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sexta-feira, 29 março, 2024

Marcos de Sousa: “Cidades engarrafadas são menos competitivas”

"u00c9 preciso mudar o modelo gradativamente pensando em novas formas de transporte. Essa mudanu00e7a deve ser feita pelos governantes. A maior parte dos projetos das cidades consiste em novas pontes e vias para incentivar o uso de automu00f3veis. O setor pu00fablico estu00e1 impregnado desse pensamento

Marcos de Sousa, criador do portal Mobiliza Brasil, é um dos convidados para o próximo ES Brasil Debate. Nesta entrevista fala sobre mobilidade urbana e sustentabilidade. No próximo dia 5 de novembro, será realizada mais uma edição do ES Brasil Debate (inscrições em breve), com um dos temas mais importantes para as cidades brasileiras: mobilidade urbana, capa da última edição da revista (leia aqui). 

* Por Vitor Taveira

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Entre os convidados  estão o jornalista Marcos de Sousa, criador do Portal Mobilize Brasil, primeiro site do país dedicado à mobilidade sustentável. Formado pela Escola de Comunicação e Artes da USP, ele participou de cursos de formação na Holanda e no Canadá. O debate acontecerá no Hotel Bristol Century Plaza, em Camburi, e também já tem a presença confirmada de Fábio Damasceno, secretário Estadual de Transportes e Obras Públicas, e Max da Mata, secretário de Transportes de Vitória.

Atualmente, Marcos de Sousa é sócio da Mandarim Comunicação e diretor de jornalismo do Mobilize Brasil. Também é ciclista, pedestre e usuário convicto dos transportes públicos. Confira a entrevista exclusiva da ES Brasil.

ES Brasil: No Brasil, quem utiliza o transporte público enfrenta diversas dificuldades (ônibus lotados, atrasos). Há alguma vantagem em utilizá-lo?

Marcos de Sousa: Por causa das condições ruins do transporte público, cerca de 25% das viagens são feitas com transportes individuais no Brasil. É um percentual alto, já que cada um automóvel em geral tem no máximo dois passageiros. Se o uso fosse mais racional, os congestionamentos diminuiriam muito. Países como Suíça e Áustria têm taxas de automóvel por habitante muito maior e não apresentam problemas. Nos últimos 40 anos, as autoridades abandonaram transporte público e foi estimulado o transporte individual. Moro a 5 km do meio escritório e ando de metrô. Se eu for de carro, gastaria menos. Prefiro o metrô, pois pego uma linha menos carregada, fora do horário de pico. Sei que essa não é a realidade da maioria.

ESB: O que deve ser feito para melhorar a mobilidade urbana?

MS: Duas ações precisam ser feitas. Estimular criação de pólos para a fonte de emprego e renda nos bairros para evitar longas viagens. A outra é investir em transporte público. Sinto que já existe uma visão das prefeituras para incentivar o uso do transporte público e o rodízio de placas. Há dinheiro e as empresas também são capazes de apresentar soluções. É preciso pensar as cidades a longo prazo.

ESB: E quais são as iniciativas do setor privado?

MS: Ainda são muito tímidas. No Rio de Janeiro, recentemente no parque de Madureira foi implantada uma estação do Bike Rio. Em São Paulo, também se criou serviço similar. Para as empresas é um ótimo marketing. Recentemente, em Nova York foi implantado um sistema de bicicletas compartilhado. O sistema chama-se Citybike. Começou com seis mil bicicletas. São Paulo tem pouco mais de mil. Em Nova York, nos três primeiros meses, foram feitas 3,5 milhões de viagens. É um sistema racional porque complementa a viagem. Deve ser incentivado em locais de topografia plana.

Há outras ações corporativas. Empresas também incentivam os funcionários a usarem transporte público ou andarem de carona. Algumas já implantam bicicletários e incentivam a carona.

ESB: Nosso país incentiva a compra de veículos com diversas facilidades. Quais são os impactos desse incentivo?

