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quinta-feira, 25 abril, 2024

Bloqueio de Bens sem Ordem Judicial

* Por Mariana Martins Barros

Eu soube que o Governo baixou uma lei para bloquear bens sem ordem judicial. Isto é constitucional?

No dia 10 de janeiro de 2018, foi publicada a Lei Ordinária nº 13.606, que trouxe em seu bojo alteração da legislação tributária e conferiu à Fazenda Pública Nacional a possibilidade de averbar a indisponibilidade de bens dos contribuintes devedores nos órgãos de registros de bens e direitos. De acordo com a nova lei, após a inscrição em divida ativa do débito, o devedor será notificado para pagá-lo em cinco dias, acrescido de juros, multa e encargos a que estiver sujeito. Caso não seja efetuado o pagamento neste prazo, a Fazenda Pública poderá comunicar a inscrição em dívida ativa aos bancos de dados e cadastros de proteção ao crédito como SERASA, SPC e outros.

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Além da providência acima, a Lei nº 13.606/2018 permite que a própria Fazenda Pública, administrativamente e antes de qualquer procedimento de cobrança judicial, promova a indisponibilidade de bens da pessoa apontada como devedora, seja jurídica ou física, através da averbação da certidão de dívida ativa nos órgãos de registro de bens e direitos. Segundo a nova lei, a indisponibilidade de bens poderá ser efetivada independentemente de análise e determinação judicial. Na realidade, será anterior à distribuição da execução fiscal, que veicula a cobrança dos créditos da Fazenda Pública perante a Justiça.

No entanto, sabe-se que a indisponibilidade constitui verdadeiro ônus e impede a alienação ou transferência de bens. Em termos práticos, a medida impede que a pessoa apontada pela Fazenda Pública como devedora disponha de seus bens antes de iniciada a execução fiscal, o que constitui mais um meio gravoso e indireto para compelir o contribuinte a pagar o tributo, prática já rechaçada e sumulada pelo Supremo Tribunal Federal – STF.

Embora prevista em lei, a indisponibilidade de bens antes de iniciado o processo judicial e sem a análise e determinação de um juiz, viola direitos e garantias dos contribuintes, tais como o livre exercício da atividade econômica, a livre iniciativa e o direito de propriedade. Além disto, a Constituição Federal garante que ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal. É inaceitável invadir o patrimônio do contribuinte sem dar a ele o direito de se defender.

Ressalte-se que a indisponibilidade de bens está normatizada no Código Tributário Nacional e foi amplamente debatida pelo Poder Judiciário. O Código só permite o decreto de indisponibilidade de bens (i) no curso da execução fiscal, (ii) após a citação do devedor, (iii) quando não houver pagamento, e (iv) não forem encontrados bens penhoráveis. É o que se depreende do artigo 185-A. No mesmo sentido é a Súmula 560, resultado de amplo debate no âmbito do Superior Tribunal de Justiça – STJ, segundo a qual “a decretação da indisponibilidade de bens e direitos, na forma do art. 185-A do CTN, pressupõe o exaurimento das diligências na busca por bens penhoráveis, o qual fica caracterizado quando infrutíferos o pedido de constrição sobre ativos financeiros e a expedição de ofícios aos registros públicos do domicílio do executado, ao Denatran ou Detran”.

Outro ponto questionável é o fato de tratar-se de uma lei ordinária, ao passo que a Constituição Federal determina que normas gerais de direito tributário devem ser objeto de lei complementar, inclusive quando se trata de crédito tributário. Sob esta ótica, a alteração do Código Tributário – norma que recebeu status de lei complementar pela Constituição Federal – por uma lei ordinária, é inconstitucional.

Atualmente, aguarda-se a regulamentação da Lei nº 13.606/2018 para que a indisponibilidade de bens seja efetivada no âmbito administrativo. No entanto, trata-se de medida inconstitucional que viola o ordenamento jurídico vigente. Inclusive, há notícia de ações que discutem a constitucionalidade da lei, impetradas no STF. Assim, os contribuintes que forem alvos de decreto de indisponibilidade de bens nos termos da Lei nº 13.606/2018 deverão buscar no Poder Judiciário a proteção de seus bens e direitos através de ações judiciais que visem a suspender o ato praticado pela Fazenda Pública.


Mariana Martins Barros é sócia do Escritório desde maio de 2001 e atua nas áreas:
Tributário e Fiscal, Comércio Internacional, Impostos e Taxas

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