às vezes, elas até se surpreendem porque queremos ajudá-las.

Sendo assim, qual a importância da interiorização do desenvolvimento para o fortalecimento da economia capixaba como um todo?
Essa é uma política de governo e é a maior marca do Bandes. Quando ele foi criado, a concepção era alavancar o crescimento, por causa da erradicação do café, nas décadas de 60 e 70. Ele tinha que gerar emprego e renda para aquela mão de obra. Na maior parte dos arranjos produtivos do interior, o setor moveleiro e de rochas, cerca de 70% foram financiados pelo Bandes. O Espírito Santo criou alguns grandes projetos que desequilibraram a economia local. São projetos muito grandes, que criam uma migração muito forte do interior para a Grande Vitória. Desacelerar isso e diminuir esse processo é fundamental. Além disso, temos que proteger as nossas divisas com o sul da Bahia, o leste de Minas e o norte do Rio de Janeiro. Precisamos fazer contenções, criar arranjos produtivos, porque, se não, essa população toda vem para a Grande Vitória. E esse modelo de desenvolvimento com a formação rápida de grandes regiões metropolitanas, como já ficou provado, não dá certo. Ele gera uma demanda, que cresce em progressão geométrica, enquanto a oferta de serviços públicos cresce em progressão aritmética, como falamos na Engenharia. Então, não basta ter recurso, se você não tem velocidade para resolver os problemas. Esses gargalos se acentuam, gerando conflitos sociais, violência, principalmente, e aumentando a demanda por hospitais. Não dá para atender a tantas pessoas, então, você tem que diminuir a demanda. E, para isso, é preciso levar geração de emprego e renda para todo o espaço territorial. O Bandes atua muito forte nisso. Todas as empresas que chegam aqui nós tentamos levar, prioritariamente, para o interior, dando incentivos. Lógico que nem sempre conseguimos, porque é difícil competir com o litoral, principalmente com relação ao setor de petróleo e gás, que representa hoje R$ 50% dos investimentos feitos no Espírito Santo, e está prioritariamente instalado no litoral. Temos que fortalecer Colatina, Nova Venécia, São Mateus, Barra de São Francisco, Cachoeiro de Itapemirim, municípios que estão mais próximos das divisas.

Como o Bandes tem contribuído para atrair empresas para o Estado, através do Invest- ES?
O Invest-ES (Programa de Incentivo ao Investimento no Estado do Espírito Santo) é um programa para atrair empresas para o Estado. Esse incentivo é dado de duas formas, e uma leva em consideração a posição geográfica em que a empresa queira se instalar. Quanto mais distante da Grande Vitória, mais incentivo ela recebe. A empresa deixa de pagar até 70% do ICMS, e algumas já receberam desconto de até 90%. A Itatiaia, a WEG e a Bertolini, por exemplo, receberam esse incentivo. Cariacica, mesmo dentro da Grande Vitória, é um lugar bom para darmos esse incentivo, por exemplo, porque o parque industrial do município precisa ser desenvolvido. Guarapari e Vila Velha também. A outra forma pela qual esse incentivo é dado é por meio de um contrato de competitividade, que é um diferencial no ICMS. Os setores de rochas, confecção, moveleiro, por exemplo, têm uma competição muito acirrada. Então, o contrato é feito com todas as empresas daquele arranjo produtivo.

Hoje fala-se muito na extinção do Fundap. O fim do Fundo é o grande desafio do Bandes?
É um grande problema e dificuldade para o banco, porque o nosso grande produto hoje é o Nossocrédito, que operamos praticamente 70% com o Fundap Social, e o resto via Banestes. É um produto nosso que tem uma marca muito forte e consolidada, atuando para potencializar o Bolsa Família. O Bolsa Família tirou as pessoas da zona de baixa renda e colocou essa população no mercado de trabalho. Só que elas não tinham iniciativa, e o Nossocrédito vem suprir isso. Concedemos financiamento para pessoas que precisam de R$ 200 até R$ 7,5 mil. O Nossocrédito foi um grande passo que o Espírito Santo deu, uma bela iniciativa do Bandes, e um projeto muito exitoso, tanto que o Governo Federal agora está lançando um projeto parecido, o Programa Crescer.

O Nossocrédito ficaria prejudicado ou acabaria com a extinção do Fundap?
Não, porque nós temos um volume de recursos suficiente para mantê-lo. Agora, precisamos criar uma estrutura de captação de recursos, seja com o nosso maior acionista, que é o Governo do Estado, ou com outras fontes de recursos para esse fundo, que é um projeto que deu certo. Ele pode ficar prejudicado pelo Fundap, mas vamos criar alguma saída para sua ampliação. Agora mesmo estamos criando um programa parecido, o Creditar, que trabalha com os bancos comunitários. E ele, ao invés de financiar até R$ 7,5 mil, vai financiar até R$ 1 mil. O Creditar é para pessoas que têm mais dificuldade ainda, pois não é necessário garantia, nem avalista. É um projeto de maior socialização. Já está em operação e é 100% investimento, não é custeio, nem habitacional. Os recursos da Caixa é que servem a essas modalidades. Nós entramos 100% para investimento.