MS: Essa não é uma solução porque as pessoas continuarão paradas no trânsito. Fora que os acidentes de moto são cada vez maiores. O automóvel é importante para viagens longas e não para o centro da cidade, já que a ele é inviável com o crescimento das cidades. Uma das doenças que nasce daí é o estreitamento das calçadas.

É preciso mudar o modelo gradativamente pensando em novas formas de transporte. Essa mudança deve ser feita pelos governantes. A maior parte dos projetos das cidades consiste em novas pontes e vias para incentivar o uso de automóveis. O setor público está impregnado desse pensamento.

Até alguns anos atrás Curitiba poderia ser modelo. A cidade pensou como ia crescer e criou estratégias. Nos anos 80 e 90 esse investimento acabou. Hoje a cidade tem uma das maiores frotas de veículo por habitante do país. E hoje os corredores de ônibus não conseguem atender a demanda. O plano é construir metrôs.

Na Dinamarca, Copenhague é um exemplo. No Centro não entram carros, mas eles têm bom transporte público e incentivo ao uso de bicicletas.

Mas não adianta ter transporte público de qualidade se a população não utiliza.

ESB: O que as administrações públicas precisam fazer para incentivar a melhoria na mobilidade urbana? Só grandes obras são suficientes?

MS: Você pode construir dez pontes e todas ficarão congestionadas se elas forem usadas apenas para automóveis. Em Los Angeles, onde há 30 pistas há momentos de engarrafamento. Então, o caminho é pensar com sustentabilidade, priorizando transporte público. As cidades engarrafadas deixam de ser competitivas.

O primeiro passo deve ser dado: implantar ciclovias, alargar calçadas. Isso já pode ser feito e começa a mudar a mentalidade das pessoas, que já começam a pensar diferente. Mudar radicalmente leva tempo, mas é preciso começar. Para a Copa foram poucas as cidades que não construíram só estádios. Perdeu-se uma grande oportunidade.

ESB: E os moradores? Há algo que possa ser feito pela sociedade? Há exemplos a serem seguidos?

MS: Há seis anos fui convencido pela minha esposa a abandonar o carro. Eu estava com uma série de problemas de saúde causado pelo uso do transporte. Comecei a andar de metrô. Não foi uma atitude fácil, mas minha saúde melhorou. Passei a conhecer melhor a cidade. Não voltaria ao meu estilo de vida antigo. Essas pequenas decisões também fazem a diferença.

ESB: Além da qualidade de vida dos moradores, o que as cidades ganham com os investimentos em mobilidade urbana?

MS: Ganham competitividade. Ao invés do funcionário levar 2 horas no trânsito leva meia hora. Em São Paulo, muitas pessoas gastam seis horas por dia para ir e voltar do trabalho. Mobilidade urbana melhora o ar e a água. É que a poluição emitida pelos carros vai para o mar e os rios. O preço ambiental que se paga é muito grande. Existe um número grande de pessoas que se acidentam, tanto nas estradas quanto nas calçadas.

Uma cidade com menos carros tem menos doentes mentais por causa do excesso de barulho. Recentemente foi publicada uma pesquisa que relaciona o barulho aos transtornos mentais. A mobilidade reduz a violência urbana. Noventa porcento da população brasileira vive em cidades. A estatística no mundo é menor, 70%. Até 2020, deve chegar a 87% no mundo. 

ESB: A Grande Vitória não foi preparada para o uso de meios alternativos de transporte. Existe uma maneira de adaptar a região?

MS: É preciso repensar a cidade a longo prazo. Não dá para refazer os fluxos de uma hora para a outra. Uma boa alternativa são os projetos pilotos. Cuiabá e Várzea tem uma relação semelhante com a Grande Vitória. Um metrô leve será construído até o ano que vem. Aproveitaram a Copa do Mundo para conseguir os recursos. As viagens serão mais rápidas e o centro de Cuiabá será revitalizado.

Existem R$ 50 bilhões de reais no Ministério das Cidades para projetos de mobilidade. O argumento deles é que os projetos não chegam com indicações claras e viabilidade. Por isso são raríssimas as prefeituras que conquistam os recursos. Um projeto bem detalhado evita problemas nos recursos.

 

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