Que tipos de saída o Bandes está estudando com a possibilidade de o Fundap acabar?
Nós estamos num período de transição do Fundap, de quatro anos. Ele não vai ser extinto de uma hora para outra, então, nós temos que trabalhar e operar. Não vejo tanta dificuldade; a dificuldade existiria se o projeto do Nossocrédito não fosse exitoso, mas é, e é uma parceria. É uma das capacidades do Bandes formar parcerias, e temos uma união fundamental com o Banestes, a Secretaria de Ação Social, o Sebrae, mas, principalmente, com os municípios.

Em virtude da ampliação do teto do Supersimples, na sua opinião, haverá aumento na demanda por crédito do Bandes por parte das MPEs?
Com certeza, o número de operações vai aumentar. Nós vamos alterar o valor das nossas linhas de financiamento, e não vamos esperar nem a vigência do novo teto. Com a nova classificação, a possibilidade de acesso ao crédito vai aumentar sim.

O Bandes então vai crescer a oferta de crédito para as MPEs?
Nos últimos três anos, massificamos muito essa atuação no Estado. Estamos trabalhando em dois ou três produtos para qualificar mais essa atuação, como o turismo, que é uma atividade importante no Estado e que requer uma atenção maior. As nossas linhas de financiamento são universalizadas, elas atendem a todos, mas precisamos criar alguns produtos para atender de forma específica algumas atividades. A previsão é que uma nova linha para o turismo seja lançada ainda neste ano. No passado, nós financiamos a maioria dos hotéis do litoral e da região de Pedra Azul. Agora, precisamos financiar as melhorias desses serviços e também os negócios menores, não só as pousadas, bares e restaurantes, mas todos os serviços que fazem parte dessa cadeia.

Além da nova linha para o turismo, o Bandes pretende criar novas linhas de crédito para o próximo ano?
Há uma lacuna hoje para financiamento voltada à média empresa no interior. Temos atuação junto às grandes empresas e às micro e pequenas. E as médias ficam no limbo, sem uma atenção. Então, estamos trabalhando uma linha específica para a média empresa, para incentivá-la a ficar no interior.

Quais são os principais empreendimentos que estão chegando ao Estado e que contam com o apoio do Bandes?
A Secretaria de Desenvolvimento está com uma carteira muito grande de empresas que têm interesse em se instalar no Estado. Muitas já entraram no Invest-ES, sejam empresas de fora, sejam locais que querem se expandir. Muitas empresas do sul do País estão em processo de relocalização por causa do desenvolvimento industrial tanto do Nordeste como da Região Central do País. E aí há empresas do setor metalmecânico, de implementos rodoviários, de logística, que estão no Sul do País e estão em processo de migrar para cá. A Itatiaia, a WEG, a Bertolini são exemplos disso. O principal foco é competir com outros Estados por essas empresas, além das que já vêm naturalmente pela vocação do Espírito Santo.

Podemos dizer que o Espírito Santo vive hoje seu melhor momento econômico?
Historicamente, o Estado não se desenvolveu como os demais da Região Sudeste, e agora estamos tendo essa oportunidade. Temos que nos desenvolver da maneira correta, com sustentabilidade. O que aconteceu no Rio de Janeiro e em São Paulo vale uma reflexão. Será que queremos ser o Rio daqui a 50 anos? Será que é bom ou ruim? Eu vejo que não é tão bom, acho que nós podemos nos desenvolver de forma correta. Para isso, precisamos financiar empresas que complementem as nossas atividades e que estejam localizadas de forma a diminuir o processo migratório. E, aí, temos que oferecer financiamento para elas e arrumar uma engenharia financeira para atraí-las. O auge do Bandes foi na década de 70, quando o banco financiou arranjos interessantes, e várias empresas âncoras foram implantadas nessa época. Mas este momento também é muito bom. O Brasil hoje é um dos países que mais crescem, e o Espírito Santo é o Estado brasileiro que mais cresce. Este é o melhor momento e, por isso, temos que fazer a coisa certa, sendo diferentes e melhores, em relação ao que outros estados fizeram no passado, mas sem concorrência predatória, em que você atrai empresas e destrói o conteúdo local. Temos que atrair empresas que vão se complementar, inovar o conteúdo local e levar a um crescimento endógeno.

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